LITERATURA



OVÍDIO – O POETA QUE MORREU NO EXÍLIO – LITERATURA LATINA CLÁSSICA


ROMA - CAPITÓLIO - LA CORDONATA

"Escuta, preceptor do amor libertino:
Conduz os teus alunos ao meu templo.
Verão eles ali uma inscrição 
cuja fama aos confins do universo 
levou este conselho: Conhece-te a ti mesmo.
Só o homem que a fundo se conheça
pode amar sabiamente
porque é em relação às próprias forças 
que mede cada empresa." 
Ovídio- Arte de amar

O primeiro século da era cristã foi o período mais fecundo da literatura latina. Gerou os três poetas mais importantes de toda a cultura romana: Virgílio, Horácio e Ovídio.

Politicamente, a personagem mais destacada nesse período é o imperador Augusto. Nascido Gaius Octavius Thurinus, passando a ser Gaius Iulius Caesar Octavianus, ao ser adotado por seu tio-avô Gaius Iulius Caesar, finalmente, tornou-se o primeiro imperador romano, adotando o título de Gaius Iulius Caesar Octavianus Augustus.

Pois o papel de Augusto na literatura foi de fundamental importância. No início de sua administração de quase cinquenta anos, nomeia seu ministro da cultura Gaius Cilnius Mecenas, homem de vasta cultura e de grandes posses. Esse ilustre cidadão instituiu o costume de os homens ilustres e ricos manterem a suas expensas os artistas. Augusto, para prestigiar o mecenato, adotou o poeta Virgílio.

Acontece que os poderosos patrocinam, mas fazem suas exigências. Virgílio, apesar de genial, foi um lacaio de Augusto. Primeiramente o poeta mantuano escreve suas Geórgicas, colaborando com a campanha de levar ao campo os soldados desmobilizados das campanhas militares. Por fim, em sua magistral obra Aeneis, Eneida, a grande obra épica dos romanos, inclui uma árvore genealógica da família dos césares, que vai permitir a Augusto de intitular-se divino.

Horácio era detentor de tamanho renome que escreveu uma obra criticando seus patrocinadores, Littera ad Pisones (Carta aos Pisões), conhecida como Arte Poética, pois constitui-se um conjunto de normas para a criação literária.

Ora, Ovídio, o mais inspirado de todos os poetas romanos e o mais precioso deles, não se submete ao falso moralismo do imperador. O cruel Augusto, que não perdoaria as próprias filha e neta do exílio, jamais se apiedaria de um simples poeta. E exilou-o no Oriente Médio, a uma distância impossível de retorno nesse tempo.

POETA OVÍDIO
Era o início da nossa era. Um édito de Augusto bane para sempre da grandiosa Roma o seu poeta mais genial, cujos versos amorosos encantavam a todos, especialmente a juventude. Porém, era, por outro lado, poeta de vasta cultura que escreveu As Metamorfoses, o poema tratado, o mais completo estudo das mitologias grega e romana produzido por escritor de seu tempo.

Veja o que diz dele e sua obra o poeta e crítico brasileiro José Paulo Paes, em artigo na Folha de São Paulo:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs190110.htm.

No ano 8 da nossa era, um édito imperial baniu para sempre de Roma o seu poeta mais festejado, aquele cujos versos galantes eram cantados em festins, rabiscados nos muros das encruzilhadas e pintados nas paredes das casas de Pompéia. Está-se falando de Públio Ovídio Nasão, autor da ``Arte de Amar'' e das ``Metamorfoses'', e último grande poeta da época de Augusto. Ele foi contemporâneo de Virgílio, Propércio, Horácio e Tibulo, e seu desaparecimento, no ano 17 d.C., assinalou o fim dessa época de ouro da literatura latina.

Ovídio morreu desterrado em Tomos, uma vila à beira do mar Negro ou Ponto Euxino, no local onde hoje se ergue a cidade de Constanza, na Rumânia. Àquela época, era uma região totalmente inóspita, de longos e rigorosos invernos, habitada por bárbaros getas e sármatas que viviam em pé de guerra contra os dominadores romanos. Longe dos belos jardins da sua mansão de Roma, afastado para sempre do aconchego de seus familiares e amigos da alta roda, o poeta lá viveu os seus últimos anos, encurtados pelas privações e provações de um modo de vida primitivo que não tardou a lhe combalir a saúde.

Até hoje permanecem obscuras as verdadeiras causas que levaram Augusto a exilar para os confins do império um poeta a quem vinha distinguindo com os seus favores e a quem acolhia em seu palácio. O pretexto para o intempestivo édito de banimento teria sido a imoralidade da "Arte de Amar", cujos conselhos de sedução amorosa induziriam seus leitores ao adultério. Isso num momento em que o todo-poderoso imperador de Roma estava empenhado, baldadamente embora, em moralizar os costumes do patriciado.

Como a "Arte" já circulava havia vários anos e não era mais imoral que outras obras livremente lidas naqueles tempos de relaxamento, aventaram-se razões agravantes para o édito. Uma delas seria Ovídio ter acobertado os amores clandestinos de uma neta do imperador, que acabou sendo também exilada pelo avô. Outra seria a malevolência de Lívia, esposa de Augusto, contra o poeta, por ele estar ligado a um círculo palaciano contrário a Tibério, filho do primeiro casamento de Lívia, a qual ambicionava para ele o trono do império.

Fossem quais fossem as razões do rancor de Augusto contra Ovídio, o certo é que nem as reiteradas súplicas do poeta, nem as de sua mulher ou de amigos seus influentes, conseguiram induzi-lo a revogar o édito ou mudar para região menos inóspita o lugar de banimento. As súplicas de Ovídio estão perpetuadas em duas coletâneas, as "Tristes" e as "Pônticas", que lhe reúnem os poemas do exílio. O lastro autobiográfico e os acentos do tocante desespero que galvanizam esses poemas dão-lhes um vigor expressivo e um interesse humano raros de encontrar-se na lírica da Antiguidade, em que o gosto da imitação e o recurso sistemático a um elenco de motivos mais ou menos fixos continham as efusões da subjetividade dentro dos quadros do convencional. Os poemas ovidianos do exílio rompem os limites desse enquadramento para fazer soar, numa antecipação de séculos, a voz do Eu romântico e pós-romântico que, no desfrute dos "seus juízos subjetivos, alegrias e admirações, dores e sensações" -a citação é de Hegel-, toma consciência de si e do seu próprio estar-no-mundo.

Para se ter uma idéia da distância que separa a arte graciosamente maliciosa e frívola dos poemas de juventude de Ovídio da dramática gravidade dos seus últimos poemas é instrutivo comparar a peça dos ``Amores'' (I: 5) com as das "Tristes" (V: 7) e das "Pônticas" (I: V) para aqui trazidas em tradução. Os "Amores", escritos quando o poeta ainda não contava 20 anos de idade, estão compostos no verso de eleição da poesia erótica latina, o chamado "dístico elegíaco", formado de dois versos de medidas diferentes. Esse verso procede da antiga poesia grega, onde era usado nas inscrições funerárias; mais tarde, desvinculou-se dessas conotações entre fúnebres e lamentosas. Estas, entretanto, vão reaparecer nos dísticos dos poemas ovidianos de exílio, a cujo tom de desalento e tristeza quadra bem o adjetivo "elegíacos".

Enquanto a peça dos "Amores" versa um tópico tradicional da lírica amorosa, qual seja a descrição dos encantos do corpo feminino, a elegia das "Tristes" mostra-nos Ovídio a fazer da poesia escrita em Tomos seu canal de comunicação com a pátria que fora forçado a abandonar para sempre; daí falar ele em "carta" logo no verso de abertura e confessar mais adiante que no "estudo", ou seja, no exercício da atividade intelectual, encontra o único lenitivo ao seu alcance: "Nos versos busco olvido das misérias que me afligem". Além da breve, mas viva descrição da aparência física e dos costumes selváticos dos bárbaros entre os quais habita, há nessa elegia um pormenor altamente expressivo da dramática do exílio: a perda progressiva da língua-mãe pelo "descostume" de usá-la; para não a perder e à falta de interlocutores, o poeta fala consigo próprio e se esforça por lembrar "palavras dessuetas" a fim de manter viva sua identidade de "poeta romano".

Se, a despeito de serem cartas versificadas, as "Tristes" se designam ainda como "elegias" por causa dos dísticos em que estão vazadas, as "Pônticas", embora compostas no mesmo tipo de verso, já se declaram "epístolas" e trazem amiúde, logo abaixo do título, o nome de seu destinatário. A que adiante se vai está endereçada a Fábio Máximo, um dos poucos amigos que permaneceu leal a Ovídio. Tanto assim que, na viagem para Tomos, acompanhou-o pessoalmente até Brindes, sem medo de comprometer-se aos olhos de Augusto pela sua lealdade ao poeta, a quem muitos outros supostos amigos voltaram as costas tão logo o viram cair em desgraça. Nessa epístola a Máximo, discute Ovídio o porquê de continuar escrevendo e justifica a espontaneidade ("Contento-me em compor o que me venha facilmente"), tanto quanto a rudez dos seus versos, pelas adversidades de sua condição de exilado, de que eles seriam o reflexo ou o homólogo fiel.
José Paulo Paes é poeta, tradutor e ensaísta, autor de ``Prosas Seguidas de Odes Mínimas'' e ``A Aventura Literária''.

Leia o poema abaixo que dá origem a todas as nossas canções de exílio. Embora tenha repetidas vezes solicitado perdão a Augusto e a revogação do édito de exílio, o imperador jamais se compadeceu dele, deixando-o morrer no Oriente.

Um poeta entre os bárbaros

JOSÉ PAULO PAES especial para a Folha



TRISTIUM

Ovidio - Libro 1
Capitolo Par. 3
Cum subit illius tristissima noctis imago,
quae mihi supremum tempus in urbe fuit,
cum repeto noctem, qua tot mihi cara reliqui,
labitur ex oculis nunc quoque gutta meis.
iam prope lux aderat, qua me discedere Caesar
finibus extremae iusserat Ausoniae.
nec spatium nec mens fuerat satis apta parandi:
torpuerant longa pectora nostra mora.

non mihi seruorum, comitis non cura legendi,
non aptae profugo uestis opisue fuit.
non aliter stupui, quam qui Iouis ignibus ictus
uiuit et est uitae nescius ipse suae.
ut tamen hanc animi nubem dolor ipse remouit,
et tandem sensus conualuere mei,
alloquor extremum maestos abiturus amicos,
qui modo de multis unus et alter erant.

uxor amans flentem flens acrius ipsa tenebat,
imbre per indignas usque cadente genas.
nata procul Libycis aberat diuersa sub oris,
nec poterat fati certior esse mei.
quocumque aspiceres, luctus gemitusque sonabant,
formaque non taciti funeris intus erat.
femina uirque meo, pueri quoque funere maerent,
inque domo lacrimas angulus omnis habet.

si licet exemplis in paruis grandibus uti,
haec facies Troiae, cum caperetur, erat.
iamque quiescebant uoces hominumque canumque
Lunaque nocturnos alta regebat equos.
hanc ego suspiciens et ad hanc Capitolia cernens,
quae nostro frustra iuncta fuere Lari,
'numina uicinis habitantia sedibus,' inquam,
'iamque oculis numquam templa uidenda meis,
dique relinquendi, quos urbs habet alta Quirini,
este salutati tempus in omne mihi.

et quamquam sero clipeum post uulnera sumo,
attamen hanc odiis exonerate fugam,
caelestique uiro, quis me deceperit error,
dicite, pro culpa ne scelus esse putet.
ut quod uos scitis, poenae quoque sentiat auctor:
placato possum non miser esse deo.'
hac prece adoraui superos ego, pluribus uxor,]
singultu medios impediente sonos.

illa etiam ante Lares passis adstrata capillis
contigit extinctos ore tremente focos,
multaque in auersos effudit uerba Penates
pro deplorato non ualitura uiro.
iamque morae spatium nox praecipitata negabat,
]uersaque ab axe suo Parrhasis Arctos erat.
quid facerem? blando patriae retinebar amore,]
ultima sed iussae nox erat illa fugae.

a! quotiens aliquo dixi properante 'quid urges?
uel quo festinas ire, uel unde, uide.'
a! quotiens certam me sum mentitus habere
horam, propositae quae foret apta uiae.
 ter limen tetigi, ter sum reuocatus, et ipse
indulgens animo pes mihi tardus erat.
saepe 'uale' dicto rursus sum multa locutus,
et quasi discedens oscula summa dedi.
saepe eadem mandata dedi meque ipse fefelli,

respiciens oculis pignora cara meis.
denique 'quid propero? Scythia est, quo mittimur', inquam,
]'Roma relinquenda est, utraque iusta mora.
uxor in aeternum uiuo mihi uiua negatur,
et domus et fidae dulcia membra domus,
quosque ego dilexi fraterno more sodales,
o mihi Thesea pectora iuncta fide!
dum licet, amplectar: numquam fortasse licebit
amplius; in lucro est quae datur hora mihi.'

nec mora sermonis uerba inperfecta relinquo,
complectens animo proxima quaeque meo.
dum loquor et flemus, caelo nitidissimus alto,
stella grauis nobis, Lucifer ortus erat.
diuidor haud aliter, quam si mea membra relinquam,
et pars abrumpi corpore uisa suo est.
sic doluit Mettus tum cum in contraria uersos
ultores habuit proditionis equos.
tum uero exoritur clamor gemitusque meorum,
et feriunt maestae pectora nuda manus.

tum uero coniunx umeris abeuntis inhaerens
miscuit haec lacrimis tristia uerba suis:
'non potes auelli: simul ah! simul ibimus', inquit,
'te sequar et coniunx exulis exul ero.
et mihi facta uia est, et me capit ultima tellus:
accedam profugae sarcina parua rati.
te iubet e patria discedere Caesaris ira,
me pietas: pietas haec mihi Caesar erit.'
talia temptabat, sicut temptauerat ante,
uixque dedit uictas utilitate manus.

egredior (siue illud erat sine funere ferri?)
squalidus inmissis hirta per ora comis.
illa dolore amens tenebris narratur obortis
semianimis media procubuisse domo,
utque resurrexit foedatis puluere turpi
crinibus et gelida membra leuauit humo,
se modo, desertos modo complorasse Penates,
nomen et erepti saepe uocasse uiri,

nec gemuisse minus, quam si nataeque meumque
uidisset structos corpus habere rogos,
et uoluisse mali moriendo ponere sensum,
respectuque tamen non potuisse mei.
uiuat et absentem, quoniam sic fata tulerunt,
uiuat ut auxilio subleuet usque suo.



OS TRISTES

Quando me vem à mente a tristíssima imagem daquela noite,
Que foi para mim o último instante na Cidade,
Quando recordo a noite em que deixei tantas coisas queridas,,
Corre ainda agora uma lágrima dos meus olhos.
Já estava próxima a luz do dia em que César tinha ordenado
Que eu me retirasse dos territórios da extrema Ausônia.
Não tinha tido nem o tempo necessário
Nem o espírito suficientemente apto para me preparar:
Meu coração se tinha entorpecido com a longa demora.




Não tive o cuidado de escolher meus escravos,
Nem de escolher um companheiro, nem a indumentária
Ou coisas necessárias a um banido. Não fiquei menos atordoado
Do que aquele que, Ferido pelos raios de Júpiter ainda vive
E está, ele mesmo, inconsciente de sua vida.
Quando, porém, a própria dor removeu esta nuvem do meu espírito,
E, finalmente, os meus sentidos se restabeleceram, falo,
Pela última vez antes de partir, aos amigos tristes ,
Que dentre muitos, há pouco tempo, eram um ou dois.


A minha afetuosa esposa chorando, abraçava-me, eu que também chorava,
Com amargura, mais ainda corriam-lhe as lágrimas copiosamente
Pelas faces não merecedoras disso.
A minha filha estava longe, afastada pelas plagas da Líbia,
Nem sequer podia saber do meu destino.
Por qualquer lugar que olhasse havia um gemido, dentro da casa,
Havia o aspecto de um sentido funeral: Mulheres, homens, crianças mesmo
Estão desolados com a minha morte, e na casa, em cada canto há uma lágrima.



Se for lícito usar de grandes exemplos em pequenas coisas,
Este é o aspecto de Troia, quando foi tomada.
E já calavam-se as vozes as vozes dos homens e dos cães,
E a alta lua dirigia os seus cavalos noturnos. olhando-a
E observando desde ela o Capitólio,
Que em vão estava junto ao nosso lar, eu exclamo:
“Ó divindades habitantes nestes lugares vizinhos e templos que jamais
Serão vistos por meus olhos, e deuses que deverão ser deixados,
Os quais possui a soberba cidade de Quirino,
Senti minha saudação para todo sempre!






E embora apanhe tarde o escudo após os ferimentos,
Contudo livrai esta fuga de ódios,
E dizei ao homem celeste (Augusto) que erro me enganou,
Para que não pense existir crime em lugar de uma simples falta,
Para que o autor do meu castigo julgue também o que vós sabeis;
Aplacado esse deus, posso não  ser infeliz.”
Eu pedi aos deuses com esta prece, a minha esposa com preces mais numerosas,
Entrecortando o soluço as suas palavras pela metade.’’



Ela também prostrada ante os deuses lares
Com os cabelos desgrenhados tocou o fogo extinto com a boca trêmula,
Dirigiu aos penates adversos muitas palavras,
Que não valeriam nada em favor do seu deplorado marido.
E já a noite avançada negava o tempo para a demora,
Em a Ursa de Parrásia estava desviada de su eixo:
Que fazer? Eu era retido pelo deoce amor da pátria,
Mas aquela era última noite da fuga ordenada.






Ah! Quantas vezes eu disse quando alguém se apressava:
Por que te apressas?
Vê ou para onde te apressas a ir, ou de onde vens!
Ah! Quantas vezes fingi ter uma hora fixada,
Que fosse própria à viagem  projetada.
Três vezes toquei o limiar, três vezes voltei e o próprio pé,
Indulgente para com a alma, era lento para mim.
 Muitas vezes, depois de dizer adeus,  falei novamente muitas coisas,
E quase saindo, Dei os derradeiros beijos.
Muitas vezes dei as mesmas ordens, e eu próprio me enganei,





Olhando com meus olhos os objetos caros.
Por fim exclamo:  “Por que me apresso? Existe a Cítia para onde eu sou mandado;
Roma deve ser deixada; uma e outra demora é justa.
A esposa viva é negada para sempre a mim vivo,
E a minha casa, e os doces membros da minha fiel casa
E vós companheiros que amei de modo fraternal,
Ó corações unidos a mim pela lealdade de Teseu! Enquanto é lícito, abraçar-vos-ei: Talvez nunca mais seja lícito: a hora que me é dada é de grande proveito.








E não há demora;  deixo incompletas as palavras de minha conversa,
Abraçando os que estão próximos do meu coração.
Enquanto falo e choramos, Lúcifer brilhantíssimo no alto céu,
Estrela fatal para nós, tinha surgido.
Separo-me não de outra forma que se deixasse meus membros,
E uma parte pareceu ser arrancada do seu corpo.
Assim sofreu Mécio então, quando teve como vingadores de sua traição
Os cavalos voltamos em direções contrárias.
Então sim, levantaram-se o clamor e o choro dos meus,
E as mãos aflitas ferem os peitos nus.





Então sim a minha esposa, apoiando-se nos ombros do que partia,
Misturou estas tristes palavras às minhas lágrimas:
“Não podes ser arrancado de mim! Sairemos daqui juntamente,
Ambos ao mesmo tempo; seguir-te-ei; esposa de um exilado, exilada serei.
Também para mim o caminho do exílio foi feito e a longínqua terra me recebe.
Acrescentar-me-ei como pequena bagagem à embarcação que parte.
A ira de César ordena que saias da pátria; a mim, o amor conjugal;
Este amor será César para mim.”
Tentava tais coisas, assim como tentara antes,
E na custo deu-se por vencida por causa do nosso interesse.




Saio, ou melhor, aquilo era como ser levado sem pompa,
Esquálido com os cabelos pelas faces ásperas
Afirma-se que ela louca de dor, sobrevindo as trevas,
Semimorta caiu no meio da casa.
E assim que acordou com os cabelos sujos de pó imundo
E levantou do chão os gélidos membros,
Diz-se que ela ora chorava os penates abandonados,
Ora chorava muitas vezes o nome do marido perdido.




E não chorou menos do que se tivesse visto
As fogueiras erguidas para receber o meu corpo,
E afirma-se que ela quis morrer e morrendo perder o sentimento
E não perdeu, contudo, em consideração a mim.
Que viva! E viva para que console sempre com sua ajuda
Ao marido ausente, porque assim os fados o quiseram.
  






LITERATURA ALEMÃ - RAINER MARIA RILKE DEUTSCHE LITERATUR 
 
 
Die Einsamkeit ist wie ein Regen.
Sie steigt vom Meer den Abenden entgegen;
von Ebenen, die fern sind und entlegen,
geht sie zum Himmel, der sie immer hat.
Und erst vom Himmel fällt sie auf die Stadt.

Regnet hernieder in den Zwitterstunden,
wenn sich nach Morgen wenden alle Gassen
und wenn die Leiber, welche nichts gefunden,
enttäuscht und traurig von einander lassen;
und wenn die Menschen, die einander hassen,
in einem Bett zusammen schlafen müssen:

dann geht die Einsamkeit mit den Flüssen…

Tradução

Solidão

A solidão é como a chuva.
Levanta-se do mar em rumo à lua;
das mais remotas planícies flutua
desejando os céus, seu lar de verdade.
E cai enfim dos céus sobre a cidade.

Chove naquelas horas oscilantes,
quando as ruas o amanhecer encaram,
e quando os corpos frios dos amantes,
tristes e desiludidos, se separam;
quando duas pessoas que brigaram
dividem uma cama contrafeitos:
é quando a solidão flui para os leitos…


Biografia
 

Rainer Maria Rilke nasceu em Praga, na Boémia, (actual República Checa), então pertencente ao Império Austro-Húngaro, e mudou seu nome, originalmente René, para Rainer.
Rilke fez seus estudos nas universidades de Praga, Munique e Berlim. Em 1894 fez sua primeira publicação, uma coleção de versos de amor, intitulados Vida e canções (Leben und Lieder). Não exerceu nenhuma
profissão, tendo vivido, sempre, à custa de amigas nobres.
Alguns anos depois, em 1899, Rilke viajou para a Rússia a convite de Lou Andreas-Salomé, a escritora e depois psicanalista, filha de um general russo, e que foi sua amante por longos anos. Sua passagem pela
Rússia imprimiu uma inspiração religiosa em seus poemas. Rilke passou a enxergar a natureza, dadas as dimensões e exuberância das paisagens russas, como manifestação divina presente em todas as coisas. Sobre este aspecto publicou em 1900 a coleção Histórias do bom Deus.
Em 1901 casou com Clara Westhoff, da qual logo se separou. O século XX trouxe para a poesia de Rilke um afastamento do lirismo e dos simbolistas franceses com os quais ele se identificara. Em 1905,
publicou O Livro das Horas de grande repercussão à época. Nesta obra, seus poemas já apresentavam um estilo concreto, bem característico desta sua fase.
Em 1902 foi para Paris, onde trabalhou como secretário do escultor Auguste Rodin entre 1905 a 1906. Rodin exerceu grande influência sobre o poema de Rilke, que se reflete em suas publicações de 1907 a 1908.
Quando estourou a Primeira Guerra Mundial, em 1914, Rilke morava em Munique e lá permaneceu durante todo o conflito. Antes de se mudar para Munique, ele viveu na região do Trieste e publicou, em 1913, a A vida de Maria (Das Merien Leben) e iniciou a redação de Elegias de Duíno (Duineser Elegien), texto que só viria a ser publicado em 1923. Duíno era um castelo na região de Trieste, Itália, onde Rilke morou por dois
anos antes da Guerra, a convite da princesa Maria von Thurn und Taxis.
Após o conflito na Europa, Rilke mudou-se para a Suíça, a última de suas pátrias de eleição, onde viveu seus últimos anos.
 
Gaius Suetonius Tranquilus CULTURA LATINA – LATIN CULTURE SUETÔNIO - DEATH OF NERO (text in Portuguese, Latin, English, Spanish, French and German)

  
 A MORTE DE NERO Suetonius Tranquilus
  
 NERO Entrementes, como lhe fosse anunciada, enquanto almoçava, a deserção dos exércitos restantes, Nero rasgou a carta, virou a mesa, jogou ao chão dois copos dos quais gostava de se servir e que chamava homéricos por trazerem, esculpidas, cenas dos poemas de Homero; e, tendo encerrado num cofrezinho de ouro um veneno que lhe dera Locusta, dirigiu-se para os jardins sevilianos. Tendo daí mandado a Óstia os mais fieis libertos para que preparassem uma frota, procurou saber se os tribunos e centuriões do pretório queriam acompanhá-lo na fuga. Mas uns mostraram-se hesitantes, outros recusaram-se abertamente e um deles chegou a gritar: “É tão grande infelicidade morrer?” Nero formou então vários projetos: apresentar-se suplicante aos persas ou a Galba, ou aparecer em público vestido de preto e, do alto dos rostros, pedir perdão para o seu passado em tom mais patético possível; e, se não comovesse os corações, solicitar-lhe que lhe fosse ao menos concedida a prefeitura do Egito. Encontrou-se, mais tarde, no seu escrínio, um discurso preparado sobre esse assunto. Mas abandonou a ideia por receio de ser feito em pedaços antes que chegasse ao foro. Deixou, pois, a decisão para o dia seguinte, mas manteve-se desperto até quase meia noite e, como o informassem de que o piquete de guardas se havia retirado, saltou do leito e mandou buscar os seus amigos. Visto que ninguém o atendeu, ele mesmo, com uns poucos companheiros, foi pedir hospitalidade a cada um. Como, porém, encontrasse fechadas as portas de todos e ninguém lhe respondesse, voltou para o seu quarto, de onde, também, os guardas já haviam fugido, roubando até as cobertas e levando mesmo a caixinha de veneno. Imediatamente procurou o gladiador Epículo ou qualquer outro assassino por cuja mão perecesse; não encontrando ninguém, disse: “Então eu não tenho nem amigo nem inimigo?” E saiu correndo como se fosse lançar-se no Tibre. Abandonando, porém, este primeiro impulso, desejou um esconderijo secreto para ordenar seus pensamentos. O liberto Faonte ofereceu-lhe sua casa de campo situada entre a via Salária e a Nomentana, a quatro milhas de Roma; como estava descalço e apenas de túnica, pôs por cima um pequeno manto desbotado, cobriu a cabeça, estendeu um lenço diante do rosto e montou a cavalo acompanhado apenas por quatro homens, entre os quais também esporo. E logo, atemorizado por um tremor de terra e por um clarão que se fez à sua frente, ouviu, vindo dos acampamentos próximos, o clamor dos soldados, que elevavam votos contrários a ele e a favor de Galba. Um dos caminhantes que encontraram diz: “Esses persegue a Nero”. E um outro pergunta: “Há na cidade alguma novidade a respeito de Nero?” Como, porém, o cavalo se espantasse devido ao cheiro de um cadáver lançado na estrada, Nero descobriu o rosto, sendo reconhecido por um pretoriano reformado, que o saudou. Quando chegaram a um desvio, deixaram os cavalos e, caminhando pelo meio do mato e dos espinheiros e por uma vereda margeada de caniços, Nero chegou penosamente à parte posterior da casa, não sem ter estendido as vestes sob os pés. Ali, como Faonte o convidasse a se esconder um momento num buraco feito na areia, disse que não queria ir vivo para debaixo da terra. E, detendo-se um pouco enquanto preparavam uma entrada secreta para a casa, tirou com a mão, para beber, a água de um charco que estava a seus pés e disse: “Eis o refresco de Nero.” Depois, com o pequeno manto rasgado pelos espinhos e, andando de gatinhas, pela estreita passagem que haviam cavado, recolheu-se ao compartimento mais próximo e deitou-se num leito guarnecido de um colchão modesto e coberto por um velho manto; e como o importunasse a fome e, novamente, a sede, rejeitou o pão grosseiro que lhe era ofertado, mas bebeu grande quantidade de água morna. Então, como cada um de seus companheiros o aconselhasse, por sua vez, a furtar-se quanto antes às injúrias que o esperavam, mandou cavar diante dele um fosso com as dimensões de seu corpo e colocar em redor, se o encontrassem, pedaços de mármore e trazer água e lenha para que se cuidasse logo do cadáver. A cada ordem, chorava e repetia, de quando em quando: “Que grande artista vai perecer comigo.” Enquanto se demoravam nesses preparativos, um mensageiro trouxe uma carta a Faonte. Nero tomou-a precipitadamente e leu que o senado o considerava inimigo público e o procurava para puni-lo segundo o costume dos antepassados; perguntou qual era o gênero de castigo e, como fosse informado de que o condenado era despido, sua cabeça posta numa forquilha e seu corpo fustigado com varas até a morte, aterrorizou-se, agarrou dois punhais que trouxera consigo, experimentou o corte de um e de outro, e novamente os guardou, pretextando que ainda não chegara o momento fatal. Ora incitava Esporo a começar as lamentações e prantos, ora pedia que alguém o encorajasse, com seu exemplo, a procurar a morte; às vezes censurava a própria fraqueza com estas palavras: “Estou me portando de maneira vergonhosa, ignóbil; isto é indigno de Nero; é indigno; é preciso ter coragem nessas ocasiões; vamos, levanta-te.”Mas já se aproximavam os cavaleiros aos quais fora ordenado que o conduzissem para Roma. Quando o percebeu, disse tremendo: “O galope dos cavalos de pés rápidos fere meus ouvidos.” E, ajudado por Epafrodito, o encarregado dos requerimentos, enterrou o ferro no pescoço. Estava ainda agonizante quando um centurião entrou precipitadamente e, fingindo que vinha em seu socorro, comprimiu a ferida com a mão. Nero apenas respondeu: “É tarde” e “este é fiel.” A estas palavras, expirou. Seus olhos salientes e fixos incutiam nos presentes espanto e medo. O que primeiro e principalmente pedira aos companheiros fora que ninguém se apossasse de sua cabeça mas, de qualquer maneira, o cadáver fosse inteiramente queimado. Isto foi permitido por Icelo, liberto de Galba, não muito antes libertado da prisão em que fora lançado no começo do levante. Os funerais de Nero custaram duzentos mil sestércios. Foi envolvido em lençóis brancos bordados a ouro, dos quais se utilizara nas calendas de janeiro. Suas amas Egloge e Alexandria, ajudados por Acte, sua concubina, encerraram seus restos mortais no túmulo da família dos Domícios, que se avista do Campo de Marte, sobre a colina dos Jardins.Há nesse monumento um sarcófago de pórfiro encimado por um altar em mármore de Luna e cercado por uma balaustrada em pedra de Tassos. Nero era de estatura quase mediana, tinha o corpo cheio de manchas e malcheiroso, o cabelo um tanto loiro, o rosto mais belo do que agradável, os olhos azulados e lânguidos, o pescoço grosso, o abdômen proeminente, as pernas finíssimas, a saúde excelente: conquanto desregradíssimo, adoeceu apenas três vezes em quatorze anos e não precisou abster-se de vinho nem dos outros costumes. Quanto a seus hábitos e apresentação, era de tal modo ignóbil que sempre arrumava o cabelo formando degraus e, durante sua viagem pela Acádia, deixou-o mesmo cair por detrás da nuca; e, muitas vezes, mostrava-se em público vestindo roupas de dormir, com um lenço amarrado ao pescoço, sem cinto e descalço.
Gaius Suetonius Tranquillus, De Vitis Caesarum. Nero, 47-51. SVETONI TRANQVILII VITA NERONIS (VLVII-LI) XLVII. Nuntiata interim etiam ceterorum exercituum defectione litteras prandendi sibi redditas concerpserit, mensam subvertit, duos scyphos gratissimi usus, quos Homericos a caelatura carminum Homeri vocabat, solo inlisit ac sumpto a Lucusta veneno et in auream pyxidem condito transiit in hortos Servilianos, ubi praemissis libertorum fidissimis Ostiam ad classem praeparandam tribunos centurionesque praetorii de fugae societate temptavit. 2 Sed partim tergiversantibus, partim aperte detrectantibus, uno vero etiam proclamante: "Usque adeone mori miserum est?" varie agitavit, Parthosne an Galbam supplex peteret, an atratus prodiret in publicum proque rostris quanta maxima posset miseratione veniam praeteritorum precaretur, ac ni flexisset animos, vel Aegypti praefecturam concedi sibi oraret. Inventus est postea in scrinio eius hac de re sermo formatus; sed deterritum putant, ne prius quam in Forum perveniret discerperetur. 3 Sic cogitatione in posterum diem dilata ad mediam fere noctem excitatus, ut comperit stationem militum recessisse, prosiluit e lecto misitque circum amicos, et quia nihil a quoquam renuntiabatur, ipse cum paucis hospitia singulorum adiit. Verum clausis omnium foribus, respondente nullo, in cubiculum rediit, unde iam et custodes diffugerant, direptis etiam stragulis, amota et pyxide veneni; ac statim Spiculum murmillonem vel quemlibet alium percussorem, cuius manu periret, requisiit et nemine reperto "Ergo ego" inquit "nec amicum habeo, nec inimicum?" procurritque, quasi praecipitaturus se in Tiberim. XLVIII. Sed revocato rursus impetu aliquid secretioribus latebrae ad colligendum animum desideravit, et offerente Phaonte liberto suburbanum suum inter Salariam et Nomentanam viam circa quartum miliarum, ut erat nudo pede atque tunicatus, paenulam obsoleti coloris superinduit adopertoque capite et ante faciem optento sudario equum inscendit, quattuor solis comitantibus, inter quos et Sporus erat. 2 Statimque tremore terrae et fulgure adverso pavefactus audiit e proximis castris clamorem militum et sibi adversa et Galbae prospera ominantium, etiam ex obviis viatoribus quendam dicentem: 'Hi Neronem persequuntur', alium sciscitantem: 'Ecquid in urbe novi de nerone?' Equo autem ex odore abiecti in via cadaveris consernato detecta facie agnitus est a quodam missicio praetoriano et salutatus. 3 Ut ad deverticulum ventum est, dimissis equis inter fruticeta ac vepres per harundineti semitam aegre nec nisi strata sub pedibus veste ad aversum villae parietem evasit. Ibi hortante eodem Phaotne, ut interim in specum egestae harenae concederet, negavit se vivum sub terram iturum, ac parumper commoratus, dum clandestinus ad villam introitus pararetur, aquam ex subiecta lacuna poturus manu hausit et 'Haec est' inquit, 'Neronis decocta.' 4 Dein divolsa sentibus paenula traiectos surculos rasit, atque ita quadripes per angustias effossae cavernae receptus in proximam cellam decubuit super lectum modica culcita, vetere pallio strato, instructum; fameque et iterum siti interpellante panem quidem sordidum oblatum aspernatus est, aquae autem tepidae aliquantum bibit. XLIX. Tunc uno quoque hinc inde instante ut quam primum se impendentibus contumeliis eriperet, scrobem coram fieri imperavit dimensus ad corporis sui modulum, componique simul, si qua invenirentur, frustra marmoris et aquam simul ac ligna conferri curando mox cadaveri, flens ad singula atque identidem dictitans: 'Qualis artifex pereo!'. 2 Inter moras perlatos a cursore Phaonti codicillos praeripuit legitque se hostem a senatu iudicatum et quaeri, ut puniatur more maiorum, interrogavitque, quale id genus esset poenae; et cum comperisset nudi hominis cervicem inseri furcae, corpus virgis ad necem caedi, conterritus duos pugiones, quos secum extulerat, arripuit temptataque utriusque acie rursus condidit, causatus nondum adesse fatalem horam. 3 Ac modo Sporum hortabatur, ut lamentari ac plangere inciperet, modo orabat, ut se aliquis ad mortem capessendam exemplo iuvaret; interdum segnitiem suam his verbis increpabat: 'Vivo deformiter, turpiter - οὐ πρέπει Νέρωνι, οὐ πρέπει - νήφειν δεῖ ἐν τοῖς τοιούτοις - ἄγε ἔγειρε σεαυτόν.'. Iamque equites appropinquabant, quibus praeceptum erat, ut vivum eum adtraherent. Quod ut sensit, trepidanter effatus: 'Ἵππων μ᾽ ὠκυπόδων ἀμφὶ κτύπος οὔατα βάλλει' ferrum iugulo adegit iuvante Epaphrodito a libellis. 4 Semianimisque adhuc irrumpenti centurioni et paenula ad vulnus adposita in auxilium se venisse simulanti non aliud respondit quam 'Sero' et 'Haec est fides'. atque in ea voce defecit, exstantibus rigentibusque oculis usque ad horrorem formidinemque visentium. Nihil prius aut magis a comitibus exegerat quam ne potestas cuiquam capitis sui fieret, sed ut quoquo modo totus cremaretur. Permisit hoc Icelus, Galbae libertus, non multo ante vinculis exsolutus, in quae primo tumultu coniectus fuerat. L. Funeratus est impensa ducentorum milium, stragulis albis auro intextis, quibus usus Kal. Ian. fuerat. Reliquias Egloge et Alexandria nutrices cum Acte concubina gentili Domitiorum monirnento condiderunt quod prospicitur e campo Martio impositum colli Hortulorum. In eo monimento solium porphyretici marmoris, superstante Lunensi ara, circumsaeptum est lapide Thasio. LI. Statura fuit prope iusta, corpore maculoso et fetido, subflavo capillo, vultu pulchro magis quam venusto, oculis caesis et hebetioribus, cervice obesa, ventre proiecto, gracillmis cruribus, valitudine prospera; nam qui luxuriae immoderatissimae esset, ter omnino per quattuordecim annos languit, atque ita ut neque vino neque consuetudine reliqua abstineret; circa cultum habitumque adeo pudendus, ut comam semper in gradus formatam peregrinatione Achaica etiam pone verticem summiserit ac plerumque synthesinam indutus ligato circum collum sudario in publicum sine cinctu et discalciatus. 
The Lives of the Twelve Caesars Nero Claudius Caesar (XLVII-LI) NERO’S DEAD XLVII. Meanwhile, on the arrival of the news, that the rest of the armies had declared against him, he tore to pieces the letters which were delivered to him at dinner, overthrew the table, and dashed with violence against the ground two favourite cups, which he called Homer's, because some of that poet's verses were cut upon them. Then taking from Locusta a dose of poison, which he put up in a golden box, he went into the Servilian gardens, and thence dispatching a trusty freedman to Ostia, with orders to make ready a fleet, he endeavoured to prevail with some tribunes and centurions of the pretorian guards to attend him in his flight; but part of them showing no great inclination to comply, others absolutely refusing, and one of them crying out aloud, Usque adeone mori miserum est? Say, is it then so sad a thing to die? 625 he was in great perplexity whether he should submit himself to Galba, or apply to the Parthians for protection, or else appear before the people dressed in mourning, and, upon the rostra, in the most piteous manner, beg pardon for his past misdemeanors, and, if he could not prevail, request of them to grant him at least the government of Egypt. A speech to this purpose was afterwards found in his writing-case. But it is conjectured that he durst not venture upon this project, for fear of being torn to pieces, before he could get to the Forum. Deferring, therefore, his resolution until the next (376) day, he awoke about midnight, and finding the guards withdrawn, he leaped out of bed, and sent round for his friends. But none of them vouchsafing any message in reply, he went with a few attendants to their houses. The doors being every where shut, and no one giving him any answer, he returned to his bed-chamber; whence those who had the charge of it had all now eloped; some having gone one way, and some another, carrying off with them his bedding and box of poison. He then endeavoured to find Spicillus, the gladiator, or some one to kill him; but not being able to procure any one, "What!" said he, "have I then neither friend nor foe?" and immediately ran out, as if he would throw himself into the Tiber. XLVIII. But this furious impulse subsiding, he wished for some place of privacy, where he might collect his thoughts; and his freedman Phaon offering him his country-house, between the Salarian 626 and Nomentan 627 roads, about four miles from the city, he mounted a horse, barefoot as he was, and in his tunic, only slipping over it an old soiled cloak; with his head muffled up, and an handkerchief before his face, and four persons only to attend him, of whom Sporus was one. He was suddenly struck with horror by an earthquake, and by a flash of lightning which darted full in his face, and heard from the neighbouring camp 628 the shouts of the soldiers, wishing his destruction, and prosperity to Galba. He also heard a traveller they met on the road, say, "They are (377) in pursuit of Nero:" and another ask, "Is there any news in the city about Nero?" Uncovering his face when his horse was started by the scent of a carcase which lay in the road, he was recognized and saluted by an old soldier who had been discharged from the guards. When they came to the lane which turned up to the house, they quitted their horses, and with much difficulty he wound among bushes, and briars, and along a track through a bed of rushes, over which they spread their cloaks for him to walk on. Having reached a wall at the back of the villa, Phaon advised him to hide himself awhile in a sand-pit; when he replied, "I will not go under-ground alive." Staying there some little time, while preparations were made for bringing him privately into the villa, he took up some water out of a neighbouring tank in his hand, to drink, saying, "This is Nero's distilled water." 629 Then his cloak having been torn by the brambles, he pulled out the thorns which stuck in it. At last, being admitted, creeping upon his hands and knees, through a hole made for him in the wall, he lay down in the first closet he came to, upon a miserable pallet, with an old coverlet thrown over it; and being both hungry and thirsty, though he refused some coarse bread that was brought him, he drank a little warm water. XLIX. All who surrounded him now pressing him to save himself from the indignities which were ready to befall him, he ordered a pit to be sunk before his eyes, of the size of his body, and the bottom to be covered with pieces of marble put together, if any could be found about the house; and water and wood 630, to be got ready for immediate use about his corpse; weeping at every thing that was done, and frequently saying, "What an artist is now about to perish!" Meanwhile, letters being brought in by a servant belonging to Phaon, he snatched them out of his hand, and there read, "That he had been declared an enemy by the senate, and that search was making for him, that he might be punished according to the ancient custom of the Romans." He then inquired what kind of punishment that was; and being told, that the (378) practice was to strip the criminal naked, and scourge him to death, while his neck was fastened within a forked stake, he was so terrified that he took up two daggers which he had brought with him, and after feeling the points of both, put them up again, saying, "The fatal hour is not yet come." One while, he begged of Sporus to begin to wail and lament; another while, he entreated that one of them would set him an example by killing himself; and then again, he condemned his own want of resolution in these words: "I yet live to my shame and disgrace: this is not becoming for Nero: it is not becoming. Thou oughtest in such circumstances to have a good heart: Come, then: courage, man!" 631 The horsemen who had received orders to bring him away alive, were now approaching the house. As soon as he heard them coming, he uttered with a trembling voice the following verse, Hippon m' okupodon amphi ktupos ouata ballei; 632 The noise of swift-heel'd steeds assails my ears; he drove a dagger into his throat, being assisted in the act by Epaphroditus, his secretary. A centurion bursting in just as he was half-dead, and applying his cloak to the wound, pretending that he was come to his assistance, he made no other reply but this, "'Tis too late;" and "Is this your loyalty?" Immediately after pronouncing these words, he expired, with his eyes fixed and starting out of his head, to the terror of all who beheld him. He had requested of his attendants, as the most essential favour, that they would let no one have his head, but that by all means his body might be burnt entire. And this, Icelus, Galba's freedman, granted. He had but a little before been discharged from the prison into which he had been thrown, when the disturbances first broke out. L. The expenses of his funeral amounted to two hundred thousand sesterces; the bed upon which his body was carried to the pile and burnt, being covered with the white robes, interwoven with gold, which he had worn upon the calends of January preceding. His nurses, Ecloge and Alexandra, with his concubine Acte, deposited his remains in the tomb belonging (379) to the family of the Domitii, which stands upon the top of the Hill of the Gardens 633, and is to be seen from the Campus Martius. In that monument, a coffin of porphyry, with an altar of marble of Luna over it, is enclosed by a wall built of stone brought from Thasos. 634 LI. In stature he was a little below the common height; his skin was foul and spotted; his hair inclined to yellow; his features were agreeable, rather than handsome; his eyes grey and dull, his neck was thick, his belly prominent, his legs very slender, his constitution sound. For, though excessively luxurious in his mode of living, he had, in the course of fourteen years, only three fits of sickness; which were so slight, that he neither forbore the use of wine, nor made any alteration in his usual diet. In his dress, and the care of his person, he was so careless, that he had his hair cut in rings, one above another; and when in Achaia, he let it grow long behind; and he generally appeared in public in the loose dress which he used at table, with a handkerchief about his neck, and without either a girdle or shoes.
LA MUERTE DE NERÓN CLAUDIO XLVII. Se difundió, entre tanto, el rumor de haberse sublevado también los demás ejércitos, y enfurecido rasgó las cartas que le trajeron durante la comida, derribó la mesa, rompió contra el suelo dos vasos, que llamaba homéricos por estar esculpidos en ellos asuntos tomados de los poemas épicos de Homero y a los que tenía en gran estima; acto seguido hizo que Locusta le diese veneno, lo encerró en una caja de oro y marchó a los jardines de Servilio. Una vez allí, mientras sus libertos más fieles iban a Ostia para disponer naves, trató de conseguir que los tribunos y centuriones del Pretorio le acompañasen en su fuga; unos se excusaron y otros se negaron abiertamente, llegando uno a decirle: ¿Tanta desgracia es morir? Concibió entonces diferentes proyectos; pensó en huir al territorio de los partos, ir a arrojarse a las plantas de Galba, pensó también en presentarse públicamente en la tribuna de las arengas con traje de luto y pedir allí, con el acento más lastimero posible, que le perdonasen el pasado, o sí los corazones permanecían insensibles, que le concediesen al menos la prefectura de Egipto (148). Entre sus papeles se encontró después el discurso que había compuesto para este objeto, y se asegura que el único motivo que le impidió pronunciarlo fue el temor de que lo despedazasen antes de llegar al Foro. Aplazó entonces para la mañana siguiente el tomar una decisión, pero habiendo despertado a medianoche se enteró de que le habían abandonado sus guardias. Salto del lecho y envió aviso a casa de todos sus amigos; no recibió contestación, y fue entonces con reducido séquito a pedir refugio a algunos de ellos. Todas las puertas permanecieron cerradas y nadie le contestó. Regresó entonces a su cámara: los centinelas habían huido, llevándose hasta las ropas de su lecho y la caja de oro en que tenía guardado el veneno. Pidió en seguida que le llevasen al gladiador Spículo u otro cualquiera para que le diesen muerte, y no encontrando a nadie que quisiese matarle, exclamó: ¿Acaso no tengo amigos ni enemigos?. Y corrió a precipitarse al Tíber. XLVIII. A pesar de todo, se detuvo y buscó un refugio para meditar lo que podía hacer. Su liberto Faón le ofreció su casa de campo, situada entre la vía Salaria y la Nomentana, a cuatro millas de Roma. Vestido con la túnica y los pies desnudos como se encontraba, montó a caballo; iba envuelto en un manto viejo y desteñido; llevaba la cabeza cubierta y un pañuelo delante del rostro; acompañábanle cuatro personas, entre ellas Sporo. En cierto momento, sintió temblar la tierra, rasgó un relámpago la tiniebla y le invadió el terror; al pasar cerca del campamento de los pretorianos, oyó los gritos de los soldados que le lanzaban imprecaciones y hacían votos por Galba. Un viajero, al ver el pequeño grupo, dijo: Estos persiguen a Nerón. Otro preguntó: ¿Qué hay de nuevo en Roma, con respecto a Nerón? El hedor de un cadáver abandonado en el camino hizo retroceder a su caballo; le cayó el pañuelo con que se ocultaba el rostro, y un veterano pretoriano le reconoció y le saludo por su nombre; llegado a un camino de traviesa, despidió los caballos, penetró entre abrojos y espinas, en un sendero cubierto de zarzas en el que no podía avanzar más que haciendo tender ropas bajos sus pies, y llegó así con gran trabajo a las tapias de la casa de campo en una cantera de la que habían sacado arena, pero él replicó que no quería enterrarse vivo, y habiéndose detenido para esperar que abriesen la entrada secreta de la casa, cogió en la mano agua de una charca, y dijo antes de beberla: He aquí los refrescos de Nerón. Comenzó después a arrancar las zarzas que se habían enredado en su manto, y hecho esto, por un agujero abierto debajo de la tapia, fue arrastrándose sobre las manos, hasta la habitación más próxima, en la que se acostó sobre un jergón cubierto con una vieja manta. Atormentábale de cuando en cuando el hambre y la sed, y le ofrecieron pan de mala calidad, que rehusó, y agua templada, de la que bebió una poca. XLIX Instábanle cuantos le acompañaban a que se substrajese sin tardanza a los ultrajes que le amenazaban. y pidió que abriesen un foso delante de él, a la medida de su cuerpo, que lo rodeasen con algunos pedazos de mármol, si se encontraban, y que llevasen agua y leña para tributar los últimos honores a su cadáver; a cada orden que daba se ponía a llorar, y repetía sin cesar: ¡Qué muerte para tan grande artista! En medio de estos preparativos, llegó un correo a entregarle una carta de Faón; la cogió y leyó en ella que el Senado le había declarado enemigo de la patria, y le hacía buscar para castigarle de acuerdo con las leves antiguas. Preguntó en qué consistía este suplicio, y le contestaron que en desnudar al criminal, sujetarle el cuello en una horqueta y azotarlo con varas hasta hacerle morir. Aterrado, cogió entonces dos puñales que había llevado consigo, probó la punta y volvió a envainarlos, diciendo que no había llegado aún la hora fatal. Unas veces exhortaba a Sporo a lamentarse y llorar con él; otras pedía que alguno se matase, para, con su ejemplo, darle valor para morir. También a veces se censuraba su cobardía, diciéndose: Arrastro una vida vergonzosa y miserable, y añadía en griego: Esto no es propio de Nerón; esto no le es propio; en tales momentos es necesario decidirse; vamos, despierta. Acercábanse ya los jinetes que tenían orden de cogerle vivo, y cuando los oyó, recitó temblando este verso griego: Oigo el paso veloz de animosos corceles. y se clavó en seguida el hierro en la garganta, ayudado por su secretario Epafrodio. Respiraba aún cuando entró el centurión; quiso vendarle la herida, fingiendo que llegaba para socorrerle, y Nerón le dijo: Es tarde; y añadió: ¡cuánta fidelidad! Al pronunciar estas palabras expiró con los ojos abiertos y fijos, despertando espanto y horror en todos los que le contemplaban. Había recomendado con vivas instancias a sus compañeros de fuga que no abandonasen su cabeza a nadie, y que fuese como fuese, le quemasen entero. Icelo, liberto de Galba, que acababa de salir del encierro donde le arrojaron al comenzar la insurrección, concedió la autorización para hacerlo. L. Los funerales de Nerón costaron doscientos mil sestercios; emplearon en ellos tapices blancos bordados de oro, de que se había servido el día de las calendas de enero. Sus nodrizas Eclogea y Alejandra, con su concubina Actea, depositaron sus restos en la tumba de Domicio, que se ve en el campo de Marte, sobre la colina de los jardines. El monumento es de pórfido, y está coronado por un altar de mármol de Luna y lo circunda una balaustrada de mármol de Paros. LI. Era de mediana estatura; tenía el cuerpo cubierto de manchas, y hedía; los cabellos eran rubios, la faz más bella que agradable; los ojos azules, y la vista débil; robusto el cuello, el vientre abultado, las piernas sumamente delgadas y el temperamento vigoroso. A pesar de sus desenfrenados excesos, sólo se encontró indispuesto tres veces en el espacio de catorce años, y en ellas ni siquiera tuvo que abstenerse del vino, ni que variar nada de sus costumbres. No cuidaba del traje ni apostura, y durante su permanencia en Acaya, se le vio dejar caer por detrás el cabello, que llevaba siempre rizado en bucles simétricos; se presentó muchas veces en público con trajes de festín, un pañuelo en torno al cuello, sin cinturón y descalzo.
LA MORT DE NÉRON XLVII. Révolte des autres armées. Néron est abandonné par tout le monde. (1) Bientôt on lui annonça la défection des autres armées. Il déchira la lettre qu'on lui remit pendant son dîner, renversa la table, brisa contre terre deux vases dont il aimait à se servir, et qu'il appelait homériques, parce qu'on y avait sculpté des sujets tirés d'Homère; puis il se fit donner du poison par Locuste, le mit dans une botte d'or, et passa dans les jardins de Servilius. Là, il envoya à Ostie ses plus fidèles affranchis pour y préparer une flotte, et voulut engager les tribuns et les centurions du prétoire à l'accompagner dans sa fuite. (2) Mais les uns hésitèrent, les autres refusèrent sans détour. L'un d'eux s'écria même: "Est-ce un si grand malheur que de cesser de vivre?" Alors il délibéra s'il se retirerait chez les Parthes, s'il irait se jeter aux pieds de Galba, ou s'il paraîtrait en public avec des habits de deuil pour demander du haut de la tribune aux harangues, de la voix la plus lamentable, qu'on lui pardonnât son passé. Il espérait, s'il ne parvenait à toucher les coeurs, obtenir du moins le gouvernement de l'Égypte. (3) On trouva même dans son écritoire un discours sur ce sujet. Mais il fut détourné, dit-on, de ce dessein, par la crainte d'être mis en pièces avant d'arriver au Forum. (4) Il remit donc au lendemain à prendre un parti. Réveillé vers minuit, il s'aperçut que ses gardes l'avaient abandonné. Il sauta de son lit et envoya chercher ses amis. Mais, n'en recevant aucune réponse, il alla lui-même avec peu de monde se présenter chez eux. (5) Il trouva toutes les portes fermées, et personne ne lui répondit. Il revint dans sa chambre: les sentinelles avaient pris la fuite en emportant jusqu'à ses couvertures et la boîte d'or où était le poison. Il demanda aussitôt le gladiateur Spiculus ou quelque autre qui voulut l'égorger. Mais, ne trouvant personne: "Je n'ai donc, dit-il, ni amis, ni ennemis," et il courut comme s'il allait se précipiter dans le Tibre. XLVIII. Il fuit avec quatre personnes. Incident de cette fuite (1) Revenu de ce premier mouvement, il chercha quelque retraite obscure pour reprendre ses esprits. Phaon, son affranchi, lui offrit sa villa située vers le quatrième milliaire, entre la voie Salaria et la voie Nomentane. Il monta à cheval, pieds nus et en tunique, comme il était, enveloppé d'une casaque usée, la tête couverte et un voile sur le visage, n'ayant pour suite que quatre personnes parmi lesquelles était Sporus. (2) Un tremblement de terre et un éclair le glacèrent d'effroi. Du camp voisin il entendit les cris des soldats qui faisaient des imprécations contre lui et des voeux pour Galba. Un des passants qu'on rencontra se mit à dire: "Voilà des gens qui poursuivent Néron." Un autre demanda: "Que dit-on à Rome de Néron?" (3) Son cheval s'étant effarouché de l'odeur d'un cadavre abandonné sur la route, il découvrit son visage et fut reconnu par un ancien soldat prétorien qui le salua. (4) Arrivé à la traverse, il renvoya les chevaux et s'avança avec tant de peine à travers des taillis et des buissons dans un sentier planté de roseaux, que, pour parvenir derrière la maison de campagne, il fut obligé de mettre son vêtement sous ses pieds. (5) Phaon lui conseilla de se retirer dans une carrière d'où l'on avait extrait du sable; mais il répondit qu'il ne voulait pas s'enterrer tout vif. En attendant qu'on trouvât le moyen de pratiquer une entrée secrète dans cette villa, il puisa de l'eau d'une mare dans le creux de sa main et la but en disant: "Voilà donc les rafraîchissements de Néron." (6) Puis il se mit à arracher les ronces dont sa casaque était percée. Enfin il se traîna sur les mains par une ouverture étroite jusque dans la chambre la plus voisine où il se coucha sur un lit garni d'un mauvais matelas et d'un vieux manteau pour couverture. Quoique tourmenté par la faim et la soif, il refusa le pain grossier qu'on lui présentait, et ne but qu'un peu d'eau tiède. XLIX. Ses derniers moments. Ses hésitations. Sa lâcheté. Sa mort (1) Cependant on le pressait de tous côtés de se soustraire le plus tôt possible aux outrages qui le menaçaient. Il fit donc creuser devant lui une fosse à la mesure de son corps, voulut qu'on l'entourât de quelques morceaux de marbre, si l'on en trouvait, et qu'on apportât de l'eau et du bois pour rendre les derniers devoirs à ses restes. Chacun de ces préparatifs lui arrachait des larmes, et il répétait de temps en temps: "Quel artiste va périr!" (2) Au milieu de tous ces délais, un coureur remit un billet à Phaon. Néron s'en saisit, et y lut que le sénat l'avait déclaré ennemi public, et qu'on le cherchait pour le punir selon les lois des anciens. Il demanda quel était ce supplice. On lui dit qu'on dépouillait le coupable, qu'on lui passait le cou dans une fourche, et qu'on le battait de verges jusqu'à la mort. Épouvanté, il saisit deux poignards qu'il avait sur lui, en essaya la pointe, et les remit dans leur gaine en disant que son heure fatale n'était pas encore venue. (3) Tantôt il engageait Sporus à entonner les lamentations et à commencer les pleurs, tantôt il demandait que quelqu'un lui donnât l'exemple de se tuer; quelquefois enfin il se reprochait sa lâcheté en ces termes: "Ma vie est honteuse et infâme. Cela ne sied pas à Néron, non. Il faut être sage dans de pareils moments. Allons, réveillons-nous." (4) Déjà approchaient les cavaliers qui avaient ordre de l'amener vivant. Dès qu'il les entendit, il prononça en tremblant ce vers grec: "Le galop des coursiers résonne à mes oreilles."; puis il s'enfonça le fer dans la gorge, aidé par son secrétaire, Épaphrodite. (6) Il respirait encore lorsqu'un centurion entra. Feignant d'être venu à son secours, il appliqua sa casaque sur la blessure. Néron ne lui dit que ces mots: "Il est trop tard", et ceux-ci: "Voilà donc la fidélité!". (7) Il mourut en les prononçant. Ses yeux étaient hors de sa tête, et leur fixité saisissait d'horreur et d'effroi tous les spectateurs. (8) Il avait surtout expressément recommandé à ses compagnons qu'on n'abandonnât sa tête à personne, mais qu'on le brûlât tout entier, de quelque manière que ce fût. (9) Ils obtinrent cette grâce d'Icelus, affranchi de Galba, qui venait d'être délivré de la prison où on l'avait jeté au commencement de l'insurrection. L. Ses funérailles (1) Ses funérailles coûtèrent deux cent mille sesterces. On se servit pour l'ensevelir d'une étoffe blanche brodée d'or, qu'il avait portée aux calendes de janvier. (2) Ses nourrices Eglogé et Alexandra, avec sa concubine Acté, déposèrent ses restes dans le monument des Domitii, que l'on aperçoit du Champ de Mars, au-dessus de la colline des Jardins.(3) La tombe est de porphyre; elle porte un autel de marbre de Luna, et est entourée d'une balustrade en marbre de Thasos. LI. Son portrait (1) Néron avait une taille ordinaire. Son corps était hideux et couvert de taches, sa chevelure blonde, sa figure plutôt belle qu'agréable, ses yeux bleus et faibles, le cou fort, le ventre gros, les jambes grêles, le tempérament vigoureux. Malgré l'excès de ses débauches, il ne fut malade que trois fois en quatorze ans; encore ne le fut-il pas au point d'être obligé de s'abstenir de vin, ou de rien changer à ses habitudes. (2) Il avait si peu de décence et de tenue, que, dans son voyage en Grèce, il laissa retomber derrière sa tête ses cheveux, qui d'ailleurs étaient toujours disposés en étages, et que souvent il parut en public vêtu d'une espèce de robe de chambre, un mouchoir autour du cou, sans ceinture ni chaussures.
Der Tod Neros - Sueton 47.Als inzwischen die Nachricht anlangte, dass auch die übrigen Heere ihren Abfall erklärt hätten, riss er die Depeschen, welche ihm beim Frühmahl übergeben worden waren, in kleine Stücke, stieß den Tisch um, schmetterte zwei ihm besonders werte Mundbecher, die er die homerischen zu nennen pflegte, weil auf ihnen Szenen aus Homers Gedichten abgebildet waren, gegen den Fußboden und begab sich dann, nachdem er sich von der Lucusta Gift hatte reichen lassen, das er in ein goldenes Büchschen tat, in die Servilianischen Gärten. Von hier sandte er seine treuesten Freigelassenen nach Ostia voraus, um die Flotte segelfertig zu machen, und versuchte dann die Tribunen und Centurionen seiner Leibwache zu bereden, ihn auf seiner Flucht zu begleiten. Als sie aber teils Ausflüchte machten, teils sich offen weigerten und einer sogar laut ausrief: “Ist denn Sterben so gar was Entsetzliches?" da schwankte er zwischen den verschiedensten Plänen hin und her: ob er sich an die Parther oder an Galba als Schutzsuchender wenden, ob er in Trauerkleidern aufs Forum gehen und von der Rednerbühne herab mit allen ihm zu Gebote stehenden Mitteln der Rührung Verzeihung für sein vergangenes Leben erflehen und, falls er keinen Eindruck gemacht haben würde, wenigstens um Bewilligung der Statthalterschaft von Agypten bitten solle. Es fand sich später in seinem Schreibpult wirklich ein vollkommen ausgearbeiteter Vortrag über diesen Gegenstand. Allein er stand von seinem Vorhaben ab; wie man glaubt, weil er fürchtete, das Volk möchte ihn, ehe er noch das Forum erreiche, in Stücke reißen. So verschob er denn die weitere Überlegung auf den folgenden Tag, wurde aber gegen Mitternacht aus dem Schlaf aufgestört und sprang, als er erfuhr, die diensthabende Soldatenabteilung sei abgezogen, aus dem Bett auf und schickte nach seinen Freunden. Und weil er von keinem einzigen eine Antwort erhielt, machte er sich selbst mit wenigen Begleitern nach den Wohngemächern der einzelnen auf. Da er aber aller Türen verschlossen fand und keiner Antwort auf sein Rufen gab, kehrte er in sein Schlafgemach zurück, wo bereits auch die Kämmerlinge entflohen waren, nachdem sie die Polsterbezüge geraubt, ja sogar das Büchschen mit Gift beiseite gebracht hatten. Sofort befahl er, den Gladiator Spiculus oder den ersten besten geschickten Fechter herbeizurufen, um sich von dessen Hand den Tod geben zu lassen. Und da man keinen fand, rannte er mit dem Ausruf: „So habe ich denn weder einen Freund noch einen Feind!" aus dem Palast, wie wenn er sich in den Tiber stürzen wollte. 48. Indessen besann er sich ebenso plötzlich wieder eines ändern und sprach den Wunsch aus nach irgendeinem möglichst versteckten Schlupfwinkel, um sich daselbst wieder zu sammeln. Und da ihm der Freigelassene Phaon sein in der Nähe der Stadt zwischen der Salarischen und Nomentanischen Straße, etwa vier Meilen von der Stadt gelegenes Landgut anbot, so warf er, in bloßen Füßen und nur mit der Tunika bekleidet, wie er war, einen alten verschossenen Mantel über, zog die Kapuze über den Kopf, bedeckte das Gesicht mit einem Schweißtuch und schwang sich auf ein Pferd, mit nur vier Begleitern, unter denen sich auch Sporus befand. Bald darauf, noch ganz entsetzt durch ein Erdbeben und einen vor seinen Augen niederfahrenden Blitzstrahl, hörte er von dem nahen Lager her das Geschrei der Soldaten, die jene Vorzeichen ihm zum Unheil und dem Galba zum Heil auslegten, dazu auch, wie von einer ihnen begegnenden Gruppe von Reisenden einer sagte: „Die da setzen dem Nero nach!", während ein anderer die Frage an die Reiter richtete: „Was gibt's in der Stadt Neues von Nero?" Da scheute sein Pferd vor dem Gestank eines auf der Landstraße liegenden Leichnams, das Schweißtuch fiel von seinem Gesicht, und er wurde von einem ausgedienten Prätorianer erkannt und begrüßt. Als man an einem Seitenpfad ankam, stieg er ab, ließ die Pferde laufen und gelangte durch Buschwerk und Dorngestrüpp auf einem durch ein Röhricht gehenden Fußpfad mit großer Mühe und nur, indem man durch untergebreitete Kleidungsstücke den Weg für seine nackten Füße gangbar machte, endlich zu der hinteren Mauerseite der Villa. Hier bat ihn Phaon, sich einstweilen in eine Sandgrube zu begeben, worauf er zur Antwort gab, er wolle nicht bei lebendigem Leib unter die Erde gehen! Nach einigem Verweilen, währenddessen man einen heimlichen Eingang in die Villa für ihn zu bereiten suchte, schöpfte er, um seinen Durst zu stillen, Wasser mit der Hand aus einer nahebei gelegenen Lache, indem er sprach: „Dies ist Neros Kühltrank!" Dann zog er, da sein Mantel von Dornen zerrissen war, die durch diesen gegangenen und steckengebliebenen Spitzen einzeln aus und gelangte so, auf allen vieren durch ein enges, ausgegrabenes Loch sich zwängend, in die nächste Zelle, wo er sich auf ein Lager warf, das mit einem ärmlichen Polster und statt der Decke mit einem alten Mantel versehen war; und da ihn nun Hunger und Durst ankamen, verschmähte er zwar das ihm gebotene schwarze Brot, trank dagegen des lauen Wassers eine ganze Menge. 49. Da jetzt seine Begleiter wiederholt in ihn drangen, sich der ihm drohenden schimpflichen Behandlung baldmöglichst zu entziehen, befahl er, vor seinen Augen ein Grab zu graben, wozu er selbst das Maß seines Leibes gab, und womöglich ein paar Stücke Marmor zusammenzustellen, desgleichen Wasser und Kleinholz herbeizuschaffen, um seinem Leichnam sofort die letzte Wohltat zu erweisen, und begleitete alle diese Anordnungen mit Tränengüssen, indem er dabei zu wiederholten Malen ausrief: „Welch ein Künstler stirbt in mir!" Während er so die Augenblicke hinzögerte, kam ein Kurier Phaons mit Briefschaften an. Er riss sie ihm aus der Hand und las, dass er vom Senat in die Acht erklärt sei und dass man ihn aufsuche, um an ihm die Strafe nach der Vorfahren Weise zu vollziehen. Er fragte, was das für eine Strafe sei. Und als er hörte, der Mensch werde dabei nackt mit dem Hals in eine Strafgabel geschlossen und der Leib mit Ruten zu Tode gehauen, ergriff er entsetzt zwei Dolche, die er mit herausgenommen hatte, prüfte die Spitze beider und - steckte sie dann wieder ein, indem er bemerkte, noch sei die Schicksalsstunde nicht gekommen. Dann forderte er mehrmals den Sporus auf, die Totenklage und das Wehegeschrei um ihn anzustimmen; dann bat er wieder, es möchte doch irgendeiner ihm zum Selbstmord durch sein Beispiel behilflich sein. Zuweilen schalt er auf sein feiges Zaudern mit den Worten: „Was ist dies für ein scheußliches und schmähliches Leben! Es ziemt einem Nero nicht, ziemt ihm nicht! In solcher Lage gilt's besonnen zu sein; auf, ermanne dich!" Siehe, da sprengten schon die Reiter heran, denen befohlen war, ihn lebendig zu fangen. Als er es bemerkte, rezitierte er in Todesangst den homerischen Vers: Donnernd schallt mir zu Ohren der Hufschlag eilender Rosse!309 und drückte sich den Stahl in die Kehle, wobei ihm Epaphroditus, sein Kabinettssekretär, die Hand führte. Halbentseelt vermochte er dem hereinstürzenden Centurio, der seinen Mantel auf die Wunde drückte, um ihn glauben zu machen, dass er ihm zu Hilfe gekommen sei, nur noch die Worte zu entgegnen: „Zu spät!" und „Das ist Treue!" Mit diesem Ruf hauchte er seine Seele aus, während ihm zum schaudernden Entsetzen der Umstehenden die Augen weitgeöffnet aus den Höhlen traten. Vor allem und am dringendsten hatte er von seinen Begleitern das Versprechen erbeten, dass sie niemand gestatten sollten, ihm den Kopf abzuschneiden, sondern dass sie ihn unter allen Umständen un-verstümmelt verbrennen möchten. Dies bewilligte Icelus, Galbas Freigelassener, der selbst eben erst aus dem Gefängnis befreit worden war, in das man ihn beim Beginn des Aufruhrs geworfen hatte. 50. Die Kosten seiner Bestattung betrugen zweihunderttausend Sesterze; man brauchte dabei die weißen goldgestickten Teppiche, deren er sich am 1. Januar bedient hatte. Seine Gebeine bestatteten Ecloge und Alexandria, seine Ammen, gemeinschaftlich mit Acte, seiner Konkubine, in dem Erbbegräbnis des Geschlechts der Domitier, das man vom Marsfeld aus hoch oben auf dem Gartenhügel gewahrt. In diesem Erbbegräbnis steht ein Sarkophag von Porphyrmarmor, darüber ein Altar von lunesischem Marmor, das Ganze eingefasst mit einer Balustrade von thasischem Stein. 51. Seine Gestellt war von fast mittlerer Mannesgröße, sein Körper mit Flecken bedeckt und übelriechend, das Haar hellblond, sein Gesicht mehr schöngebildet als anmutig, die Augen blau und sehr schwach, der Nacken übermäßig fett, der Bauch stark vortretend, die Schenkel über aus dünn, seine Gesundheit dauerhaft. Denn obwohl er der unmäßigste Schwelger war, ist er doch nur dreimal während voller vierzehn Jahre krank gewesen, und zwar ohne dass er dabei den Weingenuss oder seine übrige Lebensgewohnheit aufgegeben hätte In seiner Toilette und in seiner Haltung war er so schamlos, dass er nicht nur das Haar immer in stufenweise geordneten Locken frisiert trug, sondern es auf seiner achäischen Rundreise sogar auf die Schulter hinabwallen ließ und dass er sehr häufig im leichten Nachtkleid, ein Schweißtuch um den Mals geschlungen, ungegürtet und unbeschuht sich öffentlich zeigte.
ESCRITORES ÁRABES - GIBRAN KHALIL GIBRAN   
GIBRAN KHALIL GIBRAN (جبران خليل جبران بن ميکائيل بن سعد; em siríaco). (Grande parte dos dados aqui apresentados foram extraídos do blog de Michele Christine). Foi um pensador libanês. Nasceu na cidade dos cedros, Besharre (Bsharri), em 06 de dezembro de 1.883, nas montanhas ao norte do Líbano. A pequena aldeia de Besharre, no Líbano, é tida como guardiã dos cedros sagrados do Líbano e, segundo nos conta a história, foi de lá que o rei Salomão obteve a madeira para construir o Templo de Jerusalém. A aldeia também se situa nas proximidades das ruínas de Baalbeck, considerada uma das cidades mais antigas do mundo. Próxima a Besharre estende-se a cidade de Caná, onde Jesus realizou o milagre da transformação da água em vinho. Foi nesse ambiente histórico repleto de referências religiosas importantes que nasceu Gibran Khalil Gibran, no ano de 1883. Além de ser considerado um dos artistas mais importantes do Líbano, seu nome é respeitado em todo o mundo pela profundidade mística de sua obra, composta de vários livros e pinturas. Sua principal criação, o livro O Profeta, traduzido para mais de 30 idiomas e ainda hoje um dos maiores best-sellers em todo o planeta, teve grande influência na vida de milhões de pessoas, independentemente de seus credos religiosos e tendências espirituais. Era apaixonado pela natureza. Nascera muito próximo da floresta de cedros milenares. Conta-se que, aos oito anos, quando passava por sua aldeia um grande vendaval, o menino fascinado pela natureza em fúria, abre a porta e sai a correr com os ventos. Quando a mãe, apavorada, o alcança e repreende, ele lhe responde com todo o ardor de suas paixões nascentes: “Mas, mamãe, eu gosto das tempestades. Gosto delas. Gosto!” (Um de seus livros em árabe seria intitulado ‘Temporais’). 1894 – Emigra para os Estados Unidos, com a mãe, o irmão Pedro e as duas irmãs Mariana e Sultane. Vão morar em Boston. O pai permanece em Bicharre. 1898/1902 – Vota ao Líbano para completar seus estudos árabes. Matricula-se no Colégio da Sabedoria, em Beirute. Ao diretor, que procurava acalmar sua ambição impaciente, dizendo-lhe que uma escada deve ser galgada degrau por degrau, Gibran retrucou: “Mas as águias não usam escadas!” 1905/1920 – Gibran escreve quase que exclusivamente em árabe e publica sete livros nessa língua: A Música; As Ninfas do Vale; Espíritos Rebeldes; Asas Partidas; Uma Lágrima e um Sorriso; A Procissão; Temporais. Após sua morte, seria publicado um oitavo livro, sob o título de Curiosidades e Belezas, composto de artigos e histórias já aparecidas em outros livros e de algumas páginas inéditas. 1908/1910 – Em Paris. Estuda na Académie Julien. Trabalha freneticamente. Frequenta museus, exposições, bibliotecas. Conhece Auguste Rodin. Uma de suas telas é escolhida para a Exposição das Belas-Artes de 1910. Nesse ínterim, morrem seu pai e sua irmã Sultane. Ele volta a Boston e, no mesmo ano, muda-se para Nova York, onde permanecerá até o fim da vida. Mora só, num apartamento sóbrio que ele e seus amigos chamam As-Saumaa (O Eremitério). Mariana, sua irmã, permanece em Boston. Em Nova York, Gibran reúne em volta de si uma plêiade de escritores libaneses e sírios que, embora estabelecidos nos Estados Unidos, escrevem em árabe com idênticos anseios de renovação. O grupo forma uma academia literária que se intitula Ar-Rabita Al-Kalamia (A Liga Literária), e que muito contribuiu para o renascimento das letras árabes. Seus porta-vozes foram, sucessivamente, duas revistas árabes editadas em Nova York: Al-Funun (As Artes) e As-Saieh (O Errante). 1918/1931 – Gibran deixa, pouco a pouco, de escrever em árabe e dedica-se ao inglês, no qual produz também oito livros: O Louco; O Precursor; O Profeta; Areia e Espuma; Jesus, o Filho do Homem; Os Deuses da Terra. (Após sua morte seriam publicados mais dois: O Errante; O Jardim do Profeta.) Todos os livros em inglês de Gibran foram lançados por Alfred A. Knopf, dinâmico editor norte-americano com inclinação para descobrir e lançar novos talentos. Ao mesmo tempo em que escreve, Gibran se dedica a desenhar e pintar. Sua arte, inspirada pelo mesmo idealismo que lhe inspirou os livros, distingue-se pela beleza e a pureza das formas. Todos os seus livros em inglês foram por ele ilustrados com desenhos evocativos e místicos, de interpretação às vezes difícil, mas de profunda inspiração. Seus quadros foram expostos várias vezes com êxito em Boston e Nova York. Seus desenhos de personalidades históricas são também célebres. Em sua relativamente curta, porém prolífica existência (viveu apenas 48 anos), Khalil Gibran produziu obra literária acentuada e artisticamente marcada pelo misticismo oriental, que — por essa razão — alcançou popularidade em todo o mundo. Sua obra, acentuadamente romântica e influenciada por fontes de aparente contraste como a Bíblia, Nietzsche e William Blake, trata de temas como o amor, a amizade, a morte e a natureza, entre outros. Estudou Letras e Filosofia. Gibran Khalil Gibran faleceu em 10 de abril de 1931 em Nova Iorque. Obras: GIBRAN, Khalil. O Profeta. São Paulo: Editora Nova Alexandria, 1997. GIBRAN, Khalil. Lázaro e sua amada. Rio de Janeiro: Editora Record, 1973. Além dessas, escreveu: Asas Partidas As Ninfas do Vale Espíritos Rebeldes Uma Lágrima e um Sorriso A Procissão Temporais O Precursor Areia e Espuma O Errante Pequena antologia: Dos Filhos (de O Profeta) E uma mulher que carregava o filho nos braços disse: “Fala-nos dos filhos.” E ele disse: Vossos filhos não são vossos filhos. São filhos e filhas da ânsia da vida por si mesma. Vêm através de vós, mas não de vós. E, embora vivam convosco, a vós não pertencem. Podeis outorgar-lhes vosso amor, mas não vossos pensamentos, Pois eles têm seus próprios pensamentos. Podeis abrigar seus corpos, mas não suas almas; Pois suas almas moram na mansão do amanhã, que vós não podeis visitar nem mesmo em sonho. Podeis esforçar-vos por ser como eles, mas não procureis fazê-los como vós, Porque a vida não anda para trás e não se demora com os dias passados. Vós sois o arco dos quais vossos filhos, quais setas vivas, são arremessados. O Arqueiro mira o alvo na senda do infinito e vos estica com Sua força para que suas flechas se projetem, rápidas e para longe. Que vosso encurvamento na mão do Arqueiro seja vossa alegria: Pois assim como Ele ama a flecha que voa, ama também o arco, que permanece estável. Da Dádiva (de O Profeta) Então um homem opulento disse: “Fala-nos da dádiva.” E ele respondeu: “Vós pouco dais quando dais de vossas posses. É quando dais de vós próprios que realmente dais. Pois, o que são vossas posses senão coisas que guardais por medo de precisardes delas amanhã? E amanhã, que trará o amanhã ao cão ultraprudente que enterra ossos na areia movediça enquanto segue os peregrinos para a cidade santa? E o que é o medo da necessidade senão a própria necessidade? Não é vosso medo da sede, quando vosso poço está cheio, a sede insaciável? Há os que dão pouco do muito que possuem, e fazem-no para serem elogiados, e seu desejo secreto desvaloriza suas dádivas. E há os que têm pouco e dão-no integralmente. Esses confiam na vida e na generosidade da vida, e seus cofres nunca se esvaziam. E há os que dão com alegria, e essa alegria é já a sua recompensa. E há os que dão com pena, e essa pena é o seu batismo. E há os que dão sem sentir pena nem buscar alegria nem pensar na virtude: Dão como, no vale, o mirto espalha sua fragrância no espaço. elas mãos de tais pessoas, Deus fala; e através de seus olhos Ele sorri para o mundo. É belo dar quando solicitado; é mais belo, porém, dar sem ser solicitado, por haver apenas compreendido; E para os generosos, procurar quem recebe é uma alegria maior ainda que a de dar. E existe alguma coisa que possais guardar? Tudo o que possuís será um dia dado. Dai agora, portanto, para que a época da dádiva seja vossa e não de vossos herdeiros. Dizeis muitas vezes: “Eu daria, mas somente a quem merece”. As árvores de vossos pomares não falam assim, nem os rebanhos de vossos pastos. Dão para continuar a viver, pois reter é perecer. Certamente, quem é digno de receber seus dias e suas noites é digno de receber de vós tudo o mais. E quem mereceu beber do oceano da vida, merece encher sua taça em vosso pequeno córrego. E que mérito maior haverá do que aquele que reside na coragem e na confiança, mais ainda, na caridade de receber? E quem sois vós para que os homens devam expor o seu íntimo e desnudar seu orgulho a fim de que possais ver seu mérito despido e seu amor-próprio rebaixado? Procurai ver, primeiro, se mereceis ser doadores e instrumentos do dom. Pois, na verdade, é a vida que dá à vida, enquanto vós, que vos julgais doadores, são meras testemunhas. E vós que recebeis – e vós todos recebeis – não assumais encargo de gratidão a fim de não pordes um jugo sobre vós e vossos benfeitores. Antes, erguei-vos, junto com eles, sobre asas feitas de suas dádivas; Pois se ficardes demasiadamente preocupados com vossas dívidas, estareis duvidando da generosidade daquele que tem a terra liberal por mãe e Deus por pai.” El Amor (de O Profeta) "Al-Mithra disse-lhe então: Fala-nos do amor. E ele virou a cabeça e fitou o povo e sobre todos se abateu um grande silêncio. E, com voz grave, disse... Quando o amor vos chamar, segui-o, mesmo que os seus caminhos sejam íngremes e penosos. E quando as suas asas vos envolverem, entregai-vos a ele, ainda que a espada dissimulada nas suas penas vos possa ferir. E quando ele vos falar, crede nele, embora a sua voz possa estilhaçar os vossos sonhos como o vento do norte devasta o jardim. Pois assim como o amor vos coroa, também vos crucifica. E, tal como serve para o vosso crescimento, também serve para a vossa decadência. E como ele se ergue até às vossas copas e acaricia os vossos mais tenros ramos que esvoaçam ao sol, também às vossas raízes ele desce e as sacudirá no seu apego à terra. Quais feixes de trigo, ele vos reúne em si. Vos amassa para vos pôr a nu. Vos ciranda para vos libertar do vosso farelo. Vos mói até à alvura. Vos amassa até vos tornardes macios. E, depois, vos entrega ao seu fogo sagrado, para vos tornardes pão sagrado para o festim sagrado de Deus. O amor fará todas essas coisas de vós, para que possais conhecer os segredos do vosso coração e vos tornardes, através desse mesmo conhecimento, um fragmento do coração da vida. Mas se, no vosso temor, procurardes no amor apenas paz e prazer, faríeis melhor se ocultásseis a vossa nudez e saísseis do amor, para o mundo sem razão, onde rireis, mas não com todo o vosso riso, e chorareis, mas não com todas as vossas lágrimas. O amor dá-se apenas a si mesmo e nada recebe se não de si próprio. O amor não possui nem quer ser possuído. Porque o amor se basta do amor. Quando amardes, não deveis dizer que está no meu coração, mas antes, no coração de Deus. E não penseis que sois vós quem orienta o rumo do amor, pois, se vos achar dignos, será o amor que conduzirá o vosso caminho. O amor não tem outro desejo que não realizar-se a si mesmo. Mas se amardes e sentirdes desejos, que sejam estes os vossos desejos: Dissolver-se e ser-se como um regato que desliza e canta à noite a sua melodia. De tanta ternura conhecer a dor, ser ferido pela vossa própria concepção do amor e sangrar de boa vontade e com júbilo. Acordar para o amor com um coração alado e dar graças por um outro dia de amor; e fazer uma pausa à hora do meio dia e meditar sobre o êxtase do amor; regressar à noite ao lar com gratidão; e adormecer com uma oração no coração pelo amado, e nos lábios um hino de louvor.
IN ENGLISH: Children And a woman who held a babe against her bosom said, 'Speak to us of Children.' And he said: Your children are not your children. They are the sons and daughters of Life's longing for itself. They come through you but not from you, And though they are with you, yet they belong not to you. You may give them your love but not your thoughts. For they have their own thoughts. You may house their bodies but not their souls, For their souls dwell in the house of tomorrow, which you cannot visit, not even in your dreams. You may strive to be like them, but seek not to make them like you. For life goes not backward nor tarries with yesterday. You are the bows from which your children as living arrows are sent forth. The archer sees the mark upon the path of the infinite, and He bends you with His might that His arrows may go swift and far. Let your bending in the archer's hand be for gladness; For even as he loves the arrow that flies, so He loves also the bow that is stable. God In the ancient days, when the first quiver of speech came to my lips, I ascended the holy mountain and spoke unto God, saying, 'Master, I am thy slave. Thy hidden will is my law and I shall obey thee for ever more.' But God made no answer, and like a mighty tempest passed away. And after a thousand years I ascended the holy mountain and again spoke unto God, saying, 'Creator, I am thy creation. Out of clay hast thou fashioned me and to thee I owe mine all.' And God made no answer, but like a thousand swift wings passed away. And after a thousand years I climbed the holy mountain and spoke unto God again, saying, 'Father, I am thy son. In pity and love thou hast given me birth, and through love and worship I shall inherit thy kingdom.' And God made no answer, and like the mist that veils the distant hills he passed away. And after a thousand years I climbed the sacred mountain and again spoke unto God, saying, 'My God, my aim and my fulfilment; I am thy yesterday and thou art my tomorrow. I am thy root in the earth and thou art my flower in the sky, and together we grow before the face of the sun.' Then God leaned over me, and in my ears whispered words of sweetness, and even as the sea that enfoldeth a brook that runneth down to her, he enfolded me. And when I descended to the valleys and the plains, God was there also.
  
EN FRANÇAIS: Et une femme qui portait un enfant dans les bras dit, Parlez-nous des Enfants. Et il dit : Vos enfants ne sont pas vos enfants. Ils sont les fils et les filles de l'appel de la Vie à elle-même, Ils viennent à travers vous mais non de vous. Et bien qu'ils soient avec vous, ils ne vous appartiennent pas. Vous pouvez leur donner votre amour mais non point vos pensées, Car ils ont leurs propres pensées. Vous pouvez accueillir leurs corps mais pas leurs âmes, Car leurs âmes habitent la maison de demain, que vous ne pouvez visiter, pas même dans vos rêves. Vous pouvez vous efforcer d'être comme eux, mais ne tentez pas de les faire comme vous. Car la vie ne va pas en arrière, ni ne s'attarde avec hier. Vous êtes les arcs par qui vos enfants, comme des flèches vivantes, sont projetés. L'Archer voit le but sur le chemin de l'infini, et Il vous tend de Sa puissance pour que Ses flèches puissent voler vite et loin. Que votre tension par la main de l'Archer soit pour la joie; Car de même qu'Il aime la flèche qui vole, Il aime l'arc qui est stable. Parle-nous de la Douleur ? Il répondit : Votre douleur est cette fissure de la coquille qui renferme votre entendement. Et comme le noyau du fruit doit se briser afin que le cœur puisse se tenir au soleil, ainsi vous devez connaître la douleur. Si votre cœur pouvait continuer de s’émerveiller des miracles quotidiens de votre vie, votre douleur vous semblerait aussi merveilleuse que votre joie ; Et vous accepteriez les saisons de votre cœur, comme vous avez toujours accepté les saisons qui traversent vos champs. Et vous observeriez avec sérénité les hivers de vos chagrins. Une grande part de votre douleur est choisie par vous-mêmes. C’est la potion amère avec laquelle le médecin en vous guérit votre Moi malade. Ayez confiance en ce médecin et buvez donc sa potion en paix et en silence. Car sa main, bien que rude et pesante, est guidée par la tendre main de l’Invisible. Et la coupe qu’il vous tend, bien qu’elle vous brûle les lèvres, a été faite de cette argile que le Potier a mouillée de Ses larmes sacrées.
 
EN ESPANHOL: 
 TUS HIJOS Tus hijos no son tus hijos, son hijos e hijas de la vida deseosa de sí misma. No vienen de ti, sino a través de ti, y aunque estén contigo, no te pertenecen. Puedes darles tu amor, pero no tus pensamientos, pues, ellos tienen sus propios pensamientos. Puedes abrigar sus cuerpos, pero no sus almas, porque ellas viven en la casa de mañana, que no puedes visitar, ni siquiera en sueños. Puedes esforzarte en ser como ellos, pero no procures hacerlos semejantes a ti porque la vida no retrocede ni se detiene en el ayer. Tú eres el arco del cual tus hijos, como flechas vivas son lanzados. Deja que la inclinación, en tu mano de arquero sea para la FELICIDAD. Cuando el amor os llame Cuando el amor os llame, seguidle, aunque sus caminos sean duros y escarpados. Y cuando sus alas os envuelvan, ceded a él, aunque la espada oculta en su plumaje pueda heridlos. Y cuando os hable, creed en él, aunque su voz pueda desbaratar vuestros sueños como el viento del norte asola vuestros jardines. Porque así como el amor os corona, debe crucificaros. Así como os agranda, también os poda. Así como se eleva hasta vuestras copas y acaricia vuestras más frágiles ramas que tiemblan al sol, también penetrará hasta vuestras raíces y las sacudirá de su arraigo a la tierra. Como gavillas de trigo, se os lleva. Os apalea para desnudaros. Os trilla para libraros de vuestra paja. Os muele hasta dejaros blancos. Os amasa hasta que seáis ágiles, y luego os entrega a su fuego sagrado, y os transforma en pan sagrado para el festín de Dios. Todas estas cosas hará el amor por vosotros para que podáis conocer los secretos de vuestro corazón, y con este conocimiento os convirtáis en un fragmento del corazón de la Vida. Pero si en vuestro temor sólo buscáis la paz del amor y el placer del amor, Entonces más vale que cubráis vuestra desnudez y salgáis de la era del amor, Para que entréis en el mundo sin estaciones, donde reiréis, pero no todas vuestras risas, y lloraréis, pero no todas vuestras lágrimas. El amor sólo da de sí y nada recibe sino de sí mismo. El amor no posee, y no quiere ser poseído. Porque al amor le basta con el amor. Cuando améis no debéis decir "Dios está en mi corazón", sino más bien "estoy en el corazón de Dios". Y no penséis que podéis dirigir el curso del amor, porque el amor, si os halla dignos, dirigirá él vuestros corazones. El amor no tiene más deseo que el de alcanzar su plenitud. Pero si amáis y habéis de tener deseos, que sean estos: De diluiros en el amor y ser como un arroyo que canta su melodía a la noche. De conocer el dolor de sentir demasiada ternura. De ser herido por la comprensión que se tiene del amor. De sangrar de buena gana y alegremente. De despertarse al alba con un corazón alado y dar gracias por otra jornada de amor; De descansar al mediodía y meditar sobre el éxtasis del amor; De volver a casa al crepúsculo con gratitud, Y luego dormirse con una plegaria en el corazón para el bien amado, y con un canto de alabanza en los labios.
  
VERSIONE ITALIANA: GIBRAN I Figli E una donna che reggeva un bambino al seno disse: Parlaci dei Figli. E lui disse: I vostri figli non sono figli vostri. Sono figli e figlie della sete che la vita ha di sé stessa. Essi vengono attraverso di voi, ma non da voi, E benché vivano con voi non vi appartengono. Potete donare loro amore ma non i vostri pensieri: Essi hanno i loro pensieri. Potete offrire rifugio ai loro corpi ma non alle loro anime: Esse abitano la casa del domani, che non vi sarà concesso visitare neppure in sogno. Potete tentare di essere simili a loro, ma non farvi simili a voi: La vita procede e non s'attarda sul passato. Voi site gli archi da cui i figli, come frecce vive, sono scoccate in avanti. L'Arciere vede il bersaglio sul sentiero dell'infinito, e vi tende con forza affinché le sue frecce vadano rapide e lontane. Affidatevi con gioia alla mano dellì'Arciere; Poiché come ama il volo della freccia così ama la fermezza dell'arco. Il Dolore E una donna gli chiese: Parlaci del Dolore. Ed egli disse: Il vostro dolore è il rompersi del guscio che racchiude il vostro intendimento. Come il nocciolo del frutto deve rompersi perché il suo seme possa ricevere il sole, così dovete conoscere il dolore. Se poteste mantenere in cuore tutta la meraviglia per il prodigio quotidiano della vita, anche il dolore non vi sembrerebbe meno stupefacente che la gioia; E accogliereste le stagioni del cuore come avete sempre accolto le stagioni che passano sui vostri campi. E vegliereste sereni nell'inverno della vostra sofferenza. Molte pene le avete scelte voi. È la pozione amara con cui il medico in voi cura il vostro io malato. Fidatevi del medico e bevete il rimedio tranquilli e in silenzio; Perché la sua mano, anche se rude e pesante, è guidata dalla mano premurosa dell'Invisibile. E la tazza che vi porge, anche se brucia le labbra, è stata modellata con l'argilla che il Vasaio ha bagnato con le Sue lacrime sante.
  
Sprüche und Gedichte von Khalil Gibran Kinder Und eine Frau, die ihr Kind ans Herz drückte, sagte: "Sprich zu uns über Kinder". Und er sprach: Eure Kinder sind nicht eure Kinder. Sie sind die Söhne und Töchter der Sehnsucht des Lebens nach sich selbst. Sie kommen durch euch, aber nicht von euch, und wenn sie auch bei euch sind, gehören sie euch dennoch nicht. Ihr dürft ihnen eure Liebe schenken, nicht aber eure Gedanken. Denn sie haben ihr eigenes Denken. Ihr dürft ihren Leib bei euch aufnehmen, nicht aber ihre Seele, denn ihre Seelen wohnen im Morgen, das ihr nicht aufsuchen könnt, nicht einmal in euren Träumen. Ihr dürft danach streben, ihnen gleich zu sein, aber bemüht euch nicht, sie euch nachzubilden. Denn das Leben schreitet nicht rückwärts, es verweilt auch nicht im Gestern. Ihr seid die Bogen, von denen eure Kinder als lebende Pfeile hinaus fliegen. Der Schütze weiß das Ziel auf dem Pfad der Unendlichkeit, und Er spannt Dich mit Seiner Macht, auf dass Seine Pfeile weit hinaus schnellen. Lass' Dich zur Freude von der Hand des Schützen spannen; denn so, wie er den schnellenden Pfeil liebt, so liebt er auch den starken Bogen. Liebe Daraufhin sagte Almitra: " Sprich zu uns über die Liebe." Und er erhob sein Haupt und schaute auf das Volk, und eine Stille kam über sie. Und mit mächtiger Stimme sprach er: Wenn euch die Liebe ein Zeichen gibt, dann folgt ihr, mögen ihre Pfade auch beschwerlich sein und steil. Und wenn sie euch mit ihren Schwingen umarmt, dann gebt euch ihr hin, auch wenn euch das Schwert verletzt, das sie darunter verbirgt. Und wenn sie zu euch spricht, dann glaubt an sie, mag ihre Stimme auch eure Träume zunichte machen, gerade so, wie der Nordwind den Garten zuschanden macht. Denn so, wie die Liebe euch krönt, wird sie euch ans Kreuz schlagen. So, wie sie euch wachsen lässt, wird sie euch zurückschneiden. Und so, wie sie sich zum höchsten Wipfel erhebt und eure zerbrechlichsten Zweige liebkost, die in der Sonne zittern, so wird sie hinabsteigen zu euren Wurzeln, die sich in der Erde festklammern, und an ihnen rütteln. Wie Ähren bündelt sie euch um sich. Sie drischt euch, um euch zu entblößen. Sie siebt euch, um euch von euren Hülsen zu befreien. Sie mahlt euch, bis ihr weiß seid wie Mehl. Sie knetet euch, bis ihr geschmeidig werdet; und dann übereignet sie euch ihrem heiligen Feuer, auf dass ihr heiliges Brot werdet für Gottes heiliges Mahl. All dies wird die Liebe mit euch anstellen, damit ihr die Geheimnisse eures Herzens erfahrt und in dieser Erkenntnis ein Teil vom Herzinnersten des Lebens werdet. Falls ihr aber in eurer Furcht nur Ruhe und Lust in der Liebe sucht, dann ist es besser für Euch, eure Blöße zu bedecken und vom Dreschboden der Liebe zu gehen in eine Welt ohne Sommer und Winter, wo ihr lachen werdet, jedoch nicht eures ganzes Lachen, und weinen, aber nicht all eure Tränen. Liebe gibt nichts, als sich selbst und nimmt nichts, es sei denn von sich selbst. Liebe nimmt nicht in Besitz, noch lässt sie sich besitzen; denn Liebe genügt sich selbst. Wenn ihr liebt, solltet ihr nicht sagen: "Gott ist in meinem Herzen" sondern eher "Ich bin in Gottes Herz". Und denkt nicht, ihr könnt den Lauf der Liebe lenken. Denn sie wird euren Lauf lenken, wenn sie euch für würdig hält. Liebe hat hat kein anderes Verlangen als sich selbst zu erfüllen. Wenn ihr liebt und dabei Begierden habt, dann lasst dies euer Verlangen sein: Werdet weich und seid wie ein rieselnder Bach, der sein Lied der Nacht singt. Wisst vom Schmerz allzu großer Zärtlichkeit. Seid verwundet vom eigenen Verständnis der Liebe; und blutet willig und freudig. Erwacht des Morgens im Herzen beflügelt und sagt Dank für einen neuen Tag des Liebens; Ruht zur Mittagsstunde und sinnt nach über die Wonnen der Liebe; Kehrt heim am Abend mit dankbarem Herzen; dann geht zur Ruh mit einem Gebet für den Liebsten im Herzen und einem Loblied auf den Lippen. 
 
РУССКОЙ ПОЭЗИИ - POESIA RUSSA - VLADIMIR VLADIMIROVITCH MAYAKOVSKY Vladimir Vladimirovitch Mayakovsky
  
O AMOR 
Um dia, quem sabe, 
Ela que também gostava de bichos, apareça numa alameda do zoo, sorridente, tal como agora está no retrato sobre a mesa. 
Ela é tão bela, que por certo, hão de ressuscitá-la. 
Vosso Trigésimo século ultrapassará o exame de mil nadas, que dilaceravam o coração. 
Então, de todo amor não terminado seremos pagos em enumeráveis noites de estrelas. 
Ressuscita-me, nem que seja porque te esperava como um poeta, repelindo o absurdo cotidiano! Ressuscita-me, nem que seja só por isso! 
Ressuscita-me! 
Quero viver até o fim que me cabe! 
Para que o amor não seja mais escravos de casamentos, concupiscência, salários. 
Para que, maldizendo os leitos, saltando dos coxins, o amor se vá pelo universo inteiro. 
Para que o dia, que o sofrimento degrada, não vos seja chorado, mendigado. 
E que ao primeiro apelo: - Camaradas! 
Atenta se volte a terra inteira. Para viver livre dos nichos das casas.  
Para que doravante a família seja o pai, pelo menos o universo; a mãe, pelo menos a terra. 
Vladimir Maiakovski Origem: Wikipédia
Fragmento de Eduardo Alves da Costa: No caminho com Maiakóvski "[...] Na primeira noite eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim. E não dizemos nada. Na segunda noite, já não se escondem; pisam as flores, matam nosso cão, e não dizemos nada. Até que um dia, o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz, e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E já não podemos dizer nada. [...]" Vladimir Mayakovsky - 1893-1930
Vladimir Vladimirovitch Mayakovsky nasceu e passou a infância na aldeia de Baghdati, nos arredores de Kutaíssi, na Geórgia,Rússia. Lá cursou o ginásio e, após a morte súbita do pai, a família ficou na miséria e transferiu-se para Moscou,  onde Vladimir continuou seus estudos. Fortemente impressionado pelo movimento revolucionário russo e impregnado;desde cedo de obras socialistas, ingressou aos quinze anos na facção bolchevique o Partido Social-Democrático Operário Russo.Detido em duas ocasiões, foi solto por falta de provas,mas em 1909-1910 passou onze meses na prisão.Entrou na Escola de Belas Artes, onde se encontrou com David Burliuk,que foi o grande incentivador de sua iniciação poética.Os dois amigos fizeram parte do grupo fundador do assim chamado cubo-futurismo russo, ao lado de Khlebnikov, Kamiênski e outros. Foram expulsos da Escola de Belas Artes. Procurando difundir suas concepções artísticas, realizaram viagens pela Rússia. Após a Revolução de Outubro, todo o grupo manifestou sua adesão ao novo regime. Durante a Guerra Civil, Mayakovsky se dedicou a desenhos e legendas para cartazes de propaganda e, no início da consolidação do novo Estado, exaltou campanhas sanitárias, fez publicidade de produtos diversos, etc. Fundou em 1923 a revista LEF (de Liévi Front, Frente de Esquerda), que reuniu a “esquerda das artes”, isto é, os escritores e artistas que pretendiam aliar a forma revolucionária a um conteúdo de renovação social. Fez inúmeras viagens pelo país, aparecendo diante de vastos auditórios para os quais lia os seus versos. Viajou também pela Europa Ocidental, México e Estados Unidos. Entrou frequentemente em choque com os "burocratas" e com os que pretendiam reduzir a poesia a fórmulas simplistas. Foi homem de grandes paixões, arrebatado e lírico, épico e satírico ao mesmo tempo. Era fanático pela equipe de futebol Spartak Moscou.Oficialmente, suicidou-se com um tiro em 1930, sem que isto tivesse relação alguma com sua atividade literária e social. Tal fato tem sido questionado, pois na época o poeta estaria sendo pressionado pelos programas oficiais que desejavam instaurar uma literatura simplista e dita realista, dirigidos por Molotov que teria perseguido antigos poetas revolucionários como Mayakovsky. Em vista disso, aponta-se a possibilidade real. Sua obra, profundamente revolucionária na forma e nas idéias que defendeu, apresenta-se coerente, original, veemente, una. A linguagem que emprega é a do dia a dia, sem nenhuma consideração pela divisão em temas e vocábulos “poéticos” e “não-poéticos”, a par de uma constante elaboração, que vai desde a invenção vocabular até o inusitado arrojo das rimas. Fazendo parte do grupo "Hylaea", que daria origem ao chamado cubo-futurismo, seu primeiro livro de poemas, no entanto, seria de estética influenciada pelo simbolismo, e nunca chegaria a público, tendo sido escrito quando o poeta estava na prisão e apreendido pela polícia no momento da sua libertação. Aproximando-se de David Burliuk na década de 1910, passa a escrever em um estilo aproximado do Cubismo e do Futurismo, influenciado pelo primitivismo eslavista e pela linguagem transacional de Velimir Khlebnikov e outros, repleto de imagística urbana e surpreendente, com um certo ar impressionista e, ainda, simbolista. Esta fase de sua poesia é a mais apreciada por poetas como Boris Pasternak, em função de ainda manter alguns recursos simbolistas e métrica rigorosa em alguns poemas. Em seguida, já na década de 1920, sua poesia, apesar de haver uma continuidade no que diz respeito à inovação rítmica, à rimas inusitadas, ao uso da fala cotidiana e mesmo de imagens inusitadas, assume um tom direto. Ao mesmo tempo, o gosto pelo desmesurado, o hiperbólico, alia-se em sua poesia desta época à dimensão crítico-satírica. Criou longos poemas e quadras e dísticos que se gravam na memória. Traduções sem preocupação com a forma dos poemas produzidos nesta época têm dado ao público uma imagem errônea do poeta, fazendo-o parecer um "gritador". Na realidade, era um poeta rigoroso, que chegava a reescrever sessenta vezes o mesmo verso e recolhia muito material informativo e linguístico para posterior uso nos seus poemas. Criou também ensaios sobre a arte poética e artigos curtos de jornal; peças de forte sentido social e rápidas cenas sobre assuntos do dia; roteiros de cinema arrojados e fantasiosos e breves filmes de propaganda. Tem exercido influência profunda em todo o desenvolvimento da poesia russa moderna, bem como sobre outros poetas e movimentos no mundo inteiro. (Fonte - wikipédia).
 
AS ARTES E O PACTO DEMONÍACO 
 
Jean-Paul Laurens - MARGS Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara Doch nur vor einem ist mir bang: Die Zeit ist kurz, die Kunst is lang [Só de um temor vos darei parte; É curto o tempo, é longa a arte] Johann Wolfgang von Goethe Mefistófeles, em Fausto I O pacto demoníaco habita o imaginário de muitas comunidades e civilizações e originou umas tantas obras artísticas e tantíssimas obras literárias. O ser maligno ou divindade do mal é conhecido no cristianismo como diabo ou demônio. Também há uma personagem bíblica do anjo decaído conhecido par Lúcifer, o anjo que se teria revoltado contra o Senhor, querendo igualar-se a ele. Sendo o mais luminoso anjo do céu, teria sido condenado a ser o anjo das trevas. Atribui-se a influentes personagens da história e da literatura pactos com o demônio. Em troca de algum favor especial, teriam negociado a própria alma com as divindades infernais. Uma dessas personificações da entidade do mal, na Idade Média, é Mefistófeles. Estava à procura de espíritos incautos, espreitando-os e tentando-os para capturar-lhes as almas em troca de favores momentâneos. Na literatura, ele aparece em obras de importantes autores como Goethe, Marlowe e Wilde. Talvez a personagem mais importante nessa área seja a pessoa do Dr. Fausto. Trata-se de uma lenda germânica, baseada na pessoa de um médico, mago e alquimista conhecido como Dr. Johannes Georg Faust, que teria vivida entre 1480 e 1540. Teria ele nascido em Knittlingen, onde se encontra hoje o Faust-Museum. Trata-se de uma pequena cidade, com população de pouco mais de sete mil habitantes, situada ao sul da Alemanha, no estado de Baden-Württemberg. Na Cracóvia, teria estudado magia, em seu tempo uma cadeira acadêmica regular. Segundo Ricardo Sérgio e o site www.ricardosergio.net", esta seria a história de Faustus: Magister Georgius Sabelius Faustus, como ele mesmo se apresentava, viveu na Alemanha entre o final do século XV e começo do século XVI. Dr. Fausto era um estudioso das Ciências Ocultas, assumia publicamente a sua condição de feiticeiro. Ganhava o seu sustento praticando magia, fazendo horóscopos, vidências e produzindo fenômenos "sobrenaturais". De modo que, é possível que ele tenha realmente tentado alguma comunicação com o demônio, a fim de obter mais conhecimento sobre as Ciências Ocultas. Na época, era crença popular de que os estudiosos dessa ciência, eram quase sempre signatários de pactos com o diabo. Portanto, se vivo já suspeitavam dele, quando morreu, de maneira violenta e causa misteriosa, virou lenda. E a lenda do Dr. Fausto e seu pacto com o demônio, espalhou-se rapidamente pela Alemanha. Em 1857, Johann Spiess, livreiro e escritor de Frankfurt, compilou tudo quanto se acreditava e dizia acerca do Dr. Fausto, em um livro de 227 páginas, conhecido por Romance Faustiano ou Faustbuch (O Livro de Fausto); cujo enredo contava como Fausto se vendeu ao diabo, as extraordinárias aventuras que viveu, a magia que praticava, e por fim a sua morte e castigo. Surgia a primeira narrativa literária sobre a lenda do Dr. Fausto. Pesquisadores afirmam que o texto tem um fundo moralista, ou seja, propaganda luterana para doutrinação. Em 1589, dois anos depois da publicação de Spiess, o escritor e dramaturgo inglês (precursor de Shakespeare) Christopher Marlowe (1564-1593) transforma a primeira versão literária em peça teatral, com o título de A História Trágica do Doutor Fausto, que estreou com grande sucesso em 1594. A peça só foi publicada em 1604 (onze anos após a morte de Marlowe). Christopher Marlowe deu lustro estético à obra. Resgatou a dignidade do personagem distinguindo-o do personagem histórico e das lendas populares a que este deu origem; mas conservou a punição de Fausto, que na cena final desce ao inferno, porém em um clima muito mais trágico, de grande impacto junto ao público da época. Coube a outro alemão, Wolfgang Von Goethe, em 1808, três séculos depois da morte do misterioso ocultista, salvar o atormentado sábio, com a versão intitulada Fausto. Drama em verso que levou trinta anos para ser elaborado. Foi a obra de sua vida. Goethe, em sua versão, não mantém a cena final tradicional; troca o trágico pelo de dramático: Fausto em vez de ser punido no inferno é resgatado, na última hora, por anjos que enganam Mefistófeles e levam a alma do sábio para o céu. Em 1943, Thomas Mann publica sua versão com o título de Doutor Fausto. É uma versão fora das raízes do mito. O personagem Fausto encarna um músico. O pacto dispensa os demônios, e o inferno vem na forma da sífilis que mata o protagonista. O poeta português Fernando Pessoa deixou inconclusa a sua versão do mito, cujo título era Primeiro Fausto, à qual se dedicou durante boa parte da vida. Segundo o próprio poeta, a obra fala do embate entre a inteligência – representada por Fausto – e a vida. Na música, o mito de Fausto foi tema de obras de Wagner, Schumann, Liszt, Berlioz e Gounod. ®Sérgio. Outra obra literária que se sustenta na mesma temática de um pacto diabólico é o romance de Oscar Wilde, O Retrato de Dorian Grey. Publicado pela primeira vez em 1891, depois de ser publicado em capítulos de folhetim na revista Lippincott’s em 1890, causou controvérsia no público leitor. Trata da vida de Dorian, jovem simpático elegante, cuja beleza fascinou o tanto pintor Basil Hallward que decidiu representá-lo em uma pintura. Lord Henry Wotton amigo do pintor, corrompe o jovem, apresentando-lhe a vida londrina fútil Dorian faz um pacto com o demo para ficar eternamente jovem enquanto o retrato pintado por Basil vai envelhecendo constantemente, enquanto o jovem aproveita a vida desregradamente, chegando mesmo ao crime. Além dessas obras abordando o pacto diabólico há um poema do Famoso poeta russo Alexander Pushkin, escrito em 1826, intitulado Faust, em que se destaca um notável diálogo entre Fausto e Mefistófeles. Também o dramaturgo Christian Dietrich Grabbe compôs, em 1836, sob o espírito do Sturm und Drang, uma tragédia intitulada Don Juan und Faust. No século XX, o poeta francês Paul Valéry escreveu a uma peça de teatro que deixou inconclusa, intitulada Mon Faust. Mesmo Riobaldo, em Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa, é acusado pelos seus opositores de enriquecer através de um pacto diabólico.
 
 BRITISH LITERATURE - LITERATURA BRITÂNICA - CHRISTOPHER MARLOWE – 
autor do Fausto Britânico
  
Christopher Marlowe (1564 -1593) foi um grande dramaturgo, poeta inglês do século XVI. Sua vida particular é marcada de incidentes graves. Nasceu em Canterbury, em português Cantuária, cidade do norte da Inglaterra, pertencente ao condado de Kent. É a sede espiritual da Igreja Anglicana. Era filho de um sapateiro e bacharelou-se, primeiramente em artes. A universidade de Cambridge negou-lhe o título de licenciatura sob a acusação de ter-se convertido ao catolicismo e também por sucessivas ausências às aulas. Passa, então, segundo se afirma, a fazer parte do serviço secreto da rainha, função nunca confirmada, como é óbvio. A relevância dos trabalhos prestados ter-lhe-ia garantido o título da licenciatura. Com o título, passa a residir em Londres, onde vive até o fim de sua breve existência. Na capital, passa integra a companhia de teatro do conde de Nottigham, na qual apresentou a maior parte de suas obras. Teria feito parte da Escola da Noite, grupo de livres pensadores, dos quais faziam parte, entre outros, os matemáticos Thomas Harriot, Thomas Allen e Robert Hues, os filósofos e alquimistas Walter Warner e Walter Raleigh, além do conde de Northumberland que liderava o grupo. Porém, o que parece confirmar sua participação no serviço secreto é seu relacionamento com Sir Francis Walsingham, chefe da espionagem da rainha Elisabeth I. Nessa função, ter-se-ia envolvido em pelo menos um assassinato, em consequência do qual permaneceu por um curto período na prisão. Foi assassinado em circunstâncias nunca suficientemente esclarecidas. MALALOWE DRAMATURGO Sua controvertida história pessoal não diminui a importância de sua obra literária, de modo especial sua produção na área da dramaturgia. Até então, o teatro inglês era muito pobre. O que de mais importante havia eram traduções. Ele cria o teatro novo, introduz o verso livre e vai ser o modelo para Shakespeare. OBRAS Teatro Tamburlaine A História Trágica do Dr. Faustus The Jew of Malta Edward II The Massacre at Paris Dido, Queen of Carthage Poemas Hero and Leander Tradução Elegias (de Ovídio) Farsália (de Lucano) A grande obra de Marlowe é Doctor Faustus, TEMÁTICA que vai celebrizar o grande dramaturgo alemão Johann Wolfgang Goethe, no século XIX. Porém, o Fausto de Marlowe é muito mais dramático do que o de Goethe. Enquanto, em Goethe, Fausto, na versão final, é libertado por um coro de anjos, o Fausto de Marlowe cumpre o pacto e entrega a alma a satanás. Fragmento da obra de Marlowe: If we say that we have no sinne we decieve our selves, and there is no truth in us. Why then belike We must sinne, and so consequently die, I, we must, die, an everlasting death. What doctrine call you this? Che sera, sera: What will be, shall be; Divinitie adiew. These Metaphysicks of Magitians, And Negromantick bookes are heavenly. Lines, Circles, Signes Letters, and Characters, I these are those that Faustus most desires. Of power, of honour, and omnipotence, Is promised to the Studious Artizan? All things that move betweene the quiet Poles Shall be at my command: Emperors and Kings, Are but obey’d in their severall Provinces: Nor can they raise the winde, or rend the cloudes: But this dominion that exceeds in this, Stretched as farre as doth the mind of man: A sound Magitian is a Demi-god, Here tire my braines to get a Deity (p. 36-7) Mas parece então Que temos que pecar e, por conseguinte, morrer. Ai... temos de morrer, e morrer para todo o sempre. Como chamais esta lei? Che sarà, sara: O que for se há-de ver. Teologia, adeus. Esta metafísica dos mágicos, Estes livros arcanos é que são divinos. Linhas, círculos, sinais, letras e caracteres, Ah! Isto é o que Fausto mais deseja. Que mundo de lucro e de prazer, Quanto poder onipotência e honra Tudo o que se move entre os dois pólos Terei às minhas ordens: Imperadores e Reis Só nos seus domínios são obedecidos, E não podem erguer ventos, rasgar nuvens. Pelo seu poder que tudo isto excede E vai até onde a mente humana alcança, Um mágico sagaz é quase um deus. Aguça teu engenho, Fausto, e sê divino !
 
  FLORBELA ESPANCA (1894-1930)
 
Flor Bela de Alma da Conceição Espanca nasceu em Vila Viçosa, no Alentejo, filha de um pequeno antiquário, comerciante, desenhista e fotógrafo. Filha de um relacionamento extraconjugal, somente foi reconhecida pelo pai dezoito anos após a morte dela. Esse fato marcou sua vida de garota do interior. Foi uma das poucas meninas do interior a cursar o segundo grau. Ingressou no liceu masculino em Évora. Matriculou-se na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, sendo uma das 14 alunas entre mais de 300 alunos inscritos. Em 1920, teve de interromper seus estudos. Havia casado com um colega da escola secundária com quem não foi feliz. Anos mais tarde, passou a viver com um alferes de artilharia, com quem veio a casar-se posteriormente. Porém, em 1925, divorciou-se pela segunda vez e casou-se agora com um médico com quem já vivia há algum tempo. Florbela tinha um forte amor por seu irmão Apeles e ficou muito abalada quando, em 1927, ao fazer um curso de pilotagem, ele faleceu em acidente aéreo com um hidro-avião, precipitando-se no Tejo. Por fim, no dia 8 de dezembro de 1930, exatamente a data de seu 36º aniversário, suicidou-se com uma dose excessiva de barbitúricos, tendo deixado uma carta com seus últimos desejos entre os quais se inclui pedido de que fragmentos do avião em que falecera o irmão se lhe fossem juntados ao esquife. OBRAS: Poesia 1919 – Livro de Mágoas. Lisboa: Tipografia Maurício. 1923 – Livro de Sóror Saudade. Lisboa: Tipografia A Americana. 1931 – Charneca em Flor. Coimbra: Livraria Gonçalves. 1931 – Juvenília: versos inéditos de Florbela Espanca (com 28 sonetos inéditos). Estudo crítico de Guido Battelli. Coimbra: Livraria Gonçalves. 1934 – Sonetos Completos (Livro de Mágoas, Livro de Sóror Saudade, Charneca em Flor, Reliquiae). Coimbra: Livraria Gonçalves. Prosa 1931 – As Máscaras do Destino. Porto: Editora Marânus. 1981 – Diário do Último Ano. Prefácio de Natália Correia. Lisboa: Livraria Bertrand. 1982 – O Dominó Preto. Prefácio de Y. K. Centeno. Lisboa: Livraria Bertrand. ANTOLOGIA A Um Moribundo Não tenhas medo, não! Tranquilamente, Como adormece a noite pelo Outono, Fecha os teus olhos, simples, docemente, Como, à tarde, uma pomba que tem sono... A cabeça reclina levemente E os braços deixa-os ir ao abandono, Como tombam, arfando, ao sol poente, As asas de uma pomba que tem sono... O que há depois? Depois?... O azul dos céus? Um outro mundo? O eterno nada? Deus? Um abismo? Um castigo? Uma guarida? Que importa? Que te importa, ó moribundo? - Seja o que for, será melhor que o mundo! Tudo será melhor do que esta vida!... Em Busca do Amor O meu Destino disse-me a chorar: “Pela estrada da Vida vai andando; E, aos que vires passar, interrogando Acerca do Amor, que hás de encontrar.” Fui pela estrada a rir e a cantar, As contas do meu sonho desfilando... E noite e dia, à chuva e ao luar, Fui sempre caminhando e perguntando... Mesmo a um velho eu perguntei: “Velhinho, Viste o Amor acaso em teu caminho?” E o velho estremeceu... olhou... e riu... Agora pela estrada, já cansados, Voltam todos pra trás, desanimados... E eu paro a murmurar: “Ninguém o viu!...” "Sóror Saudade" A Américo Durão Irmã, Sóror Saudade me chamaste... E na minh'alma o nome iluminou-se Como um vitral ao sol, como se fosse A luz do próprio sonho que sonhaste. Numa tarde de Outono o murmuraste, Toda a mágoa do Outono ele me trouxe, Jamais me hão de chamar outro mais doce. Com ele bem mais triste me tornaste... E baixinho, na alma da minh'alma, Como bênção de sol que afaga e acalma, Nas horas más de febre e de ansiedade, Como se fossem pétalas caindo Digo as palavras desse nome lindo Que tu me deste: "Irmã, Sóror Saudade..." Fanatismo Minh'alma, de sonhar-te, anda perdida. Meus olhos andam cegos de te ver. Não és sequer razão do meu viver Pois que tu és já toda a minha vida! Não vejo nada assim enlouquecida... Passo no mundo, meu Amor, a ler No mist'rioso livro do teu ser A mesma história tantas vezes lida!... "Tudo no mundo é frágil, tudo passa... Quando me dizem isto, toda a graça Duma boca divina fala em mim! E, olhos postos em ti, digo de rastros: "Ah! podem voar mundos, morrer astros, Que tu és como Deus: princípio e fim!..." Meu Mal A Meu Irmão Eu tenho lido em mim, sei-me de cor, Eu sei o nome ao meu estranho mal: Eu sei que fui a renda dum vitral, Que fui cipreste, caravela, dor! Fui tudo que no mundo há de maior: Fui cisne, e lírio, e águia, e catedral! E fui, talvez, um verso de Nerval, Ou. um cínico riso de Chamfort... Fui a heráldica flor de agrestes cardos, Deram as minhas mãos aroma aos nardos... Deu cor ao eloendro a minha boca... Ah! de Boabdil fui lágrima na Espanha! E foi de lá que eu trouxe esta ânsia estranha, Mágoa não sei de quê! Saudade louca! Eu Eu sou a que no mundo anda perdida, Eu sou a que na vida não tem norte, Sou a irmã do Sonho, e desta sorte Sou a crucificada… a dolorida… Sombra de névoa tênue e esvaecida, E que o destino amargo, triste e forte, Impele brutalmente para a morte! Alma de luto sempre incompreendida!… Sou aquela que passa e ninguém vê… Sou a que chamam triste sem o ser… Sou a que chora sem saber porquê… Sou talvez a visão que Alguém sonhou, Alguém que veio ao mundo pra me ver E que nunca na vida me encontrou! Amar! Eu quero amar, amar perdidamente! Amar só por amar: Aqui... além... Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente Amar!Amar!E não amar ninguém! Recordar? Esquecer? Indiferente!... Prender ou desprender? É mal? É bem? Quem disser que se pode amar alguém Durante a vida inteira é porque mente! Há uma Primavera em cada vida: É preciso cantá-la assim florida, Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar! E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada Que seja a minha noite uma alvorada, À Morte Morte, minha Senhora Dona Morte, Tão bom que deve ser o teu abraço! Lânguido e doce como um doce laço E, como uma raiz, sereno e forte. Não há mal que não sare ou não conforte Tua mão que nos guia passo a passo, Em ti, dentro de ti, no teu regaço Não há triste destino nem má sorte. Dona Morte dos dedos de veludo, Fecha-me os olhos que já viram tudo! Prende-me as asas que voaram tanto! Vim da Moirama, sou filha de rei, Má fada me encantou e aqui fiquei À tua espera…quebra-me o encanto!
 
 A GRANDE EPOPEIA DE GILGAMESH 

 
GILGAMESH Na antiga Nínive, cidade da Mesopotâmia, hoje Iraque onde se situa a atual cidade de Moçul, o imperador assírio Assurbanipal (668-6627 a. C.), construiu uma grande biblioteca. Como as textos dessa época eram gravados em peças de cerâmica queimadas em fornos como acontece hoje com os tijolos, as bibliotecas tinham de ser enormes, mesmo não contendo um número tão avantajado de volumes. Imaginemos cada página como uma peça de cerâmica. Por menos espessa que seja, tomaria uma grande espaço. Em meados do século XIX, em escavações, essa preciosa biblioteca foi descoberta por arqueólogos em tábuas de argila contendo escritos em sinais denominados cuneiformes. Muitos estudiosos trabalharam na decifração desses sinais. Foram escritos produzidos a partir de 3.500 a. C. Há mesmo quem fale em escrita cuneiforme de 5.000 a. C. Talvez seja a mais antiga forma de grafia humana. Pelas necessidades administrativas como a cobrança de impostos, registro do número de cabeças de gado ou a quantidade de cereais, surgiu a escrita. Trata-se de uma língua isolada. Não está relacionada a nenhuma outra língua conhecida. É uma língua aglutinante, ou seja, os morfemas (as menores unidades com sentido da língua) se justapõem para formar palavras. Esse processo de escrita teve início como um sistema pictográfico, em que o objeto representado expressava uma ideia. Um barco marcado por determinados sinais, por exemplo, poderia significar que ele estava carregado ou vazio. Essa escrita começou com o que os pesquisadores chamaram de glifos cuneiformes que eram desenhados em tabuinhas de argila com um caniço afiado que recebeu o nome de estilete. O estilete gravava (grafava) sinais em forma de cunha numa tabuinha de argila mole que depois era levada ao forno para o endurecimento. Essa forma de cunha originou o nome da escrita cuneiforme. Esse sistema é muito difícil de ser decifrado, pois se constitui por mais de 2.000 sinais de difícil uso, por falta de uniformidade de emprego. Com passar do tempo, ao expandir seu emprego até mesmo para outros povos, se foi uniformizado e simplificando. Os primeiros intérpretes tiveram imensas dificuldades. Havia necessidade do conhecimento de árabe e hebraico, além de um profundo conhecimento da história desses povos tão antigos e tão distantes do momento histórico do estudioso. Iniciou-se, com a simplificação, um sistema silábico. Esses silabários tinham significado. Por exemplo, o sinal "mu" compõe-se de um cunho horizontal terminado por uma ramificação de quatro pequenas hastes em ângulo. Por seu lado, o sinal "zer" tem a mesma forma, mas a ramificação tem apenas três hastes. O seu nome era também: "o mu que não está terminado. Os sinais representavam objetos com substantivos, mas havia dificuldade de determinar categorias como verbos, adjetivos e processos sintáticos como declinações. Assim, um determinado sinal poderia significar cavalo, mas, por associação, poderia significar velocidade, viagem, movimento. Por isso, um sinal poderia ter diversos significados, bem como um só significado poderia ser representado por diferentes sinais. Depois de diversas experiências, passou-se a escrever como na maioria das línguas ocidentais, ou seja, da esquerda para a direita. Mesmo usando ambos o sistema cuneiforme, assírios e babilônios tinham sistemas diferentes. Exemplo de escrita cuneiforme: 
 
 
ESCRITA CUNEIFORME 
Foi somente em 1862, que o orientalista alemão Friedrich von Spiegel conseguiu decifrar a escrita cuneiforme (Keilschrift, em alemão) formulando e apresentando, em seguida, uma gramática e glossários das línguas cuneiformes. Essa descoberta permitiu que se fizessem as primeiras traduções da literatura desses povos. A partir dessas descobertas, em 1872, o antropólogo inglês George Smith fez a primeira tradução de parte da Epopeia do Gilgamesh, a que faz a narrativa do dilúvio, a mais antiga de que se tem conhecimento. O Gilgamesh constitui-se na mais antiga narrativa literária de toda a humanidade de que se tem conhecimento. Trata-se de uma compilação de lendas e poemas de tradição oral muito mais antiga ainda. O fato de essas narrativas terem sido encontradas em diversos pontos da Mesopotâmia garante que elas eram muito populares. Mesmo em outros povos e línguas, foram encontradas outras versões delas. O herói é sempre o rei lendário Gilgamesh, quinto governante da dinastia de Uruk, que teria vivido entre 2750 e 2600 a. C. Afirma-se que essas narrativas teriam mesmo influenciado tanto em narrativas bíblicas como a do dilúvio como nos textos gregos de Homero, do séc. IX a. C.Os judeus teriam entrado em contato com essas narrativas durante o exílio da Babilônia, conhecido como primeira diáspora judaica. Essa começa em 722, com a deportação de parte do povo judeu para a Assíria e, em 586, com Nabucodonosor II, da Babilônia, que deporta os restantes para a Mesopotâmia onde permanecem até a conquista de região pelo rei Ciro da Pérsia em 539 a. C. Esses anos todo em contato com os mesopotâmios teve profunda influência na cultura judaica. Sendo Gilgamesh um rei arrogante e luxurioso, o povo invoca aos deuses solicitando que lhes enviasse um novo regente, que enfrentasse e os livrasse de seu opressor. Anu, divindade poderosa, apiedou-se da população. Solicitou a Aruru, divindade feminina da criação, que criasse um novo rei para enfrentar Gilgamesh. Ela criou Enkidu.
 
 
ISHTAR 
 Ela, em sua mente, concebeu um homem que fosse da mesma essência de Anu, deus responsável pelo firmamento. Mergulhando suas mãos nas águas, a deusa recolheu um bloco de argila, criando dela Enkidu. Era Enkidu, desde sua criação, inocente, sem a malícia da civilização e foi criado nas selvas, entre as bestas selvagens, dividindo a vida com elas. Não conhecia o cultivo da terra e se alimentava de folhas silvestres, cresceu junto com as gazelas e os outros animais silvestres, bebendo as águas de riachos e fontes e alegrando-se com isso. Tendo Gilgamesh descoberto a existência de Enkidu, encarrega uma prostituta do templo da deusa Ishtar, deusa do amor e da fertilidade, de seduzir o jovem e conduzi-lo para o interior das muralhas de Uruk. Inocentemente seduzido pela sagacidade da prostituta, perdeu sua ingenuidade selvagem e conheceu a maldade da civilização urbana. Arrependido, porém, começa a se lamentar, mas a prostituta, para consolá-lo, começa por enumerar as vantagens da nova vida que lhe viria. Porém, o herói perdera sua força selvagem, tinha agora o conhecimento e os pensamentos do homem ocupavam seu coração. Agora és como um deus, dizia-lhe a prostituta. Por que anseias voltar para os campos e correr como os animais selvagens? Esta narrativa se assemelha profundamente à narrativa bíblica do Adão descrito no Gênesis. A prostituta sagrada é uma metáfora da Eva bíblica que conduz Adão ao pecado e ao conhecimento da árvore do bem do mal. Porém, Enkidu enfrenta Gilgamesh em combate singular e o vence, sendo reconhecido por este como irmão, pois ninguém jamais o vencera. Tornam-se grandes amigos. Essa amizade vai gerar um grande número de aventuras da epopeia.
  

GILGAMESH E ENKIDU 
Partem, então, ambos juntos, para uma floresta de cedros em que enfrentam o fabuloso monstro Humbaba, sentinela da floresta. O monstro censura Enkidu pela profanação da floresta como se a própria divindade a censurasse. Enkidu é condenado a ser um mercenário e a viver na servidão, dependendo do trabalho para obter seu pão. Essas condenações assemelham-se às de Adão. Porém, os condenados recebem o auxílio do deus sol, Shamash, que fora sempre protetor de Gilgamesh. Juntos, Enkidu e Gilgamesh decepam a cabeça de Humbaba. Essa atitude provoca a ira do deus da terra, do vento e do ar, conhecido pelo nome de Enlil, cuja exigência para que seja aplacado é a vida de um dos heróis No entanto, Ishtar, deusa do amor, apaixona-se por Gilgamesh que despreza essa paixão divinal, fato que transforma seu amor em ódio. Despeitada, a deusa envia um Touro Celeste com a missão de eliminar o seu desafeto.
 
 
 GILGAMESH, ENKIDU E O TOURO 
Unem-se os dois jovens e vencem o monstruoso touro. Enkidu ofende a divindade, jogando-lhe fragmentos do touro estraçalhado. Os mortais não devem ofender os imortais, afirma o deus Enlil e decide que Enkidu deverá morrer. O jovem adoece e morre. Então, Gilgamesh sai em sua missão derradeira na busca da imortalidade. Parte à procura dos segredos dos deuses imortais. Para tal enfrenta uma secessão de perigos. Encontra, então, Utnapishtin, que promete revelar-lhe o segredo da imortalidade. Confia-lhe que os deuses haviam acabado com a imortalidade humane desgostosos com as atitudes deles. Os humanos tinham gerado uma balbúrdia tal no universo que Enlil resolvera solicitar aos demais deuses o extermínio da raça humana. Depois de uma assembleia, a proposta do deus foi aceita por todos. Então, Enki, deus da água doce e da sabedoria, patrono das artes e protetor da humanidade, filho primogênito de Anu, descobre que os deuses decidiram destruir a humanidade através de um dilúvio. Assim, Utnapishtim, avisado por Enki, estava construindo um barco para salvar-se e aos seus. Exorta-o a desprezar os bens materiais e valorizar a própria alma. Enki fornecera-lhe todas as instruções para construir a barca com o material da própria residência. Levaria para lá também seu ouro, um casal de cada espécie, dos animais silvestres e selvagens, e sua família. Assim procedeu Utnapishtim e salvou-se com os seus e tudo o mais. Enlil, percebendo que fora ludibriado, que Enki revelara o segredo dos deuses, permitindo a sobrevivência de um grupo humano, viu-se obrigado a transformar Utnapishtim em um imortal, para que sua maldição de que nenhum mortal sobrevivesse se completasse. Dessa maneira, nenhum humano sobreviveria. Gilgamesh fracassa em sua busca da imortalidade para o amigo, decide retornar para Uruk, mas é auxiliado pela esposa de Utnapishtim que, penalizada pela desgraça dele, resolve revelar-lhe o segredo da imortalidade. Conta-lhe de uma planta cuja flor teria efeitos imortalizantes, porém, somente existia em um lugar distante, no fundo do mar. Aquele que, por ventura viesse a comê-la seria revestido da eterna juventude. Gilgamesh, depois de muitas peripécias, nadando, consegue atingir o almejado vegetal. Porém, o jovem herói decide socializar seu achado, dividindo-o com os anciãos de Uruk a sua conquista. Acontece que, no caminho de casa, uma serpente aquática rouba-lhe a flor sagrada e para sempre perde a imortalidade. Bibliografia: BOTTÉRO, Jean. La Mésopotamie (il État Une Fois la Mésopotamie). Paris: Gallimard, 1993. CAPLICE, Richard. Introduction to Akkadian. Rome: Biblical Institute Press, 1988. HOOKER, J.T. (eds.) Lendo o Passado – Do Cuneiforme ao Alfabeto. A História da Escrita Antiga. Rio de Janeiro: Melhoramentos/Edusp, 1996. KRAMER, Samuel Noah. La História empieza en Sumer. Barcelona: Orbis, 1985. SANDARS, N. K. A epopéia de Gilgamesh. São Paulo: Martins Fontes, 1992. ZILBERMAN, Regina. Nos princípios da epopéia: Gilgamesh. In: BAKOS, Margaret Marchiori; POZZER, Katia Maria Paim. JORNADA DE ESTUDOS DO ORIENTE ANTIGO: LÍNGUAS ESCRITAS E IMAGINÁRIAS, 3., 1997, Porto Alegre. Anais … trabalho 4. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1998, p. 58. LITERATURA IRLANDESA -
 
OSCAR WILDE
  
Oscar Fingal O'Flahertie Wills Wilde, ou simplesmente Oscar Wilde (Dublin, 1854 — Paris, 1900) escritor irlandês. Depois de escrever de diferentes formas ao longo da década de 1880, ele se tornou um dos dramaturgos mais populares de Londres, em 1890. Hoje ele é lembrado por seus epigramas e peças, e as circunstâncias de sua prisão, que foi seguido por sua morte precoce. (http://pt.wikipedia.org/wiki/Oscar_Wilde). O PRÍNCIPE FELIZ No ponto mais elevado da cidade, sobre uma alta coluna, erguia-se a estátua do Príncipe Feliz. Era toda revestida de finas folhas de ouro, tinha por olhos duas brilhantes safiras, e um grande rubi vermelho reluzia no punho de sua espada. Em razão disso, a estátua era por todos admirada. – É bela como um cata-vento – observou um dos conselheiros da cidade, que pretendia passar por homem de bom gosto artístico – só não é muito útil – acrescentou, temendo que o tomassem por homem pouco prático, o que de fato não era. – Por que não és como o Príncipe Feliz? – perguntou um dia uma mãe sensível ao filho que pedia a lua, chorando. – O Príncipe Feliz nunca chora por motivo algum. – Fico satisfeito que haja alguém no mundo que seja realmente feliz - murmurou um homem desapontado, enquanto fitava a estátua maravilhosa. Parece mesmo um anjo – diziam os meninos do orfanato, ao saírem da catedral com suas capas de vivo escarlate e aventais muito alvos. – Como sabeis? - disse o professor de matemática-, nunca vistes nenhum. – Ah! Nós os vimos em sonhos – responderam os meninos; e o professor de matemática franziu as sobrancelhas, com semblante muito severo, pois não aprovava que meninos sonhassem. Uma noite, voou sobre a cidade uma pequena andorinha. Suas companheiras haviam partido para o Egito havia seis semanas, mas ela ficara para trás, apaixonada que estava por um gracioso junco. Ela o conhecera no princípio da primavera, enquanto voava rio abaixo atrás de uma mariposa amarela, e de tal forma a atraíra a cintura esbelta do junco, que se detivera para falar-lhe. – Permites que te ame? - disse a andorinha, que gostava de perder tempo com rodeios. O junco fizera-lhe uma profunda reverência. Voara então repetidas vezes à roda dele, roçando as águas com a ponta das asas, produzindo mil ondulações de prata. Era sua maneira de lhe fazer a corte, que se prolongou pelo verão inteiro. Que afeição mais ridícula – chilrearam as outras andorinhas – ele não tem dinheiro e tem parentes demais. E, na verdade, o rio estava cheio de juncos. Quando veio o outono, todas as andorinhas voaram para longe. Depois que partiram, começou ela a sentir-se muito solitária e enfastiar-se de seu amado. – Ele não diz uma palavra, e temo que seja galanteador, porque está sempre flertando com a brisa. E, de fato, toda vez que a brisa soprava, o junco fazia as mais graciosas mesuras. – Além do mais ele é muito caseiro – continuou – enquanto eu adoro viajar, e meu esposo, consequentemente, também deveria gostar de viagens. – Queres vir comigo? – perguntou-lhe, por fim. Mas o junco meneou a cabeça; era por demais arraigado a seu lar para segui-la. – Estavas somente gracejando comigo – disse ela. – Vou para as pirâmides. Adeus! E se foi. Voou o dia inteiro e à noite chegou à cidade. – Onde pernoitarei? Espero que a cidade esteja preparada para me abrigar. Viu então a estátua do Príncipe Feliz sobre a alta coluna. – Vou me acomodar ali, murmurou. É um esplêndido lugar, com bastante ar fresco. – Assim, pousou entre os pés do Príncipe Feliz. – Tenho um aposento de ouro - disse baixinho para si, olhando ao redor, e preparando-se para dormir; mas no momento em que colocava a cabeça sob a asa, uma enorme gota de água caiu sobre ela. – Que estranho! Murmurou. Não há uma única nuvem no céu, as estrelas cintilam e, não obstante, está chovendo. O clima no Norte da Europa é mesmo horrível. O junco gostava de chuva, mas isso era puro egoísmo dele. Então caiu uma nova gota. – Para que serve uma estátua, se não é capaz de me proteger da chuva? – Tenho que procurar uma boa chaminé – disse ela. E já ia levantar voo. Mas antes que abrisse as asas, uma terceira gota caiu. Levantou os olhos e viu... Ah! O que viu ela? Os olhos do Príncipe Feliz estavam rasos de lágrimas, e lágrimas banhavam-lhe as faces douradas. Tão belo era seu rosto batido pelo luar que a pequena Andorinha encheu-se de compaixão. – Quem és tu? Perguntou-lhe. – Sou o Príncipe Feliz. – Por que choras, então? - Perguntou a andorinha. Encharcaste-me por completo. – Quando era vivo e tinha um coração humano – respondeu a estátua – eu não sabia o que eram lágrimas, pois vivia no Palácio de Sans-Souci, onde é vedado o ingresso à tristeza. Durante o dia, brincava com meus companheiros no jardim, e à noite conduzia a dança no grande salão. Em roda do jardim corria um muro muito alto, mas nunca me importei em saber em saber o que existia além dele. Tudo ao meu redor era tão lindo. Meus cortesãos chamavam-me Príncipe Feliz, e feliz em verdade eu era, se o prazer é felicidade. Assim vivi e assim morri. E agora, depois de morto, colocaram-me aqui tão alto que posso ver a fealdade e toda a miséria de minha cidade e, embora meu coração seja de chumbo, não posso fazer outra coisa senão chorar. – O quê? Ele não é de ouro maciço? – disse a andorinha para si. Era muito educada para fazer comentários pessoais em voz alta. – Lá longe – continuou a estátua em voz baixa e musical – muito longe numa rua estreita, há uma casinha pobre. Uma janela está aberta e vejo uma mulher sentada à mesa. Tem o rosto magro e abatido, e as mãos ásperas, picadas pela agulha, pois é costureira. Está bordando flores-da-paixão num vestido de cetim para a mais adorável dama de honra da rainha vestir no próximo baile da corte. Num leito, no canto do quarto, está deitado seu filho doente, tem febre, e pede laranjas. Mas ela nada tem nada para lhe dar, exceto água do rio, e por isso ele está chorando. – Andorinha, andorinha, pequena andorinha, não quer levar-lhe o rubi do punho da minha espada? Meus pés estão presos a este pedestal e não posso me mover. – Esperam-me no Egito - disse a andorinha. – Minhas amigas estão voando sobre o Nilo, conversando com as grandes flores de lótus. Em breve vão recolher-se na tumba do grande rei. O próprio rei está ali, em seu sarcófago coberto de adornos. Está enrolado em linho amarelo e embalsamado com especiarias. Em seu pescoço há um colar de jade verde-pálido, e suas mãos são como folhas secas. – Andorinha, andorinha, pequena andorinha – disse o Príncipe – não queres ficar comigo por uma noite apenas, e ser minha mensageira? O menino está com tanta sede, e a mãe tão triste... – Eu não simpatizo com meninos - respondeu a andorinha. – No verão, quando eu estava no rio, havia dois meninos rudes, os filhos do moleiro, que estavam sempre atirando pedras em mim. Nunca me acertaram, é claro; nós andorinhas voamos bem demais para que nos acertem, e venho de uma família famosa pela agilidade; ainda assim, foi um sinal de desrespeito. Mas o Príncipe Feliz parecia tão triste que a andorinha se condoeu: – Está muito frio aqui, mas permanecerei contigo por uma noite, e serei tua mensageira. – Muito obrigada, andorinha - disse o Príncipe. Então a andorinha tirou o enorme rubi da espada do príncipe e voou, levando-o no bico por sobre os telhados da cidade. Passou pela torre da catedral, onde estavam esculpidos anjos de mármore branco. Passou pelo palácio onde ouviu o rumor de uma dança. Uma jovem formosa apareceu na sacada com seu namorado. – Como estão maravilhosas as estrelas – disse ele – e como é maravilhoso o poder do amor! – Espero que meu vestido fique pronto a tempo para o baile de gala, respondeu a jovem. – Mandei bordá-lo de flores-da-paixão, mas a costureira é tão preguiçosa! Atravessou o rio e viu as lanternas que pendiam dos mastros dos navios. Passou sobre o gueto e viu velhos judeus negociando entre si, pesando moedas em balanças de cobre. Finalmente, chegou à casa pobre e espiou. O pequeno agitava-se febrilmente no leito, e a mãe caíra no sono, tão cansada estava. Saltou para dentro e deixou suavemente o grande rubi sobre a mesa, ao lado do dedal. Então voou suavemente em volta do leito, abanando a fronte do menino com as asas. – Sinto-me refrescar – disse o pequeno – acho que estou melhorando - e mergulhou num delicioso sono. Então a andorinha voltou ao Príncipe Feliz, e contou-lhe o tinha feito. – É curioso – observou ela – mas agora sinto calor, embora esteja tão frio. – É porque praticou uma boa ação – disse o Príncipe. E a pequena andorinha começou a pensar, adormecendo logo em seguida. Pensar sempre a fez ficar com sono. Quando o dia raiou, ela voou ao rio e tomou um banho. – Que fenômeno notável – disse o professor de ornitologia ao passar pela ponte. – Uma andorinha no inverno! E escreveu uma longa carta sobre isso no jornal local. Todos a citavam, porque estava cheia de palavras que não compreendiam. Esta noite parto para o Egito - disse a andorinha, bastante animada com a perspectiva. Visitou todos os monumentos públicos, e ficou pousada por um longo tempo no topo do campanário da igreja. Onde quer que fosse, os pardais aplaudiam, dizendo uns aos outros: – Que estrangeira distinta! E ela se divertiu bastante com isso. Quando a lua surgiu, voltou ao Príncipe feliz e disse: – Tem alguma encomenda para o Egito? Já estou partindo. – Andorinha, andorinha, pequena andorinha - disse o Príncipe -, não queres passar mais um noite comigo? – Esperam-me no Egito – respondeu a andorinha – Amanhã minhas amigas voarão até a segunda catarata. Os hipopótamos deitam-se ali entre os juncais, e num grande trono de granito está sentado o deus Mémnon. Durante a noite inteira ele contempla as estrelas, e quando brilha a estrela da manhã, ele solta um grito de alegria e depois silencia. Ao meio dia os leões vêm à margem das águas para beber. Têm olhos que se parecem com berilos verdes, e seus rugidos são mais estrondosos do que o rugir das cataratas. – Andorinha, andorinha, pequena andorinha – disse o Príncipe – longe, no outro lado da cidade, vejo um jovem numa água-furtada. Está debruçado sobre uma mesa coberta de papéis, e num copo ao seu lado há um maço de violetas murchas. Tem o cabelo castanho e crespo, uns lábios tão vermelhos como uma romã, e uns olhos grandes e sonhadores. Ele tenta terminar um peça para o diretor do teatro, mas sente muito frio para continuar escrevendo. Não há lenha no fogão, e ele já vai desfalecer de fome. – Ficarei contigo mais um noite – disse a andorinha, que no fundo tinha um bom coração. – Devo levar-lhe outro rubi? – Ai de mim! Não tenho mais rubis – disse o Príncipe – ; meus olhos são tudo o que me resta. São feitos de safiras preciosas, trazidas da Índia há mil anos. Arranca um deles e leva ao jovem. Ele a venderá ao joalheiro, comprará comida e lenha, e terminará a sua peça. – Caro Príncipe – disse a andorinha – não posso fazer semelhante coisa - e pôs-se a chorar. – Andorinha, andorinha, pequena andorinha – disse o Príncipe – faz o que te ordeno. Então a andorinha arrancou o olho do Príncipe e voou até a água-furtada do estudante. Era muito fácil entrar já que havia um buraco no telhado. Arremessou-se através dele e entrou no quarto. O jovem tinha a cabeça enterrada nas mãos, e não viu o bater das asas; quando levantou os olhos, encontrou a bela safira pousada sobre as violetas murchas. – Começo a ser apreciado. Isto deve ser de algum admirador. Agora posso terminar minha peça – gritou – parecendo muito contente. No dia seguinte, a andorinha foi ao porto. Pousou no mastro de uma grande embarcação e observou os marinheiros puxando arcas enormes do porão do navio. – Upa! - gritavam eles a cada arca que levantavam. – Vou para o Egito! – bradou a andorinha – mas ninguém lhe deu atenção, e quando a lua surgiu, voou até o Príncipe Feliz. – Vim para dizer-lhe adeus. – Andorinha, andorinha, pequena andorinha – disse o príncipe – não queres ficar mais uma noite comigo? – É inverno – retorquiu ela - e a fria neve logo vai chegar. No Egito, o sol é quente sobre as palmeiras, e os crocodilos deitam-se na lama e olham preguiçosamente ao redor. Minhas companheiras estão construindo um ninho no templo de Baalbeck, e as pombas rosadas as observam, arrulhando entre si. Caro Príncipe, tenho que deixá-lo, mas nunca o esquecerei; e na próxima primavera trarei duas lindas joias para substituir as que doou. O rubi será mais rubro que a rosa vermelha, e a safira tão azul quanto o imenso oceano. – Na praça logo abaixo – disse o Príncipe Feliz – há uma pequena vendedora de fósforos. Ela os deixou cair na sarjeta, e estão todos estragados. Seu pai baterá nela se não levar dinheiro para casa, e por isso ela está chorando. Não tem sapatos nem meias, e sua cabecinha está descoberta. Arranca-me o outro olho e leva-lhe, para que seu pai não a maltrate. – Ficarei contigo mais uma noite – disse a andorinha – mas não posso arrancar outro olho. Tu ficarias completamente cego. – Andorinha, andorinha, pequena andorinha – disse o príncipe – faz o que te ordeno. Ela arrancou então o outro olho do Príncipe e alçou voo. Precipitou-se sobre a vendedora de fósforos e deixou cair a joia na palma de sua mão. – Que lindo pedacinho de vidro – disse ela – e correu para casa sorrindo. A andorinha voltou ao Príncipe e disse: – Estás cego agora; então ficarei contigo para sempre. – Não, pequena andorinha – disse o Príncipe – deves partir para o Egito. – Ficarei contigo para sempre – disse a andorinha – e adormeceu aos pés do Príncipe Feliz. Durante todo o dia seguinte, ficou pousada no ombro do Príncipe, e contou-lhe histórias sobre coisas que viu em terras estranhas. Falou-lhe dos íbis vermelhos, que pousavam em longas fileiras nas margens do Nilo, apanhando peixes dourados com os bicos; da Esfinge, que é tão antiga quanto o próprio mundo, vive no deserto e tudo sabe; dos mercadores, que caminham vagarosamente ao lado de seus camelos e levam contas de âmbar nas mãos; do rei das montanhas da Lua, que é negro como o ébano e cultua um imenso cristal; da grande serpente verde, que dorme numa palmeira e tem vinte sacerdotes para alimentá-la com bolos de mel; e dos pigmeus que navegam sobre um grande lago em largas folhas e que estão sempre em guerra com as borboletas. – Querida andorinha – disse o Príncipe – tu me contas coisas espantosas, mas mais espantoso é o sofrimento de homens e mulheres. Não há mistério maior que a miséria. Voa por sobre minha cidade, pequena andorinha, e conte-me o que vir por lá. Assim, a andorinha voou sobre a grande cidade e viu os ricos divertindo-se em suas residências luxuosas, enquanto os mendigos sentavam-se em frente aos portões. Voou por becos escuros e viu os rostos pálidos das crianças esfaimadas, olhando apaticamente para as ruas sombrias. Sob o arco de uma ponte, estavam deitados dois meninos, abraçados um ao outro, tentando manter-se aquecidos. – Temos tanta fome! – diziam eles. – Vocês não podem ficar aqui – gritou o guarda noturno – e eles se retiraram, vagando sob a chuva. Então a andorinha voltou e contou ao Príncipe o que tinha visto. – Sou coberto de ouro puro - disse o Príncipe -, tu deves tirá-lo folha por folha, dá-lo aos meus pobres; os vivos cuidam que o ouro pode fazê-los felizes. Folha após folha de puro ouro a andorinha arrancou, até que o Príncipe Feliz ficasse fosco e acinzentado. Folha após folha de puro ouro levou aos pobres, e os rostos das crianças tornaram-se mais rosados, e elas riam e brincavam na rua. – Agora temos pão - gritavam as crianças. Então veio a neve, e depois da neve, o gelo. As ruas pareciam feitas de prata, de tão luminosas e brilhantes; pontas de gelo, longas como adagas de cristal, pendiam dos beirais das casas; todos passavam vestindo casacos de pele, e as crianças usavam gorros escarlate, patinando sobre o gelo. A pobre andorinha sentia cada vez mais frio, mas não queria deixar o príncipe, pois o amava muito. Apanhava as migalhas à porta do padeiro quando ele não estava olhando, e tentava se aquecer agitando as asas. Mas por fim sentiu que iria morrer. Mal tinha forças para voar uma vez mais ao ombro do príncipe – Adeus, querido Príncipe – murmurou – deixa-me beijar suas mãos? – Fico contente que vás para o Egito afinal – pequena andorinha – disse o Príncipe Feliz. – Ficaste muito tempo aqui, mas deves beijar-me os lábios, pois te amo. – Não é para o Egito que vou – disse a andorinha. – Vou para a casa da morte. A morte é irmã do sono, não é mesmo? Então beijou o Príncipe Feliz nos lábios e caiu morta aos seu pés. Naquele momento, um estranho estalo soou dentro da estátua, como se algo se tivesse quebrado. A verdade é que o coração de chumbo despedaçou-se em dois. Era certamente um gelo terrível. Na manhã seguinte, bem cedo, o prefeito caminhava na praça em companhia dos conselheiros da cidade. Ao passar pela coluna, olhou para a estátua: – Santo Deus! Que aspecto miserável tem o Príncipe Feliz! - disse ele. – Muito miserável, realmente - disseram os conselheiros da cidade, que sempre concordavam com o prefeito. – Na verdade, é pouco mais que um mendigo! – Pouco mais que um mendigo – disseram os conselheiros da cidade. E há até um pássaro morto aos seus pés! – continuou o prefeito. – Devemos emitir um decreto que proíba os pássaros de morrerem aqui. E o secretário da cidade anotou a sugestão. Então, puseram abaixo a estátua do Príncipe Feliz. – Como já não é belo, já não é mais útil - disse o professor de Arte na universidade. Assim, fundiram a estátua numa fornalha e o prefeito convocou uma reunião com a corporação, para decidir o que seria feito do metal. – Naturalmente, precisamos ter outra estátua – disse ele – e será com minha imagem. – Com minha imagem – disse cada um dos conselheiros da cidade – e começaram a discutir. Da última vez que soube deles, ainda estavam discutindo. – Que coisa estranha! – disse o contramestre da fundição. – Este coração de chumbo não derrete na fornalha. Vamos jogá-lo fora. - Assim, jogaram-no em um monte de lixo onde estava também a andorinha morta. – Traze-me as duas coisas mais preciosas da cidade – disse Deus a um de seus anjos; e o anjo trouxe-Lhe o coração de chumbo e o pássaro morto. 
The Happy Prince High above the city, on a tall column, stood the statue of the Happy Prince. He was gilded all over with thin leaves of fine gold, for eyes he had two bright sapphires, and a large red ruby glowed on his sword-hilt. He was very much admired indeed. "He is as beautiful as a weathercock," remarked one of the Town Councillors who wished to gain a reputation for having artistic tastes; "only not quite so useful," he added, fearing lest people should think him unpractical, which he really was not. "Why can't you be like the Happy Prince?" asked a sensible mother of her little boy who was crying for the moon. "The Happy Prince never dreams of crying for anything." "I am glad there is some one in the world who is quite happy," muttered a disappointed man as he gazed at the wonderful statue. "He looks just like an angel," said the Charity Children as they came out of the cathedral in their bright scarlet cloaks and their clean white pinafores. "How do you know?" said the Mathematical Master, "you have never seen one." "Ah! but we have, in our dreams," answered the children; and the Mathematical Master frowned and looked very severe, for he did not approve of children dreaming. One night there flew over the city a little Swallow. His friends had gone away to Egypt six weeks before, but he had stayed behind, for he was in love with the most beautiful Reed. He had met her early in the spring as he was flying down the river after a big yellow moth, and had been so attracted by her slender waist that he had stopped to talk to her. "Shall I love you?" said the Swallow, who liked to come to the point at once, and the Reed made him a low bow. So he flew round and round her, touching the water with his wings, and making silver ripples. This was his courtship, and it lasted all through the summer. "It is a ridiculous attachment," twittered the other Swallows; "she has no money, and far too many relations"; and indeed the river was quite full of Reeds. Then, when the autumn came they all flew away. After they had gone he felt lonely, and began to tire of his lady- love. "She has no conversation," he said, "and I am afraid that she is a coquette, for she is always flirting with the wind." And certainly, whenever the wind blew, the Reed made the most graceful curtseys. "I admit that she is domestic," he continued, "but I love travelling, and my wife, consequently, should love travelling also." "Will you come away with me?" he said finally to her; but the Reed shook her head, she was so attached to her home. "You have been trifling with me," he cried. "I am off to the Pyramids. Good-bye!" and he flew away. All day long he flew, and at night-time he arrived at the city. "Where shall I put up?" he said; "I hope the town has made preparations." Then he saw the statue on the tall column. "I will put up there," he cried; "it is a fine position, with plenty of fresh air." So he alighted just between the feet of the Happy Prince. "I have a golden bedroom," he said softly to himself as he looked round, and he prepared to go to sleep; but just as he was putting his head under his wing a large drop of water fell on him. "What a curious thing!" he cried; "there is not a single cloud in the sky, the stars are quite clear and bright, and yet it is raining. The climate in the north of Europe is really dreadful. The Reed used to like the rain, but that was merely her selfishness." Then another drop fell. "What is the use of a statue if it cannot keep the rain off?" he said; "I must look for a good chimney-pot," and he determined to fly away. But before he had opened his wings, a third drop fell, and he looked up, and saw - Ah! what did he see? The eyes of the Happy Prince were filled with tears, and tears were running down his golden cheeks. His face was so beautiful in the moonlight that the little Swallow was filled with pity. "Who are you?" he said. "I am the Happy Prince." "Why are you weeping then?" asked the Swallow; "you have quite drenched me." "When I was alive and had a human heart," answered the statue, "I did not know what tears were, for I lived in the Palace of Sans- Souci, where sorrow is not allowed to enter. In the daytime I played with my companions in the garden, and in the evening I led the dance in the Great Hall. Round the garden ran a very lofty wall, but I never cared to ask what lay beyond it, everything about me was so beautiful. My courtiers called me the Happy Prince, and happy indeed I was, if pleasure be happiness. So I lived, and so I died. And now that I am dead they have set me up here so high that I can see all the ugliness and all the misery of my city, and though my heart is made of lead yet I cannot chose but weep." "What! is he not solid gold?" said the Swallow to himself. He was too polite to make any personal remarks out loud. "Far away," continued the statue in a low musical voice, "far away in a little street there is a poor house. One of the windows is open, and through it I can see a woman seated at a table. Her face is thin and worn, and she has coarse, red hands, all pricked by the needle, for she is a seamstress. She is embroidering passion- flowers on a satin gown for the loveliest of the Queen's maids-of- honour to wear at the next Court-ball. In a bed in the corner of the room her little boy is lying ill. He has a fever, and is asking for oranges. His mother has nothing to give him but river water, so he is crying. Swallow, Swallow, little Swallow, will you not bring her the ruby out of my sword-hilt? My feet are fastened to this pedestal and I cannot move." "I am waited for in Egypt," said the Swallow. "My friends are flying up and down the Nile, and talking to the large lotus- flowers. Soon they will go to sleep in the tomb of the great King. The King is there himself in his painted coffin. He is wrapped in yellow linen, and embalmed with spices. Round his neck is a chain of pale green jade, and his hands are like withered leaves." "Swallow, Swallow, little Swallow," said the Prince, "will you not stay with me for one night, and be my messenger? The boy is so thirsty, and the mother so sad." "I don't think I like boys," answered the Swallow. "Last summer, when I was staying on the river, there were two rude boys, the miller's sons, who were always throwing stones at me. They never hit me, of course; we swallows fly far too well for that, and besides, I come of a family famous for its agility; but still, it was a mark of disrespect." But the Happy Prince looked so sad that the little Swallow was sorry. "It is very cold here," he said; "but I will stay with you for one night, and be your messenger." "Thank you, little Swallow," said the Prince. So the Swallow picked out the great ruby from the Prince's sword, and flew away with it in his beak over the roofs of the town. He passed by the cathedral tower, where the white marble angels were sculptured. He passed by the palace and heard the sound of dancing. A beautiful girl came out on the balcony with her lover. "How wonderful the stars are," he said to her, "and how wonderful is the power of love!" "I hope my dress will be ready in time for the State-ball," she answered; "I have ordered passion-flowers to be embroidered on it; but the seamstresses are so lazy." He passed over the river, and saw the lanterns hanging to the masts of the ships. He passed over the Ghetto, and saw the old Jews bargaining with each other, and weighing out money in copper scales. At last he came to the poor house and looked in. The boy was tossing feverishly on his bed, and the mother had fallen asleep, she was so tired. In he hopped, and laid the great ruby on the table beside the woman's thimble. Then he flew gently round the bed, fanning the boy's forehead with his wings. "How cool I feel," said the boy, "I must be getting better"; and he sank into a delicious slumber. Then the Swallow flew back to the Happy Prince, and told him what he had done. "It is curious," he remarked, "but I feel quite warm now, although it is so cold." "That is because you have done a good action," said the Prince. And the little Swallow began to think, and then he fell asleep. Thinking always made him sleepy. When day broke he flew down to the river and had a bath. "What a remarkable phenomenon," said the Professor of Ornithology as he was passing over the bridge. "A swallow in winter!" And he wrote a long letter about it to the local newspaper. Every one quoted it, it was full of so many words that they could not understand. "To-night I go to Egypt," said the Swallow, and he was in high spirits at the prospect. He visited all the public monuments, and sat a long time on top of the church steeple. Wherever he went the Sparrows chirruped, and said to each other, "What a distinguished stranger!" so he enjoyed himself very much. When the moon rose he flew back to the Happy Prince. "Have you any commissions for Egypt?" he cried; "I am just starting." "Swallow, Swallow, little Swallow," said the Prince, "will you not stay with me one night longer?" "I am waited for in Egypt," answered the Swallow. "To-morrow my friends will fly up to the Second Cataract. The river-horse couches there among the bulrushes, and on a great granite throne sits the God Memnon. All night long he watches the stars, and when the morning star shines he utters one cry of joy, and then he is silent. At noon the yellow lions come down to the water's edge to drink. They have eyes like green beryls, and their roar is louder than the roar of the cataract. "Swallow, Swallow, little Swallow," said the Prince, "far away across the city I see a young man in a garret. He is leaning over a desk covered with papers, and in a tumbler by his side there is a bunch of withered violets. His hair is brown and crisp, and his lips are red as a pomegranate, and he has large and dreamy eyes. He is trying to finish a play for the Director of the Theatre, but he is too cold to write any more. There is no fire in the grate, and hunger has made him faint." "I will wait with you one night longer," said the Swallow, who really had a good heart. "Shall I take him another ruby?" "Alas! I have no ruby now," said the Prince; "my eyes are all that I have left. They are made of rare sapphires, which were brought out of India a thousand years ago. Pluck out one of them and take it to him. He will sell it to the jeweller, and buy food and firewood, and finish his play." "Dear Prince," said the Swallow, "I cannot do that"; and he began to weep. "Swallow, Swallow, little Swallow," said the Prince, "do as I command you." So the Swallow plucked out the Prince's eye, and flew away to the student's garret. It was easy enough to get in, as there was a hole in the roof. Through this he darted, and came into the room. The young man had his head buried in his hands, so he did not hear the flutter of the bird's wings, and when he looked up he found the beautiful sapphire lying on the withered violets. "I am beginning to be appreciated," he cried; "this is from some great admirer. Now I can finish my play," and he looked quite happy. The next day the Swallow flew down to the harbour. He sat on the mast of a large vessel and watched the sailors hauling big chests out of the hold with ropes. "Heave a-hoy!" they shouted as each chest came up. "I am going to Egypt"! cried the Swallow, but nobody minded, and when the moon rose he flew back to the Happy Prince. "I am come to bid you good-bye," he cried. "Swallow, Swallow, little Swallow," said the Prince, "will you not stay with me one night longer?" "It is winter," answered the Swallow, "and the chill snow will soon be here. In Egypt the sun is warm on the green palm-trees, and the crocodiles lie in the mud and look lazily about them. My companions are building a nest in the Temple of Baalbec, and the pink and white doves are watching them, and cooing to each other. Dear Prince, I must leave you, but I will never forget you, and next spring I will bring you back two beautiful jewels in place of those you have given away. The ruby shall be redder than a red rose, and the sapphire shall be as blue as the great sea." "In the square below," said the Happy Prince, "there stands a little match-girl. She has let her matches fall in the gutter, and they are all spoiled. Her father will beat her if she does not bring home some money, and she is crying. She has no shoes or stockings, and her little head is bare. Pluck out my other eye, and give it to her, and her father will not beat her." "I will stay with you one night longer," said the Swallow, "but I cannot pluck out your eye. You would be quite blind then." "Swallow, Swallow, little Swallow," said the Prince, "do as I command you." So he plucked out the Prince's other eye, and darted down with it. He swooped past the match-girl, and slipped the jewel into the palm of her hand. "What a lovely bit of glass," cried the little girl; and she ran home, laughing. Then the Swallow came back to the Prince. "You are blind now," he said, "so I will stay with you always." "No, little Swallow," said the poor Prince, "you must go away to Egypt." "I will stay with you always," said the Swallow, and he slept at the Prince's feet. All the next day he sat on the Prince's shoulder, and told him stories of what he had seen in strange lands. He told him of the red ibises, who stand in long rows on the banks of the Nile, and catch gold-fish in their beaks; of the Sphinx, who is as old as the world itself, and lives in the desert, and knows everything; of the merchants, who walk slowly by the side of their camels, and carry amber beads in their hands; of the King of the Mountains of the Moon, who is as black as ebony, and worships a large crystal; of the great green snake that sleeps in a palm-tree, and has twenty priests to feed it with honey-cakes; and of the pygmies who sail over a big lake on large flat leaves, and are always at war with the butterflies. "Dear little Swallow," said the Prince, "you tell me of marvellous things, but more marvellous than anything is the suffering of men and of women. There is no Mystery so great as Misery. Fly over my city, little Swallow, and tell me what you see there." So the Swallow flew over the great city, and saw the rich making merry in their beautiful houses, while the beggars were sitting at the gates. He flew into dark lanes, and saw the white faces of starving children looking out listlessly at the black streets. Under the archway of a bridge two little boys were lying in one another's arms to try and keep themselves warm. "How hungry we are!" they said. "You must not lie here," shouted the Watchman, and they wandered out into the rain. Then he flew back and told the Prince what he had seen. "I am covered with fine gold," said the Prince, "you must take it off, leaf by leaf, and give it to my poor; the living always think that gold can make them happy." Leaf after leaf of the fine gold the Swallow picked off, till the Happy Prince looked quite dull and grey. Leaf after leaf of the fine gold he brought to the poor, and the children's faces grew rosier, and they laughed and played games in the street. "We have bread now!" they cried. Then the snow came, and after the snow came the frost. The streets looked as if they were made of silver, they were so bright and glistening; long icicles like crystal daggers hung down from the eaves of the houses, everybody went about in furs, and the little boys wore scarlet caps and skated on the ice. The poor little Swallow grew colder and colder, but he would not leave the Prince, he loved him too well. He picked up crumbs outside the baker's door when the baker was not looking and tried to keep himself warm by flapping his wings. But at last he knew that he was going to die. He had just strength to fly up to the Prince's shoulder once more. "Good-bye, dear Prince!" he murmured, "will you let me kiss your hand?" "I am glad that you are going to Egypt at last, little Swallow," said the Prince, "you have stayed too long here; but you must kiss me on the lips, for I love you." "It is not to Egypt that I am going," said the Swallow. "I am going to the House of Death. Death is the brother of Sleep, is he not?" And he kissed the Happy Prince on the lips, and fell down dead at his feet. At that moment a curious crack sounded inside the statue, as if something had broken. The fact is that the leaden heart had snapped right in two. It certainly was a dreadfully hard frost. Early the next morning the Mayor was walking in the square below in company with the Town Councillors. As they passed the column he looked up at the statue: "Dear me! how shabby the Happy Prince looks!" he said. "How shabby indeed!" cried the Town Councillors, who always agreed with the Mayor; and they went up to look at it. "The ruby has fallen out of his sword, his eyes are gone, and he is golden no longer," said the Mayor in fact, "he is litttle beter than a beggar!" "Little better than a beggar," said the Town Councillors. "And here is actually a dead bird at his feet!" continued the Mayor. "We must really issue a proclamation that birds are not to be allowed to die here." And the Town Clerk made a note of the suggestion. So they pulled down the statue of the Happy Prince. "As he is no longer beautiful he is no longer useful," said the Art Professor at the University. Then they melted the statue in a furnace, and the Mayor held a meeting of the Corporation to decide what was to be done with the metal. "We must have another statue, of course," he said, "and it shall be a statue of myself." "Of myself," said each of the Town Councillors, and they quarrelled. When I last heard of them they were quarrelling still. "What a strange thing!" said the overseer of the workmen at the foundry. "This broken lead heart will not melt in the furnace. We must throw it away." So they threw it on a dust-heap where the dead Swallow was also lying. "Bring me the two most precious things in the city," said God to one of His Angels; and the Angel brought Him the leaden heart and the dead bird. "You have rightly chosen," said God, "for in my garden of Paradise this little bird shall sing for evermore, and in my city of gold the Happy Prince shall praise me."
  
 Oscar Wilde
  
– Ela disse que dançaria comigo se eu lhe levasse rosas vermelhas – exclamou o jovem Estudante – mas estamos no inverno e não há uma única rosa em todo o meu jardim... Por entre as folhas, do seu ninho, no alto do carvalho, um Rouxinol o ouviu, e vendo-o, ficou a pensar. Não há nenhuma rosa vermelha em todo o meu jardim! – disse o Estudante – e seus lindos olhos encheram-se de lágrimas. Ah, nossa felicidade depende de pequeninas coisas! Já li tudo que escreveram os sábios, conheço todos os segredos da filosofia e, no entanto, a falta de uma rosa vermelha é a desgraça da minha vida. – Finalmente, eis um verdadeiro apaixonado, disse o Rouxinol. Noite após noite eu tenho cantado o Amor, sem conhecê-lo; noite após noite tenho contado sua história para as estrelas, e eis que agora o vejo. Seus cabelos são escuros como a flor do jacinto, e seus lábios são vermelhos como a rosa de seu desejo; porém a paixão transformou-lhe o rosto em marfim pálido, e a cravou-lhe na fronte sua marca. – Amanhã haverá um baile no palácio do príncipe – murmurou o jovem Estudante – e minha amada estará entre os convidados. Se eu lhe levar uma rosa vermelha, ela há de dançar comigo até o dia raiar. Somente se lhe levar uma rosa vermelha... Ah..., como eu queria tê-la em meus braços e sentir-lhe a cabeça no meu ombro, e sua mão presa à minha. Porém, não há nenhuma rosa vermelha no meu jardim, ... e ficarei só, ... e ela passará por mim sem me olhar. Não me dará nenhuma atenção, ... e meu coração se despedaçará. – Eis um verdadeiro apaixonado, ele ama de verdade, pensou o Rouxinol. Aquilo que eu canto, ele sofre; o que para mim é júbilo, para ele é sofrimento. Sem dúvida, o Amor é uma coisa maravilhosa. É mais precioso do que as esmeraldas, mais caro do que as opalas finas. Nem pérolas nem romãs podem comprá-lo, nem é coisa que se encontre à venda no mercado. Não é possível comprá-lo de comerciante, nem pesá-lo numa balança em troca de ouro. – Os músicos no balcão – disse o jovem Estudante – tocarão seus instrumentos de corda, e meu amor dançará ao som da harpa e do violino. Dançará com pés tão leves que nem sequer hão de tocar no chão, e os cortesãos, com seus trajes coloridos, vão cercá-la. Porém comigo ela não dançará, porque não tenho nenhuma rosa vermelha para lhe dar. E jogou-se na grama, cobriu o rosto com as mãos e chorou. – Por que chora ele?, – indagou um pequeno Lagarto Verde, ao passar correndo com a cauda levantada. – Sim, por quê?" – perguntou uma Borboleta, que esvoaçava em torno de um raio de sol. – Sim, por quê?" – sussurrou uma Margarida, virando-se para sua vizinha, com uma voz suave. – Ele chora por uma rosa vermelha – disse o Rouxinol. – Uma rosa vermelha? – exclamaram todos. – Mas que ridículo! E o pequeno Lagarto – que era um tanto cínico – riu à vontade. Porém, o Rouxinol compreendia o segredo da dor do Estudante, e calou-se no alto do carvalho, pensando no mistério do Amor. De repente, ele abriu as asas pardas e levantou voo. Atravessou o arvoredo como uma sombra, e como uma sombra cruzou o jardim. No centro do gramado havia uma linda Roseira, e quando a viu o Rouxinol foi até ela, pousando num ramo. – Dá-me uma rosa vermelha – exclamou ele – que cantarei meu canto mais belo para ti. Porém a Roseira fez que não com a cabeça. – Minhas rosas são brancas – respondeu ela – tão brancas quanto a espuma do mar, e mais brancas que a neve das montanhas. Porém procura minha irmã que cresce junto ao velho relógio de sol, e talvez ela possa te dar o que queres. Assim, o Rouxinol voou até a Roseira que crescia junto ao velho relógio de sol. – Dá-me uma rosa vermelha – exclamou ele – que cantarei meu canto mais belo para ti. Porém a Roseira fez que não com a cabeça. Minhas rosas são amarelas – respondeu ela – amarelas como os cabelos da sereia que está sentada num trono de âmbar, e mais amarelas que o narciso que floresce no prado, quando o ceifeiro ainda não veio com sua foice. Porém procura minha irmã que cresce junto à janela do Estudante, e talvez ela possa te dar o que queres. Assim, o Rouxinol voou até a Roseira que crescia junto à janela do Estudante. – Dá-me uma rosa vermelha – exclamou ele – que cantarei meu canto mais belo para ti." Porém a Roseira fez que não com a cabeça. – Minhas rosas são vermelhas – respondeu ela – vermelhas como os pés da pomba, e mais vermelhas do que os grandes leques de coral que ficam a abanar na caverna no fundo do oceano. Porém, o inverno congelou minhas veias, e o frio queimou meus brotos, e a tempestade quebrou meus galhos, e não darei nenhuma rosa este ano. – Uma única rosa vermelha é tudo que quero – exclamou o Rouxinol – só uma rosa vermelha! Não há nenhuma maneira de consegui-la? – Existe uma maneira – respondeu a Roseira – mas é tão terrível que não ouso te contar. – Conta-me –, disse o Rouxinol – Não tenho medo. – Se queres uma rosa vermelha – disse a Roseira – tens de criá-la com tua música ao luar, e tingi-Ia com o sangue de teu coração. Tens de cantar para mim apertando o peito contra um espinho. A noite inteira tens de cantar para mim, até que o espinho perfure teu coração e teu sangue penetre em minhas veias, e se torne meu. – A Morte é um preço alto a pagar por uma rosa vermelha – exclamou o Rouxinol, e todos dão muito valor à Vida. É agradável, no bosque verdejante, ver o Sol em sua carruagem de ouro, e a Lua em sua carruagem de madrepérola. Doce é o perfume do pilriteiro, e belas são as campânulas que se escondem no vale, e as urzes que florescem no morro. Porém, o Amor é melhor que a Vida, e o que é o coração de um pássaro comparado com o coração de um homem? Assim, ele abriu as asas pardas e levantou voo. Atravessou o jardim como uma sombra, e como uma sombra voou pelo arvoredo. O jovem Estudante continuava deitado na grama, onde o Rouxinol o havia deixado e as lágrimas ainda não haviam secado em seus belos olhos. – Regozija-te – exclamou o Rouxinol – regozija-te; terás tua rosa vermelha. Vou criá-la com minha música ao luar, e tingi-la com o sangue do meu coração. Tudo que te peço em troca é que ames de verdade, pois o Amor é mais sábio que a Filosofia, por mais sábia que ela seja, e mais poderoso que o Poder, por mais poderoso que ele seja. Suas asas são da cor do fogo, e tem a cor do fogo seu corpo. Seus lábios são doces como o mel, e seu hálito é como o incenso. O Estudante levantou os olhos e ficou a escutá-lo, porém, não compreendia o que lhe dizia o Rouxinol, pois só conhecia as coisas que estão escritas nos livros. Mas o Carvalho compreendeu, e entristeceu-se, pois ele gostava muito do pequeno Rouxinol que havia construído um ninho em seus galhos. – Canta uma última canção para mim, sussurrou ele; vou sentir-me muito solitário depois que tu partires. Assim, o Rouxinol cantou para o Carvalho, e sua voz era como água jorrando de uma jarra de prata. Quando o Rouxinol terminou sua canção, o Estudante levantou-se, tirando do bolso um caderno e um lápis. – Ele tem classe, não se pode negar – disse ele a si próprio – enquanto se afastava, caminhando pelo arvoredo, isso não se pode negar; mas terá sentimentos? Temo que não. Na verdade, ele é como a maioria dos artistas; só estilo, nenhuma sinceridade. Não seria capaz de sacrificar-se pelos outros. Pensa só na música, e todos sabem que as artes são egoístas. Mesmo assim, devo admitir que há algumas notas belas em sua voz. Pena que nada signifiquem, nem façam nada de bom na prática. E foi para seu quarto, deitou-se em sua pequena enxerga e começou a pensar em seu amor; depois de algum tempo, adormeceu. E quando a Lua brilhava nos céus, o Rouxinol voou até a Roseira e cravou o peito no espinho. A noite inteira ele cantou apertando o peito contra o espinho, e a Lua, fria e cristalina, inclinou-se para ouvir. A noite inteira ele cantou, e o espinho foi se cravando cada vez mais fundo em seu peito, e o sangue foi-lhe escapando das veias. Cantou primeiro o nascimento do Amor no coração de um rapaz e de uma moça. E no ramo mais alto da Roseira abriu-se uma rosa maravilhosa, pétala após pétala, à medida que canção seguia canção. Pálida era, de início, como a névoa que paira sobre o rio – pálida como os pés da manhã, e prateada como as asas da alvorada. Como a sombra de uma rosa num espelho de prata, como a sombra de uma rosa nas águas da lagoa, tal era a rosa que floresceu no ramo mais alto da Roseira. Porém a Roseira disse ao Rouxinol que se apertasse com mais força contra o espinho. – Aperta-te mais, pequeno Rouxinol – exclamou a Roseira – caso contrário, o dia chegará antes que esteja pronta a rosa. Assim, o Rouxinol apertou-se com ainda mais força contra o espinho, e seu canto soou mais alto, pois ele cantava o nascimento da paixão na alma de um homem e uma mulher. E um toque róseo delicado surgiu nas folhas da rosa, tal como o rubor nas faces do noivo quando ele beija os lábios da noiva. Porém, o espinho ainda não havia penetrado até seu coração, e assim o coração da rosa permanecia branco, pois só o coração do sangue de um Rouxinol pode tingir de vermelho o coração de uma rosa. E a Roseira insistia para que o Rouxinol se apertasse com mais força contra o espinho. – Aperta-te mais, pequeno Rouxinol – exclamou a Roseira – do contrário, o dia chegará antes que esteja pronta a rosa. Assim, o Rouxinol apertou-se com ainda mais força contra o espinho, e uma feroz pontada de dor atravessou-lhe o corpo. Terrível, terrível era a dor, e mais e mais tremendo era seu canto, pois ele cantava o Amor que é levado à perfeição pela Morte, o Amor que não morre no túmulo. E a rosa maravilhosa ficou rubra, como a rosa do céu ao alvorecer. Rubra era sua grinalda de pétalas, e rubro como um rubi era seu coração. Porém, a voz do Rouxinol ficava cada vez mais fraca, e suas pequenas asas começaram a se bater, e seus olhos se embaçaram. Mais e mais fraca era sua canção e ele sentiu algo a lhe sufocar a garganta. Então, desprendeu-se dele uma derradeira explosão de música. A Lua alva a ouviu e esqueceu-se do amanhecer, e permaneceu no céu. A rosa rubra a ouviu, e estremeceu de êxtase, e abriu suas pétalas para o ar frio da manhã. Transportou-a o Eco para sua caverna púrpura nas montanhas, e despertou de seus sonhos os pastores adormecidos. A música flutuou por entre os juncos do rio, e eles levaram sua mensagem até o mar. – Olha, olha! – exclamou a Roseira – a rosa está pronta. Porém, o Rouxinol não deu resposta, pois jazia morto na grama alta, com o espinho cravado no coração. E ao meio-dia o Estudante abriu a janela e olhou para fora. – Ora, mas que sorte extraordinária! – exclamou. Eis aqui uma rosa vermelha! Nunca vi uma rosa semelhante em toda minha vida. É tão bela que deve ter um nome comprido em latim. E, abaixando-se, colheu-a. Em seguida, pôs o chapéu e correu até a casa do Professor com a rosa na mão. A filha do Professor estava sentada à porta, enrolando seda azul num carretel, e seu cãozinho estava deitado a seus pés. – Disseste que dançarias comigo se eu te trouxesse uma rosa vermelha, disse o Estudante. Eis aqui a rosa mais vermelha de todo o mundo. Tu a usarás junto ao teu coração e ,quando dançarmos, ela te dirá quanto te amo. Porém a moça franziu a testa. – Creio que não vai combinar com meu vestido –, respondeu ela –; e, além disso, o sobrinho do Tesoureiro enviou-me joias de verdade, e todo mundo sabe que as joias custam muito mais do que as flores. – Ora, mas és mesmo uma ingrata – disse o Estudante – zangado, e jogou a rosa na rua; a flor caiu na sarjeta, e uma carroça passou por cima dela. – Ingrata!, exclamou a moça. Tu é que és muito mal-educado; e quem és tu? Apenas um Estudante. Ora, creio que não tens sequer fivelas de prata em teus sapatos, como tem o sobrinho do Tesoureiro. E, levantando-se, entrou em casa. – Que coisa mais tola é o Amor!, – disse o Estudante – enquanto se afastava. – É bem menos útil que a Lógica, pois nada prova, e fica o tempo todo a nos dizer coisas que não vão acontecer, e fazendo-nos acreditar em coisas que não são verdade. No final das contas, é algo muito pouco prático, e como em nossos tempos ser prático é tudo, vou retomar a Filosofia e estudar Metafísica. Assim, retornou para seu quarto, pegou um livro grande e poeirento, e pôs-se a ler. 
  THE NACHTIGALL AND THE ROSE Oscar Wilde 'She said that she would dance with me if I brought her red roses,' cried the young Student; 'but in all my garden there is no red rose.' From her nest in the holm-oak tree the Nightingale heard him, and she looked out through the leaves, and wondered. 'No red rose in all my garden!' he cried, and his beautiful eyes filled with tears. 'Ah, on what little things does happiness depend! I have read all that the wise men have written, and all the secrets of philosophy are mine, yet for want of a red rose is my life made wretched.' 'Here at last is a true lover,' said the Nightingale. 'Night after night have I sung of him, though I knew him not: night after night have I told his story to the stars, and now I see him. His hair is dark as the hyacinth-blossom, and his lips are red as the rose of his desire; but passion has made his lace like pale Ivory, and sorrow has set her seal upon his brow.' 'The Prince gives a ball to-morrow night,' murmured the young Student, 'and my love will be of the company. If I bring her a red rose she will dance with me till dawn. If I bring her a red rose, I shall hold her in my arms, and she will lean her head upon my shoulder, and her hand will be clasped in mine. But there is no red rose in my garden, so I shall sit lonely, and she will pass me by. She will have no heed of me, and my heart will break.' 'Here indeed is the true lover,' said the Nightingale. 'What I sing of he suffers: what is joy to me, to him is pain. Surely Love is a wonderful thing. It is more precious than emeralds, and dearer than fine opals. Pearls and pomegranates cannot buy it, nor is it set forth in the market-place. it may not be purchased of the merchants, 'or can it be weighed out in the balance for gold.' 'The musicians will sit in their gallery,' said the young Student, 'and play upon their stringed instruments, and my love will dance to the sound of the harp and the violin. She will dance so lightly that her feet will not touch the floor, and the courtiers in their gay dresses will throng round her. But with me she will not dance, for I have no red rose to give her;' and he flung himself down on the grass, and buried his face in his hands, and wept. 'Why is he weeping?' asked a little Green Lizard, as he ran past him with his tail in the air. 'Why, indeed?' said a Butterfly, who was fluttering about after a sunbeam. 'Why, indeed?' whispered a Daisy to his neighbour, in a soft, low voice. 'He is weeping for a red rose,' said the Nightingale. 'For a red rose!' they cried; 'how very ridiculous!' and the little Lizard, who was something of a cynic, laughed outright. But the Nightingale understood the secret of the Student's sorrow, and she sat silent in the oak-tree, and thought about the mystery of Love. Suddenly she spread her brown wings for flight, and soared into the air. She passed through the grove like a shadow, and like a shadow she sailed across the garden. In the centre of the grass-plot was standing a beautiful Rose-tree, and when she saw it, she flew over to it, and lit upon a spray. 'Give me a red rose,' she cried, 'and I will sing you my sweetest song.' But the Tree shook its head. 'My roses are white,' it answered; 'as white as the foam of the sea, and whiter than the snow upon the mountain. But go to my brother who grows round the old sun-dial, and perhaps he will give you what you want.' So the Nightingale flew over to the Rose-tree that was growing round the old sun-dial. 'Give me a red rose,' she cried, 'and I will sing you my sweetest song.' But the Tree shook its head. 'My roses are yellow,' it answered; 'as yellow as the hair of the mermaiden who sits upon an amber throne, and yellower than the daffodil that blooms in the meadow before the mower comes with his scythe. But go to my brother who grows beneath the Student's window, and perhaps he will give you what you want.' So the Nightingale flew over to the Rose-tree that was growing beneath the Student's window. 'Give me a red rose,' she cried, 'and I will sing you my sweetest song.' But the Tree shook its head. 'My roses are red,' it answered, 'as red as the feet of the dove, and redder than the great fans of coral that wave and wave in the ocean-cavern. But the winter has chilled my veins, and the frost has nipped my buds, and the storm has broken my branches, and I shall have no roses at all this year.' 'One red rose is all I want,' cried the Nightingale, 'only one red rose! Is there no way by which I can get it?' 'There is a way,' answered the Tree; 'but it is so terrible that I dare not tell it to you.' 'Tell it to me,' said the Nightingale, 'I am not afraid.' 'If you want a red rose,' said the Tree, 'you must build it out of music by moonlight, and stain it with your own heart's-blood. You must sing to me with your breast against a thorn. All night long you must sing to me, and the thorn must pierce your heart, and your life-blood must flow into my veins, and become mine.' 'Death is a great price to pay for a red rose,' cried the Nightingale, 'and Life is very dear to all. It is pleasant to sit in the green wood, and to watch the Sun in his chariot of gold, and the Moon in her chariot of pearl. Sweet is the scent of the hawthorn, and sweet are the bluebells that hide in the valley, and the heather that blows on the hill. Yet Love is better than Life, and what is the heart of a bird compared to the heart of a man?' So she spread her brown wings for flight, and soared into the air. She swept over the garden like a shadow, and like a shadow she sailed through the grove. The young Student was still lying on the grass, where she had left him, and the tears were not yet dry in his beautiful eyes. 'Be happy,' cried the Nightingale, 'be happy; you shall have your red rose. I will build it out of music by moonlight, and stain it with my own heart's-blood. All that I ask of you in return is that you will be a true lover, for Love is wiser than Philosophy, though she is wise, and mightier than Power, though he is mighty. Flame-coloured are his wings, and coloured like flame is his body. His lips are sweet as honey, and his breath is like frankincense.' The Student looked up from the grass, and listened, but he could not understand what the Nightingale was saying to him, for he only knew the things that are written down in books. But the Oak-tree understood, and felt sad, for he was very fond of the little Nightingale who had built her nest in his branches. 'Sing me one last song,' he whispered; 'I shall feel very lonely when you are gone.' So the Nightingale sang to the Oak-tree, and her voice was like water bubbling from a silver jar. When she had finished her song the Student got lip, and pulled a note-book and a lead-pencil out of his pocket. 'She has form,' he said to himself, as he walked away through the grove - 'that cannot be denied to her; but has she got feeling? I am afraid not. In fact, she is like most artists; she is all style, without any sincerity. She would not sacrifice herself for others. She thinks merely of music, and everybody knows that the arts are selfish. Still, it must be admitted that she has some beautiful notes in her voice. What a pity it is that they do not mean anything, or do any practical good.' And he went into his room, and lay down on his little pallet-bed, and began to think of his love; and, after a time, he fell asleep. And when the Moon shone in the heavens the Nightingale flew to the Rose-tree, and set her breast against the thorn. All night long she sang with her breast against the thorn, and the cold crystal Moon leaned down and listened. All night long she sang, and the thorn went deeper and deeper into her breast, and her life-blood ebbed away from her. She sang first of the birth of love in the heart of a boy and a girl. And on the topmost spray of the Rose-tree there blossomed a marvellous rose, petal following petal, as song followed song. Yale was it, at first, as the mist that hangs over the river - pale as the feet of the morning, and silver as the wings of the dawn. As the shadow of a rose in a mirror of silver, as the shadow of a rose in a water-pool, so was the rose that blossomed on the topmost spray of the Tree. But the Tree cried to the Nightingale to press closer against the thorn. 'Press closer, little Nightingale,' cried the Tree, 'or the Day will come before the rose is finished.' So the Nightingale pressed closer against the thorn, and louder and louder grew her song, for she sang of the birth of passion in the soul of a man and a maid. And a delicate flush of pink came into the leaves of the rose, like the flush in the face of the bridegroom when he kisses the lips of the bride. But the thorn had not yet reached her heart, so the rose's heart remained white, for only a Nightingale's heart's-blood can crimson the heart of a rose. And the Tree cried to the Nightingale to press closer against the thorn. 'Press closer, little Nightingale,' cried the Tree, 'or the Day will come before the rose is finished.' So the Nightingale pressed closer against the thorn, and the thorn touched her heart, and a fierce pang of pain shot through her. Bitter, bitter was the pain, and wilder and wilder grew her song, for she sang of the Love that is perfected by Death, of the Love that dies not in the tomb. And the marvellous rose became crimson, like the rose of the eastern sky. Crimson was the girdle of petals, and crimson as a ruby was the heart. But the Nightingale's voice grew fainter, and her little wings began to beat, and a film came over her eyes. Fainter and fainter grew her song, and she felt something choking her in her throat. Then she gave one last burst of music. The white Moon heard it, and she forgot the dawn, and lingered on in the sky. The red rose heard it, and it trembled all over with ecstasy, and opened its petals to the cold morning air. Echo bore it to her purple cavern in the hills, and woke the sleeping shepherds from their dreams. It floated through the reeds of the river, and they carried its message to the sea. 'Look, look!' cried the Tree, 'the rose is finished now;' but the Nightingale made no answer, for she was lying dead in the long grass, with the thorn in her heart. And at noon the Student opened his window and looked out. 'Why, what a wonderful piece of luck! he cried; 'here is a red rose! I have never seen any rose like it in all my life. It is so beautiful that I am sure it has a long Latin name;' and he leaned down and plucked it. Then he put on his hat, and ran up to the Professor's house with the rose in his hand. The daughter of the Professor was sitting in the doorway winding blue silk on a reel, and her little dog was lying at her feet. 'You said that you would dance with me if I brought you a red rose,' cried the Student. Here is the reddest rose in all the world. You will wear it to-night next your heart, and as we dance together it will tell you how I love you. ' But the girl frowned. 'I am afraid it will not go with my dress,' she answered; 'and, besides, the Chamberlain's nephew has sent me some real jewels, and everybody knows that jewels cost far more than flowers.' 'Well, upon my word, you are very ungrateful,' said the Student angrily; and he threw the rose into the street, where it fell into the gutter, and a cart-wheel went over it. 'Ungrateful!' said the girl. 'I tell you what, you are very rude; and, after all, who are you? Only a Student. Why, I don't believe you have even got silver buckles to your shoes as the Chamberlain's nephew has;' and she got up from her chair and went into the house. 'What a silly thing Love is,' said the Student as he walked away. 'It is not half as useful as Logic, for it does not prove anything, and it is always telling one of things that are not going to happen, and making one believe things that are not true. In fact, it is quite unpractical, and, as in this age to be practical is everything, I shall go back to Philosophy and study Metaphysics.' So he returned to his room and pulled out a great dusty book, and began to read.
  
LITERATURA ITALIANA – LUIGI PIRANDELLO
  
Dramaturgo italiano nascido em Agrigento, na Sicília, em 1867 e falecido em Roma em 1936. Pirandello constitui-se em um dos mais criativos dramaturgos italianos do fim do século XIX e início do século XX. Caracteriza-se por seu humor profundamente inovador. O humor se constrói sempre sobre as questões mal resolvidas da sociedade. Além de grande narrador e dramaturgo, escreveu também textos teóricos na área da literatura. No aspecto teórico separa o cômico do humorístico. A atitude humorística elimina o distanciamento e a superioridade em que aquele que ri procura entender as razões que o levaram ao riso. O seu primeiro grande sucesso foi o romance O Finado Mattia Pascal, escrito nas noites de vigília enquanto cuidava a esposa doente. Em 1925, após a morte da esposa, funda a companhia Teatro d’Arte di Roma com a qual viaja pelo mundo tendo se apresentado até mesmo na Broadway com imenso sucesso de suas comédias. Em 1934, recebe o Prêmio Nobel de Literatura. Obras de Pirandello: Duas de suas obras são mais conhecidas universalmente: O Finado Mattia Pascal. Il Fu Mattia Pascal. Seis Personagens à Procura de um Autor. Sei Personaggi in cerca d'Autore. Demais obras do autor traduzidas para o português: A armadilha: contos. Porto: Portugalia, 1946. A excluída.São Paulo: Germinal. A luz da outra casa: novelas escolhidas. São Paulo: Piratininga. 1932. A morta e a viva (e outras novelas). São Paulo: Martins. 1960. Cadernos de Serafino Gubbio Operador. Petrópolis: Vozes. 1990. Dona Mimma (Novelas para um ano). São Paulo: Berlendis & Vertecchia. 2002. Entre duas sombras (e outras novelas).São Paulo: Martins. 1962. Esta noite improvisa-se.Lisboa: Estampa / Seara Nova. 1974. Kaos e outros contos sicilianos. São Paulo: Nova Alexandria. 2001. O enxerto, o homem, a besta e a virtude. São Paulo: Edusp. 2003. O humorismo. São Paulo: Experimento. 1996. O marido de minha mulher (e outras novelas). São Paulo: Martins. 1963. O velho Deus (Novelas para um ano). São Paulo: Berlendis & Vertecchia. 2002. O velório (e outras novelas). São Paulo: Martins. 1963. Os gigantes da montanha. Rio de Janeiro: 7 Letras. 2005. Os velhos e os moços. São Paulo: Instituto Progresso Editorial. 1947. Seis personagens à procura de autor. São Paulo: Peixoto Neto. 2004. Sol e sombra (e outras novelas). São Paulo: Martins. 1963. Henrique IV e Pirandello: roteiro para uma leitura. Aurora Fornoni Bernardini. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1990. Um, nenhum e cem mil. São Paulo: Cosac & Naify. Uma jornada (Novelas para um ano). São Paulo: Berlendis & Vertecchia. 2006. Vestir os nus. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. Veja-se o exemplo do gostoso humor de Pirandello: “Todo suado e empoeirado, padre Elígio desce da escada e vem respirar um pouco de ar fresco, na pequena horta que conseguiu fazer nascer aqui, atrás da abside, protegida, em toda a volta, por fasquias e puas de madeira. - Ora, meu reverendo amigo – digo-lhe, sentado na mureta, o queixo apoiado no castão da bengala, enquanto ele cuida de suas alfaces. – Não me parece mais, o atual, tempo de escrever livros, nem por brincadeira. No que diz respeito à literatura, como a tudo o mais, devo repetir meu costumeiro estribilho: “Maldito seja Copérnico!“ - Oh, oh, oh, que tem Copérnico a ver com isso?! – exclama Padre Elígio, erguendo o busto, o rosto afogueado sob o grande chapéu de palha. - Tem, sim, Padre Elígio. Porque, quando a Terra não girava… - Ora esta! Mas se sempre girou! - Não é verdade. O homem não sabia disso e, portanto, era como se não girasse. Para muitos, ela continua a não girar também agora. Disse que girava, no outro dia, a um velho camponês; sabe o que ele me respondeu? Que era uma boa desculpa para bêbados. Aliás, o senhor também, tenha paciência, não pode pôr em dúvida que Josué fez o sol parar. Mas deixemos isto. Digo que, quando a Terra não girava e o homem, vestido de grego ou de romano, nela fazia boa figura, formando tão elevado conceito de si e comprazendo-se tanto com sua própria dignidade, acredito perfeitamente que pudesse ter acolhida favorável uma narração minuciosa e repleta de inúteis pormenores. Lê-se ou não se lê em Quintiliano, como o senhor me ensinou, que a História devia ser feita para narrar e não para demonstrar? - Não nego – responde Padre Elígio -, mas, também, é verdade que nunca se escreveram tantos livros, tão pormenorizados, ou melhor, tão carregados das mais secretas minudências, como desde quando, no seu modo de dizer, a Terra começou a girar. - Está bem: o senhor conde levantou-se cedo, às oito horas e meia em ponto… A senhora condessa pôs um vestido lilás, ricamente guarnecido de rendas no pescoço… Terezinha estava morrendo de fome… Lucrécia consumia-se de amor… Oh meu Deus do céu! Que importância isso pode ter para mim? Estamos ou não estamos num invisível piãozinho, para o qual um fio de sol serve de chicote, num grãozinho de areia enlouquecido, que gira e continua a girar, sem saber por quê, sem chegar nunca a destinação, como se achasse muito divertido girar assim, para fazer-nos sentir ora um pouco mais de calor, ora um pouco mais de frio, e, no fim, fazer-nos morrer (a miúdo, com a consciência de ter cometido uma série de pequenas tolices), após cinquenta ou sessenta giros? Copérnico, Copérnico, meu caro Padre Elígio, estragou a humanidade irremediavelmente. Agora, todos já nos adaptamos, aos poucos, à nova concepção de nossa infinita pequenez e a nos considerarmos menos do que nada, no Universo, com todas as nossas lindas descobertas e invenções. Que valor quer, então, que tenham as notícias, já não digo das misérias privadas, mas das nossas calamidades gerais? Histórias de minhocas, as nossas, agora. Leu a respeito daquele pequeno desastre nas Antilhas? Nada de importante. A Terra, coitada, cansada de girar, como quer aquele cônego polonês, sem qualquer finalidade, teve um pequeno movimento de impaciência e soprou um pouco de fogo por uma de suas muitas bocas. Sabe-se lá o que foi que lhe agitou essa espécie de bílis! Talvez a estupipez dos homens, que nunca foram tão cacetes como agora. Resultado: vários milhares de minhocas torradas. E toca para a frente! Quem fala mais nisso? Padre Elígio Pellegrinotto, porém, faz-me observar que, por mais esforços que empreguemos no cruel intento de arrancar, de destruir as ilusões que a previdente natureza criou para o nosso bem, não o conseguimos. Por sorte, o homem distrai-se facilmente.” Pirandello, Luigi. O Finado Mattia Pascal. Texto original em italiano: [..] Maledetto sia Copernico! - Oh oh oh, che c’entra Copernico! – esclama don Eligio, levandosi su la vita, col volto infocato sotto il cappellacio di paglia. - C’entra, don Eligio. Perché, quando la Terra non girava… - E dàlli! Ma se ha sempre girato! - Non è vero. L’uomo on lo sapeva, e dunque era come se non girasse. Per tanti, anche adesso, non gira. L’ho detto l’altro giorno a un vecchio contadino, e sapete come m’ha risposto? Ch’era una buona scusa per gli ubriachi. Del resto, anche voi, scusate, non potete mettere in dubbio che Giosuè fermò il Sole. Ma lasciamo stare questo. Io dico che quando la Terra non girava, e l’uomo, vestito da greco o da romano, vi faceva così bella figura e così altamente sentiva di sé e tanto si compiaceva della propria dignità, credo bene che potesse riuscire accetta una narrazione minuta e piena d’oziosi particolari. Si legge o non si legge in Quintiliano, come voi m’avete insegnato, che la storia doveva esser fatta per raccontare e non per provare? - E va bene! Il signor conte si levò per tempo, alle ore otto e mezzo precise… La signora contessa indossò un abito lilla con una ricca fioritura di merletti alla gola… Teresina si moriva di fame… Lucrezia spasimava d’amore… Oh, santo Dio! E che volete che me n’importi? Siamo o non siamo su un’invisibile trottolina, cui fa da ferza un fil di sole, su un granellino di sabbia impazzito che gira e gira e gira, senza saper perché, senza pervenir mai a destino, come se ci provasse gusto a girar così, per farci sentire ora un po’ più di caldo, ora un po’ più di freddo, e per farci morire – spesso con la coscienza d’aver commesso una sequela di piccole sciocchezze – dopo cinquanta o sessanta giri? Copernico, Copernico, don Eligio mio, ha rovinato l’umanità, irrimediabilmente. Ormai noi tutti ci siamo a poco a poco adattati alla nuova concezione dell’infinita nostra piccolezza, a considerarci anzi men che niente nell’Universo, con tutte le nostre belle scoperte e invenzioni; e che valore dunque volete che abbino le notizie, non dico delle nostre miserie particolari, ma anche delle generali calamità? Storie di vermucci ormai, le nostre. Avete letto di quel piccolo disastro delle Antille? Niente. La Terra, poverina, stanca di girare, come vuole quel canonico polacco, senza scopo, ha avuto un piccolo moto d’impazienza, e ha sbuffao un po’ di fuoco per una delle tante sue bocche. Chi sa che cosa le aveva mosso quella specie di bile. Forse la stupidità degli uomini che non sono stati mai così nojosi come adesso. Basta. Parecchie migliaja di vermucci abbrustoliti. E tiriamo innanzi. Chi ne parla più?
 
LITERATURA FRANCESA - MARCEL PROUST – HOMOAFETIVIDADE E LITERATURA 
  
MARCEL PROUST 
Valentin Louis Georges Eugène Marcel Proust – (1871-1922) – Proust foi um ilustre romancista francês que se notabilizou pela publicação da famosa obra “À la Recherche du Temps Perdu”, publicada em sete partes entre 1913 e 1922. Nascera da prestigiosa família Proust, ainda mais importante o fato de seu pai, Adrien Proust, ser renomado professor na Faculdade de Medina. Isso proporcionou-lhe uma infância sem preocupações e Sempre teve sérios problemas de saúde que se agravaram com a perda dos pais. Sofria de asma desde a infância. Era homoafetivo e se reconhecia como tal e tratou abertamente da própria problemática e de seus pares em relação à aceitação por parte da sociedade. Era protegido pela mãe. O pai exigia-lhe uma profissão. Passou, então, a trabalhar na Bibliothèque Mazarine como voluntário. Fez grande esforço para exercer suas funções, sempre com grandes problemas de saúde. Conseguiu uma licença por doença e por fim uma aposentadoria. Viveu na casa dos pais até a morte deles. Em 1903, seu irmão casou-se e abandonou o apartamento da família. No mesmo ano, perdeu o pai. Por fim, em 1905, faleceu sua mãe, protetora e amada. Porém, ela deixou-lhe uma herança considerável. Essa perda, no entanto foi avassaladora, agravando-lhe ainda mais os problemas de saúde que desde sempre enfrentara. Foi-se tornando cada vez mais recluso, até que nos últimos três anos confinou-se no próprio quarto. Dormia durante o dia todo e escrevia pela noite. Faleceu em 18 de novembro de 1922 em consequência de uma pneumonia. Seu corpo foi enterrado no cemitério Père Lachaise, em Paris. OBRAS: Les Plaisirs et les Jours (Calmann-Lévy, 1896); La Bible d’Amiens (Mercure de France, 1904) ; La Mort des Cathédrales (Le Figaro, 1904) ; Sésame et les Lys (1906) ; Pastiches et Mélanges (NRF, 1919); Chroniques (1927); Jean Santeuil (1952); Contre Sainte-Beuve (1954); Chardin et Rembrandt (Le Bruit du temps, 2009); Porém, sua grande obra é Em Busca do Tempo Perdido, que se divide em sete partes: 1. No Caminho de Swann (Grasset, 1913) - Parte 1: Combray - Parte 2: Um Amor de Swann - Parte 3: Nome de Terras: A Nome 2. À Sombra das Raparigas em Flor (1918) - Em Torno da Senhora Swann - Nome de Terras: A Terra 3. O Caminho de Guermantes (1921-1922) 4. Sodoma e Gomorra (1922-1923) 5. A Prisioneira (1923) 6. A Fugitiva (Albertine Desaparecida - 1925) 7. O Tempo Redescoberto (1927) Comentários sobre a obra de Proust: 1. Carlos Augusto Silva Professor e crítico literário Poderá mesmo um livro mudar a vida de um leitor? Pode mesmo uma obra de arte ter papel preponderante na modificação da concepção de pensamento a respeito da realidade na qual se vive? Poderá ela reconfigurar nossa maneira de se portar com as pessoas, de refletir sobre as atitudes, de conceber a realidade? Essas são questões antigas quando o tema da querela é a criação artística. Serve para quê? Afinal, debruçar-se sobre um livro, postar-se diante de um quadro, sentar-se por duas horas numa poltrona às vezes desconfortável de teatro para ver a representação de algo que, grosso modo, não é verdade; buscar significado em movimentos sincronizados que nada mais possam ter além de beleza; ver algo além da utilidade em uma construção arquitetônica, é uma experiência válida para a consolidação de uma visão renovada da realidade? Se seguirmos José Saramago ou Oscar Wilde, a resposta é não. Para o português, a literatura para nada serve, mas pondera, numa entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, perguntando após dar sua polêmica resposta: “Mas para quê os pássaros cantam?”. O dandy irlandês, em seu prefácio ao romance O Retrato de Dorian Gray , é enfático: “Toda arte é absolutamente inútil”. Evidentemente não podemos ser simplistas na interpretação dessas sentenças. São complexas, pois tratam de uma coisa complexa e advêm de pessoas igualmente complexas. Penso que tanto Saramago quanto Wilde, ao dizerem que a arte não serve para nada, dizem que ela serve para tudo. Ela é livre. Seria como questionar um filósofo a respeito do bordão conhecido a respeito da filosofia: “A Filosofia é uma coisa com a qual e sem a qual o mundo continua tal e qual.” Um filósofo provavelmente diria: “Ao menos ela não é escrava de ninguém, é complicado apegarmo-nos aos conceitos de utilidade de um mundo em crise de valores como o nosso.” Essa pergunta parece desnecessária a um acadêmico de um curso de ciências humanas _ se seguirmos à risca os estereótipos a que são submetidos esses estudantes _, ou a um apreciador da Literatura, do teatro, da dança... Mas é muito pertinente quando se trata de um aventureiro pelos caminhos da apreciação estética, por alguém que vez ou outra pega um romance para passar o tempo, ou um poema para presentear a namorada, ou vai a um espetáculo antes da boêmia para encenar-se cult , já que arte é, no imaginário coletivo, ainda _ pela dificuldade de acesso e pelo clima de superioridade que a burguesia vazia imprime no ar _, uma coisa para aristocratas. Esses, que não formam o público cativo (ou cativado) da arte, com certeza fariam a si mesmos essa pergunta se parados diante das duas mil e quinhentas paginas do romance Em Busca do tempo Perdido: “Para que perder (ou investir) tanto tempo lendo isso, num mundo com tantas possibilidades de informação rápida e automática, mastigada, digerida, pronta para ser usada em minhas conversas de bar, nas quais tentarei forjar minha posição de burguês intelectualizado?” Ou, “por que ler esse? Somando as páginas, nesse tempo poderia ler, no mínimo, outros dez livros importantes. Dá, por exemplo, para se ler três vezes Ulisses?” De fato, essa pergunta seria feita, é feita, constantemente. Em contrapartida, hoje em dia é mais necessário do que nunca conhecer Marcel Proust e seu Em Busca do Tempo Perdido. Com ele podemos correr atrás da verdade perdida, esquecida, da qual sabemos cada vez menos. Em relação a Saramago e Wilde, Proust está na outra ponta da corda. Para ele, literatura não só serve para alguma coisa, como é a única possibilidade de conceber vida em um sentido completo, verdadeiro e genuíno. Ele nos diz no último volume dos sete que compõe a obra:... captar, fixar, revelar-nos a realidade longe da qual vivemos. Essa realidade que corremos o risco de viver sem conhecer,[...] que está presente em todos os homens e não apenas nos artistas. Mas não a veem porque não a tentam desvendar, e assim seu passado se entulha de clichês inúteis porque não revelados pela inteligência. Só pela arte podemos sair de nós mesmos, saber o que vê outrem de seu universo que não é o nosso. Graças à arte, em vez de contemplar um só mundo, o nosso, vemo-lo multiplicar-se. Esse trabalho do artista, de buscar sob a matéria, sob a experiência, as palavras, algo diferente, é exatamente o inverso do que realiza o hábito, amontoando sob nossas impressões os objetos práticos a que erradamente chamamos vida. Percorrer as duas mil e quinhentas paginas distribuídas em sete romances pode parecer uma tarefa cansativa, árdua, pesada, tediosa. Mas não. De fato, não. Proust fala de leitores de sua obra que não seriam seus leitores, mas sim leitores de si mesmos. Pretendia com ela oferecer a eles um instrumento óptico com o qual lhes fosse possível adquirirem modos de se lerem, de se conhecerem, de se perceberem. O conceito de utilidade fica por demais patético diante das aventadas sobre nossa alma que o livro opera, implacável em sua função de nos revelar a verdade por trás de cada gesto ou olhar, ocasiões domésticas, sentimentais ou fatos Históricos. Ser um leitor de Proust é, antes de qualquer coisa, mergulhar numa experiência de singular beleza. São frases torrenciais, longas. Reflexões profundas, parágrafos de três, quatro, às vezes cinco páginas, nos quais o tema pode ser o mais prosaico, comum e corriqueiro, mas que ele transforma em algo de inacreditável, de maravilhoso, de relevante, como tudo, para a recuperação da verdade perdida no Tempo. Gilles Deleuze, filósofo compatriota de Proust, chega, em sua obra clássica dos estudos proustianos, Proust e os Signos, à conclusão de que o tema do romance não é o tempo, mas sim a verdade, o aprendizado dos signos, guardados na taça de chá, na sonata de Vinteuil, nas paixões da adolescência, nas crises de ciúme, nas variedades de desejo, de vertentes de sensualidade, de amores paternos, maternos, fraternais. A vida inteira cabe na busca do tempo perdido, e se renova, sempre, incessante, a cada instante de leitura, releitura, reencontro com nossos sentimentos perdidos, (re)vistos nas personagens, estranhas, mas que nos parecem próximas, com as quais percebemos tantas afinidades, e temos tantas repulsas, revoltas, por vermos nelas a nós mesmos, nossas histórias de intimidade, jamais reveladas a alguém, claras, diáfanas, e temerosos, mas encantados por tamanha carga definitiva de vida, entregamo-nos a um momento raro nos dias de hoje, nos quais Proust é mais que conveniente. Se no tempo nos movimentamos, se nos instantes caminhamos rumo ao conhecimento ou ao desconhecimento de nós mesmos, é nessa paisagem definida e sinuosa que Proust pretende se (nos) resgatar, colher, como lírios, antigos, porém renovados pela busca, pelo olhar artístico forte para restaurar um instante que parecia desimportante quando baralhado a tantos outros. O instante da rememoração é essencial para o francês. Para ele não se pode saber e viver ao mesmo tempo, pois no momento do viver estamos demasiado ocupados, identificados, sugados pelas percepções falsamente reais do dia-a-dia. Depois, na recordação, podemos filtrar, tirar das situações as pérolas capazes de nos salvar do ciclo do hábito, que faz com que o garoto não perceba seu quarto em Combray, e cuja ausência não o deixa sentir-se à vontade no quarto de Balbec, região litorânea na qual passa as suas primeiras férias do romance na companhia da avó, cuja ausência se fará dolorosa, densamente doída no retorno à Balbec, aí já sem ela, então falecida, na qual se operará o encontro definitivo com o vazio, produzido, tecido, configurado pelo tempo, que, junto com sua avó, arrastou, ou tentou arrastar, o sentimento que os fazia próximos _ não percebido em sua real dimensão por Marcel quando estava ela viva, mas visto em sua totalidade depois de ela morta _, mas que resiste, pois é salvo pela arte, que o reporta ao presente, transformado palavra, transformado beleza, transformado literatura. Arte. É atual alguns livros que pretendem uma abordagem de auto-ajuda, contrária à do romance, à de Proust, à da verdadeira Literatura, trazendo a ideia de que Marcel Proust tem fórmulas prontas para operar na vida de seu público a tal mudança prometida pela maioria, ou talvez pela totalidade de seus leitores. É um engano maldoso, talvez mal intencionado, que encontra contorno de justificação na atualidade, na qual o vazio coletivo e a indisposição de empreitadas como as que Proust realizou, procura fórmulas, receitas. Não é essa a proposta de Marcel (narrador [?]), nem a de Proust. Se ele pode mudar a sua vida, não é através de formulas, ou de “como”, ou “de que maneira”. Assim não é porque não há fórmula. Não há receita. Não há roteiro. É um livro através do qual você poderá ler a si mesmo, encontrar-se nas paisagens, recordações que se fazem vivas por via da memória. Proust poderá mudar a sua vida na medida em que, mergulhado na leitura, parta você, enquanto leitor de si mesmo, no encontro de seu tempo perdido , de seus signos perdidos, e assim aprenda, por via do olhar proustiano, ou o mais próximo possível disso, a observar, através da arte e de suas próprias sensibilidades, encontrar, nos fatos, por menores que sejam, as verdades que só um olhar proustiano pode nos oferecer. O autor francês não resolve problemas, nem passa a mão em nossas frontes, muito menos dá palavras de consolo. Ao contrário, instiga-nos a nos levantar da cadeira do hábito, na qual estamos acostumados a nos sentar diariamente, esquivando-nos de nossas partes não apetecíveis aos pensamentos acomodados e covardes, periféricos porque deficientes, incapazes, inconsequentes, não decifrados pela inteligência . De modo algum ele facilita nossa vida. Não é esse seu objetivo, a arte tem mais a meta de desarrumar o ordenado para nos por a buscar novos modelos para a composição da realidade, do que o de deixar tudo como está. Sobra-nos motivos para ler Proust. Walter Benjamin nos diz de um desejo de felicidade que permearia todo o Em busca do tempo perdido , divide essa felicidade em hino e elegia; hino é o novo, o sem precedentes; a elegia é o que se renova, como a Veneza, que surge do tropeção, ou a Combray, que surge do chá. E para os leitores é a felicidade do encontro, ou reencontro de si mesmo, a felicidade de se ver cúmplice da mais profunda intimidade, da mais visceral realidade, que transcende, tudo o que desprezamos em prol de uma postura realista, como disse Antônio Cândido, em seu ensaio "Realidade e Realismo" (Via Marcel Proust), contido no volume Recortes, no qual diz que Se considerarmos realismo as modalidades modernas, que se definiram no século XIX e vieram até nós, veremos que eles tendem a uma fidelidade documentária que privilegia a representação objetiva do momento presente da narrativa. No entanto, mesmo dentro do realismo, os textos de maior alcance procuram algo mais geral, que pode ser a razão oculta sob a aparência dos fatos narrados ou das coisas descritas, e pode ser a lei destes fatos na sequência do tempo. Isso leva a uma conclusão paradoxal: que talvez a realidade se encontre mais em elementos que transcendem a aparência dos fatos e coisas descritas do que neles mesmos. E o realismo, estritamente concebido como representação mimética do mundo, pode não ser o melhor condutor da realidade. Antônio Cândido dá a Proust estatus de criador da supra-realidade, do real mais do que real, da verdade apontada por Deleuze, da ponte entre memória involuntária e aprendizado dos signos, da verdade que se sugere viva. O livro A Técnica do Romance em Marcel Proust , do crítico Álvaro Lins, tem como meta defender a tese de que uma leitura completa de Em busca do tempo perdido só pode ser feita se lido e relido em seguida, como que introjetando na leitura a estrutura circular do romance. Ou seja, depois de uma primeira viagem, podemos ver, numa segunda, a verdadeira concepção de tempo, de memória como recuperação do mesmo e do modo como esta procura se dá na mente do narrador, e na estrutura ficcional do romance. Se pensarmos na dimensão da obra, veremos que o autor não pretendia realmente facilitar a vida de ninguém, nem fornecer fórmulas fáceis. Proust pode mudar nossa vida, desde que mudemos com ele, e nos tornemos algo diferentes do que hoje impera em nossa sociedade desprovida de tanto sentido. Proust muda a vida de seus leitores, mas exige do leitor de hoje uma mudança prévia. Por tudo isso, que é somente a ponta do imenso iceberg proustiano, vale a pena, na companhia deste francês que transformava tudo em que punha os olhos, arte, irmos atrás do tempo perdido, da verdade perdida, ou, como quer Benjamin, da felicidade perdida, sempre (re) encontrada, viva, verdadeira, plena, como cada uma das frases longas, profundas, densas de tempo, gravadas na eternidade da beleza, da humanidade, da arte de Marcel Proust, que conosco, pode sim, mudar tudo, e fazer-nos ver nossa vida, a verdadeira vida, a vida enfim descoberta e esclarecida, a única vida realmente vivida. 2. Principal obra de Marcel Proust é relançada no Brasil CASSIANO ELEK MACHADO Folha de S.Paulo A "busca" continua, agora remodelada. A grande catedral literária francesa, "Em Busca do Tempo Perdido", está de cara nova nas livrarias brasileiras. Originalmente dividida em sete volumes, a obra-prima que Marcel Proust escreveu entre 1907 e 1922, ano de sua morte, ganha uma nova edição no Brasil, desta vez em três tomos. O conteúdo muda pouco. O projeto traz a mesma tradução que a Ediouro havia lançado em 1992, a cargo do poeta carioca Fernando Py, que apenas revisou seu próprio trabalho, agora embalado em uma caixa de papelão roxa com o dizer "Em Busca do Tempo Perdido - Obra Completa". A empreitada vale registro ainda assim. Antes desse lançamento, há dez anos, o mercado brasileiro só tinha uma versão nacional de "À la Recherche du Temps Perdu", nome original da obra. A primeira, publicada no início dos anos 50 pela antiga editora Globo (antes sediada em Porto Alegre), havia sido feita em dez mãos (e que mãos!). O poeta Mario Quintana traduzira "No Caminho de Swann", "À Sombra das Raparigas em Flor", "O Caminho de Guermantes" e "Sodoma e Gomorra", para só então passar a bola. O quinto volume, "A Prisioneira", ficou a cargo de Manuel Bandeira em parceria com Lourdes Sousa de Alencar. Carlos Drummond de Andrade, com "A Fugitiva", e Lúcia Miguel Pereira, com "O Tempo Redescoberto", completaram a empreitada da primeira versão nacional. Desde então, mesmo 15 anos depois que os direitos autorais da obra caíram em domínio público, a única tradução foi a de Py, o único até aqui a fazer o trabalho todo. Se a primeira tradução ganha em prestígio (e no estofo literário dos tradutores, que vez ou outra vem à tona), o trabalho do poeta carioca, que já traduziu mais de 30 livros -incluindo o inacabado romance proustiano "Jean Santeuil" e a grande biografia do autor, de Georges Painter- tem algumas vantagens. Proust morreu antes de concluir a publicação da obra, e não chegou a fazer a revisão final nem dos livros que editou em vida. A primeira edição crítica saiu na França em 1954. Py usou a que, na época em que traduziu pela primeira vez a "Recherche", era considerada a versão definitiva, a feita em 1987 pela Gallimard. As mudanças promovidas pelo tradutor da Ediouro são visíveis já nos títulos. Como anotou o articulista da Folha Arthur Nestrovski, em texto sobre a primeira edição de Py, de 1992, foi feliz "a decisão de abandonar a lusitana "Sombra das Raparigas" pela sombra mais brasileira das "Moças em Flor'" -em referência ao novo nome do segundo volume: "À Sombra das Moças em Flor". "O Tempo Redescoberto", outro exemplo, virou "O Tempo Recuperado". Os sete volumes foram distribuídos no modelo 3-2-3. Os três primeiros livros no volume 1, os dois seguintes no 2 e assim por diante. Ensaísmo sobre Proust Além do lançamento da Ediouro, o proustianismo brasileiro também tem novidade na área ensaística. A coleção Ensaios Transversais, da editora Escrituras, lançou recentemente o livro "O Desconcerto do Mundo", de Carlos Felipe Moisés. No trabalho, o ensaísta, poeta e tradutor faz, em um dos 16 ensaios do livro, uma reflexão crítica sobre o livro de estreia de Proust, "Les Plaisirs et les Jours" (Os Prazeres e os Dias), que o escritor lançou em 1896, aos 25 anos, e que até hoje não ganhou tradução no Brasil. É aguardar. EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO De: Marcel Proust Tradução: Fernando Py Editora: Ediouro (caixa com os três volumes, totalizando 2.444 páginas) “Entendendo Proust” e “Em Busca do Tempo Perdido” CARLOS RUSSO JR. Resenha “ENTENDENDO PROUST” é um trabalho inovador, voltado a facilitar a leitura daqueles que desejam iniciar-se em Proust, assim como fornecer bases para discussão de determinados temas centrais da obra, justamente quando comemoramos cem anos da edição de “A Caminho de Swann”, o primeiro volume de “Em Busca do Tempo Perdido”. Prefácio- Dedicado a traçar o panorama do livro, principia contando de que maneira tornei-me um leitor de Proust, após diversas tentativas interrompidas nas primeiras páginas de “A Caminho de Swann”. As trilhas que desbravei para decodificar uma leitura inicialmente difícil, lenta, que é parte do próprio estilo proustiano. Traçamos a identificação de “Em Busca do Tempo Perdido” com o Impressionismo, que, a partir da pintura, forneceu a base para o desenvolvimento da música de um Debussy, assim como para escritores como Proust. Uma nova forma de simbolizar os homens e a natureza – a partir da percepção causada no seu autor. Proust, que tinha a convicção da transitoriedade das associações entre os homens, de suas personalidades, das intermitências de nossos corações, lançou mão desta técnica que lhe permitia descrever ou rememorar justamente os instantâneos a serem figurados por meio da escrita, dentro de um universo físico e psicológico sempre em mudança. Convido os leitores a penetrar no universo deste escritor único, detentor de uma sensibilidade refinada, de erudição e memórias privilegiadas e que possuiu o dom de transformar seu romance numa verdadeira epopeia da alma, velejando pelos mais diversos oceanos da existência, mesmo porque, por todos eles, Proust navega. Um Proust que é um subversivo, um revoltado, possuidor de um perigoso gênio cômico, e ele o emprega para destruir, uma a uma, todas as máximas e preconceitos sociais de seu tempo e que, em seu cerne, são os mesmos que a humanidade, cem anos após, ainda os encarna, talvez sob a forma de avatares. Para o desenvolvimento da trama, criei um personagem, André Jammes, um misto de repórter e crítico literário. Ele estabelece um processo de “entrevistas” com Proust, cujo objetivo é facilitar o caminho para que os futuros leitores de “Em Busca do Tempo Perdido” remetam-se à obra original e tornem-se “leitores de si mesmos”. Importa ressaltar que meu personagem busca, com todo o denodo expor a “essência” dos conceitos proustianos. Ou seja, Proust fala por si e pela boca de André, que também emite conceitos, implicitamente buscando a contemporaneidade do cerne de “Em Busca do Tempo Perdido”. Nosso trabalho foi subdividido em oito capítulos. Os três primeiros são dedicados ao plano geral da obra, em que são definidos os principais atores, suas ações e os panoramas do romance. Os capítulos seguintes apresentam temáticas específicas. Capítulo I- “Um Romance Circular”- A relação entre André Jammes e Proust é desenvolvida e uma introdução geral ao “Tempo Perdido” assim como ao “Tempo Recuperado” é realizada; busca-se esclarecer os novos leitores a respeito do estilo proustiano e da modernidade de um romance de novo tipo, um romance semi-autobiográfico, onde o passado é rememorado a partir de impulsos do inconsciente, num tempo que é, não somente uma seta a indicar o futuro, mas também circular, próprio da inserção do homem na “psicologia do tempo”. Capítulo II- “Personagens e os Alicerces de uma Catedral”- Muitos leitores se decepcionam num primeiro contato com “Em Busca do Tempo Perdido” porque estão acostumados a buscar na leitura tradicional a lógica de cada personagem. Acontece que em Proust, as personagens preservam, sim, uma lógica, mas ela é interna, um fio condutor de sua psiquê, dentro da “multiplicidade de seus eus”. Os principais personagens do conjunto da obra são apresentados ao leitor, com as suas máscaras sociais, diferentes e múltiplas, suas “personnas” se transformam no decorrer do Tempo. As ações se encadeiam em complexas redes planejadas e construídas numa obra de imenso fôlego, com a precisão e rigor arquitetural, tais quais os necessários para o erguimento de uma catedral gótica. Capítulo III- “Ambientação e Crítica Social”- Proust vivenciou tanto o clima de decadência do “fin-de- siècle” quanto o da “belle époque”, e o seu romance insere-se nessas diferentes conjunturas. Na economia, as crises cíclicas do capitalismo deram a tônica das décadas finais do século XIX. O momento histórico que marca a ascensão social de uma burguesia arrivista e parasitária é fruto das conquistas coloniais e da supremacia do capital financeiro sobre a produção, em que também uma aristocracia decadente, que perdera seus feudos, luta pela sua absorção social. Coincidindo com as grandes descobertas científicas e com inovações tecnológicas, que propiciaram mudanças revolucionárias nos mais diferentes aspectos da vida humana, um novo ciclo de expansão e desenvolvimento ocorreria na transição para o século XX. Na política e nas relações sociais, o sentimento geral não acompanhou a euforia das descobertas. Proust viveu nessas épocas de transição e crise em que os homens sentem a falta do ar e têm pressa em alcançar uma saída. A ansiedade é permanente e esse clima terá seu reflexo tanto na filosofia quanto nas artes. Dentro desse ambiente em que os conflitos se arrastam, surgem lado a lado a intolerância racial, a luta por novas conquistas coloniais; o patriotismo, o militarismo; as divisões da sociedade em ideologias que cada vez mais determinam atitudes. Até que se desemboca na grande hecatombe que foi a Primeira Guerra Mundial. Dentro desse panorama geral foi escrito “Em Busca do Tempo Perdido” e em todas essas questões Proust procura, não nos grandes movimentos sociais, mas dentro dos seres humanos, no mais profundo da alma, respostas e “verdades”. Capítulos temáticos: Capítulo IV- “A Vida e a Morte”- O que é a adolescência? quando termina? quando se transforma em juventude? Essas fases da vida são sempre repletas de ambiguidades e disfarces. Quando é mesmo que nos metamorfoseamos em adultos? É tão curta essa radiosa manhã, em que também o sexo é descoberto. Atingiremos a maturidade quando o Tempo desenvolve todo o seu poder de conduzir nossos corpos e espíritos à decadência, que se instala em nós sorrateira e lentamente. As relações amorosas com o passar do tempo, sob a crisálida de dores e carinhos, tornam invisíveis ao amante as piores metamorfoses da criatura amada, o quanto aquele corpo teve tempo de envelhecer e mudar. Quando, finalmente, a maturidade é conscientemente aceita, tem como resultado tornar a maioria das pessoas menos exigentes. A morte, somente quando nos é próxima, assume sua realidade. De certa forma, nossos mortos continuam vivendo em nós. Nesse culto da dor por nossos mortos, votamos uma idolatria ao que eles amaram, mas a morte de quem se ama é muito complicada, pois significa a morte de cada uma das diferentes personalidades assumidas dentro de nós mesmos. Por outro lado, somente a morte, ao romper todas as nossa ligações com a vida e as coisas, é a única capaz de nos curar do desejo eterno e onipresente de imortalidade, portanto, oferece-nos a total liberdade, que é a própria morte. Capítulo V- “Os Sonhos, os Múltiplos “Eus” e seus sentires- Proust estudou como ninguém até então o fizera os estados de sono, dos sonhos e de vigília, assim como a dissociação dos estados da alma e a multiplicidade de nossas personalidades, e, logicamente dos seus mutáveis sentires. “Em Busca do Tempo Perdido” assemelha a vida a um sonho e este à própria vida. A leitura do livro nos enleva, somos possuídos pela sensação de caminharmos lentamente através das clareiras de uma floresta encantada. Um sonhar caminhando, dessas espécies de viagens das quais demoramos como que uma eternidade para nos livrar e conseguir despertar; quando retornamos ao mundo real, damo-nos conta de que o sonho ainda não terminou, pois nosso universo, tal qual um sonho, segue dentro de nós. “Em Busca do Tempo Perdido”, ao lado da memória involuntária de que é tecido, traz a marca indelével dos sonhos e dos pesadelos de seu Narrador, e, por que não, de seu criador. A dissociação, essa multiplicidade dos “eus “de um indivíduo, para Proust não é apenas um fenômeno normal da personalidade, mas fundamental da vida dos seres humanos. Capítulo VI – “As Insatisfações do Amor”- Os personagens proustianos são arrastados por um torvelinho de paixões, veladas ou declaradas. Paixões em que o amor se manifesta nas suas diferentes formas, muitas vezes apenas platônica, outras, com os prazeres do sexo. No mundo proustiano, o amor que sentimos por uma pessoa é quase que uma obra exclusiva nossa. O acaso nos faz encontrar uma pessoa que espelhará esse afeto e cuja personalidade se moldará ao nosso amor; mas esse processo ocorre exclusivamente em nosso próprio espírito. Na impossibilidade de o amor ser compartilhado, comportamo-nos como Narciso e amamos a ninfa Ecco, fruto de nosso próprio ego. O ciúme, decorrente da posse ou do desejo da posse, com as torturas e aflições com que Proust concebe seus personagens, funciona como uma ideia fixa, conduzindo o amante a procurar mentiras e traições em quaisquer atitudes, tornando o amor um sofrer poucas vezes apaziguado. Os personagens são confinados em mundos solitários, onde as paixões sempre se transformam em tormentos, em um inferno em que só se é capaz de amar o que não se possui ou o que se teme perder. A paz somente pode ser alcançada no esquecimento e no sonho, ou na fuga para novos amores em que os ciclos serão recriados. Capítulo VII- “As Diferentes Facetas do Sexo”- No sexo não existe nenhuma moral a ser seguida e os comportamentos humanos são moldados pelas paixões e pelos padrões sociais. O escritor, dentro de sua extrema perspicácia, explicita os preconceitos e atitudes ligadas ao sexo, abandonando a hipocrisia social. Os personagens proustianos expõem suas facetas sexuais como algumas plantas que sagazmente abrem seus órgãos genitais aos insetos polinizadores, sem pudor, sem vergonha, mas com receio da punição. O homossexualismo se cercava de disfarces, revestia-se de diversas formas e engendrava culpas. A temática, que se inicia pelas cocotes e pelas prostitutas de bordel, caminha para o homossexualismo masculino e feminino, tanto para aqueles que navegam na bissexualidade, quanto para os outros, cuja prática homoafetiva é quase que um sacerdócio. Proust não exclui de seu romance a prática do sadomasoquismo e ele o faz, quer como uma forma de prazer “vicioso”, quer como recurso estético melodramático. Capítulo VIII- “O Tempo, a Memória e o Processo Criativo- Essa temática representa o alfa e o ômega da obra proustiana. Trataremos do Tempo, das transformações que seu decorrer provoca nos corpos e nas mentes das pessoas, assim como em todos os objetos que sejam frutos do homem ou da natureza. O Espírito que, reagindo às destruições que o Tempo produz, busca esconderijos nos templos do Inconsciente e lá deposita, como reminiscências vivas, parcelas do tempo vivido. Proust diferencia dois compartimentos distintos da Memória. Aquele que nos traz, através da inteligência, figuras estáticas do passado, tal qual um álbum de fotografias; um outro, a Memória Involuntária em que as lembranças guardadas no subconsciente podem ser recuperadas. Um processo de reviver, no presente, como frutos do acaso, sensações que trazem impressões vividas no passado, um fio condutor da “psicologia do tempo” e da “psicologia do espírito” de Proust. Essa temática sintetiza uma obra de arte que possui a lógica do inconsciente e encontra sua melhor expressão dentro da linguagem própria dos símbolo.

LITERATURA IRLANDESA - JAMES JOYCE

JAMES JOYCE – (1882-1941)
JAMES JOYCE – (1882-1941)
Foi um extraordinário contista, romancista e poeta irlandês. Teve profunda influência na literatura do mundo inteiro.

OBRAS:
POESIA: Música de Câmera (1907);
CONTOS: Dublinenses (1914);
ROMANCES: Retrato do Artista Quando Jovem (1916);
Ulisses (1922);
Finnegans Wake (1939).
Joyce viveu grande parte de sua vida fora da Irlanda, mas foi sua experiência irlandesa que ficou marcada em todos os seus livros. Seus contos, já pelo título, contêm as marcas que a capital irlandesa e seus costumes deixaram na alma do autor. Refletem as saudades e mágoas que trazia da própria pátria.
Teve uma vida bastante atribulado. Primeiramente foi a falência financeira do pai, importante homem de comércio. Depois, foi a morte da mãe, ocasião em que teve de abandonar o curso de medicina que fazia em Paris.
Juntou-se com Nora Barnacle, que foi sua companheira pelo resto de seus anos. O casal foge para a Áustria-Hungria, fixando-se primeiramente onde hoje é a Croácia e depois transferindo-se para o Triste, região que atualmente pertence à Itália. Dedica-se, nesse período ao ensino de língua inglesa. É nessa época que começa o importante trabalho de sua carreira literária.
No final da primeira grande guerra mundial, muda-se primeiro para Zurique e depois para Paris. No período em que vivia na Suiça aparece-lhe uma doença nos olhos, iridite, doença ocular que consiste basicamente em inflamação da Iris. Em Paris, conclui suas obras mais importantes: Ulisses e Finnegans Wake.
ULISSES (comentários) – maravilhoso romance em que toda a ação se passa em um único dia, o dia 16 de junho de 1904. Foi um marco do modernismo inglês. É uma espécie de fluxo de consciência do autor, repleto de paródias, de chistes na apresentação das personagens. Joyce trabalhou nessa obra entre os anos de 1914 e 1921. Começou a narrativa no Trieste, continuou em Zurique e concluiu-a em Paris.
O autor toma como base a Odisseia de Homero. O Odisseu grego é rei da lendária Ítaca, sua esposa é Penélope e seu filho chama-se Telêmaco. Ulisses (Odisseu) é Leopold Boom, Penélope é Molly Bloom e Stephen Dedalus, filho do casal irlandês é Telêmaco. Os dez anos do herói grego, reduzem-se a 18 horas de Leopold, das 8h da manhã do dia 16 de junho de 1904 às 2h da madrugada do dia seguinte. São 18 capítulos, um para cada hora do percurso histórico dessa odisseia, enquanto a narrativa épica grega tem 24 capítulos.
A obra de Joyce é uma rica paródia da Odisseia do magnífico poeta grego clássico do século IX a. C, Homero. Leopold Bloom é um agente publicitário da cidade de Dublin, capital da Irlanda. Para o narrador irlandês, o que mais interessa são os conflitos psicológicos das personagens. Embora mantenham alguma semelhança, as personagens de Joyce diferenciam-se substancialmente das de Homero.
Ulisses é um rei. Leopold Bloom é um protótipo do homem da classe média de Dublin. Joyce descreve-o como um desajeitado, chegando mesmo a ser engraçado, no entanto é homem reflexivo e coloquial. Penélope é a própria imagem da mulher inquebrantavelmente fiel, Molly Bloom é uma mulher adúltera. Telêmaco é um jovem príncipe herdeiro do trono que parte pelo mundo à procura do pai. Stephen Dedalus é um jovem erudito.
No romance de Joyce, é Leopold que procura o filho Stephen Dedalus, enquanto Molly trai o marido. Portanto, não há uma paráfrase de Homero, mas uma subversão do sentido da obra original. Muda-se o cenário: na Grécia, trata-se da família da corte real; na Irlanda, a família comum da classe média, em que ocorrem mesmo as traições femininas.
FINNEGANS WAKE (comentários) – precioso romance de James Joyce, também sua última obra, publicado em 1939. Trata-se agora de romance experimental. É tremendamente difícil de ser traduzido. O próprio autor despendeu 17 anos de trabalho para realizar esta obra.
Nesse romance, o autor trabalha com o sonho em seus extremos limites e mesmo com a loucura e o delírio. O livro não se funda na lógica humana. O autor trabalha com as palavras e os trocadilhos. Isso é uma tortura para os tradutores, pois não usa os trocadilhos comuns da linguagem. Pelo contrário, cria trocadilhos novos todo instante.
O leitor tem de aprender com o autor a criar sentidos. Emprega relações cruzando idiomas, mais de oito idiomas diferentes. Isso instiga o leitor a procurar leituras novas, sempre novas do mesmo texto. Emprega uma linguagem em que os signos não apontam para o mundo. Fragmenta os signos, que reordenados constroem sempre novas possibilidades de sentidos, nunca únicos. São verdadeiros feixes de possibilidades, que, nas traduções multiplicam-se ainda mais, a partir dos novos signos selecionados pelo tradutor, num processo interminável.
As personagens se fundem e se confundem entre elas e com a própria paisagem. Expandem-se as personagens até tornarem-se a humanidade toda.
O entrecho parece girar em torno de um crime de natureza sexual e incestuosa. O criminoso é julgado, condenado, morto, enterrado e ressuscita. Mas essa ressurreição se dá através de seu filho bom, que toma seu lugar.
Há cenas de desejo incestuoso de irmãos pela irmã. A ma, ao envelhecer é abandonada. A narrativa assemelha-se a um discurso bêbado em que se misturam à batalha de Waterloo, discussões filosóficas, narrativas históricas, muitas piadas, passagens bíblicas, invocações muçulmanas a Alá, e textos literários, sem que haja lógica temporal alguma.
Parece um eterno retorno de loucuras em que as personagens parecem evocar a tipos mutantes que apelam a argumentos filosóficos que podem ser sempre mudados em outros com que o leitor pode estabelecer novas leituras e interpretações sempre inusitadas. Ninguém nunca pode dizer desta obra que a leitura é esta ou aquela.

OBRAS:
POESIA: Música de Câmera (1907);
CONTOS: Dublinenses (1914);
ROMANCES: Retrato do Artista Quando Jovem;
(Ulisses (1922);
Finnegans Wake (1939). 
 

GABRIEL GARCIA MÁRQUEZ – O INVENTOR DE NOTÍCIAS - HOMENAGEM PÓSTUMA A NOSSO ILUSTRE NARRADOR LATINO-AMERICANO 

 

      Garcia Márquez, por longos anos, trabalhou como jornalista. Amava as reportagens. Se não encontrasse algo interessante em uma comunidade para narrar aos leitores inventava, criava.
         Conta-se que fora enviado, em 1954, pelo jornal El Espectador em que trabalhava para cobrir um grande protesto em um pequeno lugarejo distante da capital chamado Quibdó, na província de Chocó, em plena floresta colombiana.
         Ao chegar ao local, descobre que haviam sido apenas boatos. Organiza então, em combinação com um jornalista do local, uma encenação de protestos. Criam cenas de revolta e de protestos.
         Envia para seu jornal fotografias de desfiles que teriam ocorrido por treze dias consecutivos sob chuva torrencial. Assim, em muitas ocasiões, inventa notícias de fatos jamais ocorridos.
         Por outro lado, quando o fato a ser noticiado carecia de interesse, exagerava para que a notícia fosse relevante.
         Conta-se que, em 1848, publica na sua coluna no jornal em que trabalhava uma série de comentários sobre César Guerra Valdés, que afirma ser um promissor poeta desconhecido em sua terra natal, que teria uma contribuição relevante na literatura latino-americana. Ocorre que nunca existiu nenhum poeta César Valdés.

         Essa espécie de brincadeira de muitos jornalistas com seus leitores, que esperam sempre fatos espetaculares, é mais comum do que se pensa, em quase todo o mundo. Está sendo mesmo objeto de teses de doutorado. O leitor não se contenta com os fatos da vida banal. Então, o jornalista inventa detalhes fortes para alimentar essa curiosidade




 FRIEDRICH VON SCHILLER

      Johan Christoph Fiedrich von Shiller foi um poeta, dramaturgo e filósofo alemão, nascido em Marbach, no dia 10 de Novembro do ano de 1759. Era filho de um cirurgião militar.
                Começa seus estudos pela Faculdade de Direito que troca pelo curso de Medicina, em 1775. Durante esse período alimenta sua paixão pela literatura, lendo clássicos como Plutarco e Shakespeare, os poemas do crítico literário Klopstock, além de Goethe, Lessing, Kant e dos iluministas Voltaire e Rousseau. Também nessa época Schiller se fascina com o movimento Sturm und Drang, do qual será representante, tal como seu amigo Goethe. É durante esse período na Faculdade de Medicina que Schiller escreve sua peça Os Bandoleiros (Die Räuber).
                Viveu em várias cidades alemãs, período em que fez amizade com Herder, Schlegel, Wieland e Goethe, todos eles representantes do romantismo alemão e classicismo, e exerceu a cátedra de História da Universidade de Jena, a partir de 1799. 
                Destacou-se com trabalhos como: «Ensaio sobre a relação entre o animal e a natureza espiritual do homem» em 1785, «O teatro como uma instituição moral» em 1785, «A arte trágica» em 1791, «Pela graça e dignidade» em 1793, «Sobre o sublime» em 1793, «Cartas sobre a Educação Estética do Homem» em 1795 e «Da poesia ingênua e sentimental», em 1796. 
                Dedicou-se basicamente à dramaturgia, produzindo grandes peças teatro. Suas principais peças de teatro foram:
Os Bandoleiros (1781) Die Räuber
A Conjura de Fiesco (1782) Die Verschwörung des Fiesco zu Genua
Intriga e Amor (1783) Kabale und Liebe
Don Carlos (1787/88) Don Karlos
Maria Stuart (1800)
Turandot (1801)
A Donzela de Orleans (1801) Die Jungfrau von Orleans 
A Noiva de Messina (1803) Die Braut von Messina
Guilherme Tell (1803/4) Wilhelm Tell 
                Foi também importante poeta. Escreveu famosos poemas como:
Os Artistas (1788)
Deuses da Grécia (1788) Die Götter Griechenlands
Ode à Alegria (1785) Ode an die Freude
O Ideal e a vida (1795)
Xênias (em parceria com Goethe – 1797)
A Luva (1797)
O Canto do Sino (1799) Das Lied von der Glocke
                Dedicou-se também à filosofia. Escreveu os seguintes textos nessa área:
Cartas Filosóficas (1786)
Da Arte Trágica (1792)
Cartas de Augustenburg (1793)
Sobre a Graça e Dignidade (1793)
Do Patético (1793)
Do Sublime (1793)
Kalias ou Sobre a Beleza ( publicado postumamente, 1847)
Cartas sobre a Educação Estética do Homem (1795) Über die ästhetische Erziehung des Menschen
Poesia Ingênua e Sentimental (1796) Über naive und sentimentalische Dichtung
                Tinha um apreço especial pela história que perpassa toda sua obra. Textos históricos:
História da Separação dos Países Baixos (1788)
História da Guerra dos Trinta Anos (incompleta)(1791-1793)
                Schiller foi um dos grandes homens de letras da Alemanha do século XVIII. Morreu em Weimar, na Alemanha,  a 9 de Maio de 1805.
Suas principais peças de teatro foram: Os Bandoleiros (1781) Die Räuber A Conjura de Fiesco (1782) Die Verschwörung des Fiesco zu Genua Intriga e Amor (1783) Kabale und Liebe Don Carlos (1787/88) Don Karlos Maria Stuart (1800) Turandot (1801) A Donzela de Orleans (1801) Die Jungfrau von Orleans A Noiva de Messina (1803) Die Braut von Messina Guilherme Tell (1803/4) Wilhelm Tell

Escreveu famosos poemas como: Os Artistas (1788) Deuses da Grécia (1788) Die Götter Griechenlands Ode à Alegria (1785) Ode an die Freude O Ideal e a vida (1795) Xênias (em parceria com Goethe – 1797) A Luva (1797) O Canto do Sino (1799) Das Lied von der Glocke
 
Dedicou-se também à filosofia. 
Escreveu os seguintes textos nessa área: Cartas Filosóficas (1786) Da Arte Trágica (1792) Cartas de Augustenburg (1793) Sobre a Graça e Dignidade (1793) Do Patético (1793) Do Sublime (1793) Kalias ou Sobre a Beleza ( publicado postumamente, 1847) Cartas sobre a Educação Estética do Homem (1795)
Über die ästhetische Erziehung des Menschen Poesia Ingênua e Sentimental (1796)
Über naive und sentimentalische Dichtung

Antologia:

Ode à Alegria

Ó, amigos, mudemos de tom!
Entoemos algo mais prazeroso
E mais alegre!
Alegria, formosa centelha divina,
Filha do Elíseo,
Ébrios de fogo entramos
Em teu santuário celeste!
Tua magia volta a unir
O que o costume rigorosamente dividiu.
Todos os homens se irmanam
Ali onde teu doce voo se detém.
Quem já conseguiu o maior tesouro
De ser o amigo de um amigo,
Quem já conquistou uma mulher amável
Rejubile-se conosco!
Sim, mesmo se alguém conquistar apenas uma alma,
Uma única em todo o mundo.
Mas aquele que falhou nisso
Que fique chorando sozinho!
Alegria bebem todos os seres
No seio da Natureza:
Todos os bons, todos os maus,
Seguem seu rastro de rosas.
Ela nos deu beijos e vinho e
Um amigo leal até a morte;
Deu força para a vida aos mais humildes
E ao querubim que se ergue diante de Deus!
Alegremente, como seus sóis voem
Através do esplêndido espaço celeste
Se expressem, irmãos, em seus caminhos,
Alegremente como o herói diante da vitória.
Abracem-se milhões!
Enviem este beijo para todo o mundo!
Irmãos, além do céu estrelado
Mora um Pai Amado.
Milhões, vocês estão ajoelhados diante Dele?
Mundo, você percebe seu Criador?
Procure-o mais acima do Céu estrelado!
Sobre as estrelas onde Ele mora!
An die Freude

O Freunde, nicht diese Töne!
Sondern laßt uns angenehmere
anstimmen und freudenvollere.
Freude! Freude!
Freude, schöner Götterfunken
Tochter aus Elysium,
Wir betreten feuertrunken,
Himmlische, dein Heiligtum!
Deine Zauber binden wieder
Was die Mode streng geteilt;
Alle Menschen werden Brüder,
Wo dein sanfter Flügel weilt.
Wem der große Wurf gelungen,
Eines Freundes Freund zu sein;
Wer ein holdes Weib errungen,
Mische seinen Jubel ein!
Ja, wer auch nur eine Seele
Sein nennt auf dem Erdenrund!
Und wer’s nie gekonnt, der stehle
Weinend sich aus diesem Bund!
Freude trinken alle Wesen
An den Brüsten der Natur;
Alle Guten, alle Bösen
Folgen ihrer Rosenspur.
Küsse gab sie uns und Reben,
Einen Freund, geprüft im Tod;
Wollust ward dem Wurm gegeben,
Und der Cherub steht vor Gott.
Froh, wie seine Sonnen fliegen
Durch des Himmels prächt’gen Plan,
Laufet, Brüder, eure Bahn,
Freudig, wie ein Held zum Siegen.
Seid umschlungen, Millionen!
Diesen Kuß der ganzen Welt!
Brüder, über’m Sternenzelt
Muß ein lieber Vater wohnen.
Ihr stürzt nieder, Millionen?
Ahnest du den Schöpfer, Welt?
Such’ ihn über’m Sternenzelt!
Über Sternen muß er wohnen.
PHANTASY -- TO LAURA

NAME, my Laura, name the whirl-compelling
Bodies to unite in one blest whole--
Name, my Laura, name the wondrous magic
By which Soul rejoins its kindred Soul!
See! it teaches yonder roving Planets
Round the sun to fly in endless race;
And as children play around their mother,
Checker'd circles round the orb to trace.
Every rolling star, by thirst tormented,
Drinks with joy its bright and golden rain--
Drinks refreshment from its fiery chalice,
As the limbs are nourish'd by the brain.
'Tis through Love that atom pairs with atom,
In a harmony eternal, sure;
And 'tis Love that links the spheres together--
Through her only, systems can endure.
Were she but effaced from Nature's clockwork,
Into dust would fly the mighty world;
O'er thy systems thou wouldst weep, great Newton,
When with giant force to Chaos hurl'd!
Blot the Goddess from the Spirit Order,
It would sink in death, and ne'er arise.
Were Love absent, spring would glad us never;
Were Love absent, none their God would prize!
What is that, which, when my Laura kisses,
Dyes my cheek with flames of purple hue,
Bids my bosom bound with swifter motion,
Like a fever wild my veins runs through?
Ev'ry nerve from out its barriers rises,
O'er its banks the blood begins to flow;
Body seeks to join itself to Body,
Spirits kindle in one blissful glow.
Powerful as in the dead creations
That eternal impulses obey,
O'er the web Arachnine-like of Nature,--
Living Nature,--Love exerts her sway.
Laura, see how Joyousness embraces
E'en the overflow of sorrows wild!
How e'en rigid desperation kindles
On the loving breast of Hope so mild.
Sisterly and blissful raptures softens
Gloomy Melancholy's fearful night,
And, deliver'd of its golden Children,
Lo, the eye pours forth its radiance bright!
Does not awful Sympathy rule over
E'en the realms that Evil calls its own?
For 'tis Hell our crimes are ever wooing,
While they bear a grudge 'gainst Heaven alone!
Shame, Repentance, pair Eumenides-like,
Weave round sin their fearful serpent-coils:
While around the eagle-wings of Greatness
Treach'rous danger winds its dreaded toils.
Ruin oft with Pride is wont to trifle,
Envy upon Fortune loves to cling;
On her brother, Death, with arms extended,
Lust, his sister, oft is wont to spring.
On the wings of Love the Future hastens
In the arms of ages past to lie;
And Saturnus, as he onwards speeds him,
Long hath sought his bride -- Eternity!
Soon Saturnus will his bride discover,--
So the mighty Oracle hath said;
Blazing Worlds will turn to marriage torches
When Eternity with Time shall wed!
Then a fairer, far more beauteous morning,
Laura, on our Love shall also shine,
Long as their blest bridal-night enduring:--
So rejoice thee, Laura -- Laura mine!
Die Pest, eine Fantasie

Gräßlich preisen Gottes Kraft
Pestilenzen würgende Seuchen,
Die mit der grausen Brüderschaft
Durchs öde Thal der Grabnacht schleichen.
Bang ergreifts das klopfende Herz,
Gichtrisch zuckt die starre Sehne,
Gräßlich lacht der Wahnsinn in das Angstgestöhne,
In heulende Triller ergeußt sich der Schmerz.
Raserei wälzt tobend sich im Bette –
Gift’ger Nebel wallt um ausgestorbne Städte
Menschen – hager – hohl und bleich –
Wimmeln in das finstre Reich.
Brütend liegt der Tod auf dumpfen Lüften,
Häuft sich Schäze in gestopften Grüften
LITERATURA BRASILEIRA – CRISTÓVÃO TEZZA  
   Cristóvão Tezza é basicamente um escritor paranaense embora tenha nascido em Santa Catarina, em Lajes, pois dede a infância reside em Curitiba. A capital do Paraná é o cenário da maioria de suas obras.
         Iniciou sua vida no teatro. É romancista e também doutor em Literatura Brasileira, com uma tese sobre a teoria de Mikhail Bakhtin. Trabalha como professor de Linguística na Universidade Federal do Paraná.
OBRAS:
Gran Circo das Américas, São Paulo, SP: Editora Brasiliense (1979)
A Cidade Inventada, Curitiba, PR: Coo Editora (1980) (contos)
O Terrorista Lírico, Curitiba, PR: Edições Criar (1981)
Ensaio da Paixão (1982)
Trapo, São Paulo, SP: Editora Brasiliense (1988)
Aventuras Provisórias, Porto Alegre, RS: Mercado Aberto (1989)
Juliano Pavollini, Rio de Janeiro, RJ: Editora Record (1989)
A Suavidade do Vento, Rio de Janeiro, RJ: Editora Record (1991)
O Fantasma da Infância, Rio de Janeiro, RJ: Editora Record (1994)
Uma Noite em Curitiba, Rio de Janeiro, RJ: Rocco (1995)
Tradução eslovena por Nina Kovič, Noč V Curitibi, Novo mesto: Goga (2011)
Breve Espaço entre a Cor e a Sombra (1998) - Prêmio Machado de Assis da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro
O Fotógrafo ("The Photograph"), Rio de Janeiro, RJ: Rocco (2004) - Prêmio Academia Brasileira de Letras 2005
O Filho Eterno, Rio de Janeiro, RJ : Editora Record (2007)

O Professor, Editora Record – lançamento em 02 de abril de 2014.
Livro sobre o envelhecimento, recém lançado.

TEXTO PUBLICADO ORIGINALMENTE EM 1994
Resenha Crítica
A CONSTRUÇÃO DE UM ESCRITOR
Prof. Rosse Marye Bernardi
Professora da Universidade Federal do Paraná
Em: Cristovão Tezza. Série Paranaenses, nº 5.
Curitiba: Ed. da UFPR, 1994. pp. 5-16
Eu sou um homem construído pelas histórias que escrevi.
Curitibano nascido em Lages-SC, podemos dizer que Cristovão Tezza se fez escritor por vontade, seguindo um projeto a tal ponto incorporado a sua personalidade que o próprio autor diz não conseguir imaginar a sua vida sem o ato de escrever.
Começou poeta - escreveu seu primeiro livro aos 13 anos e já nessa época, textos na mão, percorria a redação dos jornais, em busca de espaço para publicação. Os poemas do adolescente não ficaram (nem mesmo escondidos no baú da memória), mas restou a certeza do ser escritor, dado fundamental no desenvolvimento de sua personalidade. essencialmente literária.
Tezza foi um típico representante da geração dos anos 60 - uma geração que acreditava nos sonhos, desejava mudar o mundo e fazia opções por formas alternativas de vida. Em busca de caminhos, participou do Centro Capela de Artes Populares, dirigido por Wilson Rio Apa, cuja postura artística e ideológica influenciaria sua produção inicial. Em 68, integrado à comunidade, em Antomna, pequena cidade no litoral paranaense, Cristovão é oficializado como um dos autores teatrais do grupo, além dc desenvolver experiência como ator, diretor, contra-regra e iluminador. Monólogo do amanhã e Os confinados, peças de sua autoria, montadas pelo grupo, tiveram à época algum sucesso. Essa experiência teatral - propiciando a percepção da síntese, da visibilidade e domínio do diálogo - marcará para sempre a visão artística de Tezza.
Em 71, ele conclui seu primeiro romance - O papagaio que morreu de câncer. Seguem-se A televida e A máquina imprestável, todos impiedosamente destruídos. Nesta época, ainda, Cristovão escreve Sopa de legumes. uma brincadeira que carnavalizava a vida quase mitológica da comunidade - hippies, marginais, desocupados - que se agrupava sob a liderança de Rio Apa. Nesse texto, zelosa e afetivamente guardado, e cuja tônica maior era o riso, a crítica e a autocrítica, vamos encontrar o humor, marca registrada da sua narrativa. No tocante a seus personagem, Sopa de legumes é, de certa forma, a antecipação da incrível humanidade que povoará a obra madura de Cristovão Tezza.
A experiência comunitária é interrompida em dois momentos. Primeiro, em 1971. quando o canto da sereia o leva a uma frustrada tentativa de tornar-se oficial da Marinha Mercante. Já em 75, a intenção é estudar Letras em Coimbra. Como a Universidade está fechada - é a época da Revolução dos Cravos em Portugal - Cristovão se faz trabalhador clandestino na Alemanha e viaja pela Europa. A solidão o faz escrever e reescrever a maior parte dos contos de A cidade inventada.
Um ano depois, em 76, ei-lo novamente em Antonina, agora transformado em joalheiro - (a curiosidade pelos mecanismos delicados e precisos é análoga à paixão com que se debruçará, mais tarde, sobre o mecanismo das ações humanas) - dono de uma pequena joalheria de insuspeitado nome literário: "Cinco em ponto", homenagem ao poema de Lorca. Mas não consegue mais se reintegrar ao espírito da comunidade, ao seu sonho de reinventar lendas ancestrais. A literatura que ele precisa escrever não mais se enquadra nos limites do romantismo anárquico.
Já casado, parte para o Acre, onde vai ser professor de Cursinho e aluno do Curso de Letras. Ainda inseguro de seus meios expressivos, aventura-se novamente na linguagem romanesca, iniciando a escritura de Gran circo das Américas. No ano seguinte - 78 - atraca em Curitiba, matricula-se em sua velha Universidade e escreve poesias. Nesse ano tem o seu primeiro texto publicado. Trata-se de Os telhados de Coimbra, na antologia Assim escrevem os paranaenses. A essa época encanta-se com as ciências da linguagem. Na construção do artista este é um momento crucial. A vida já nutrira de aventuras e experiências a sua curiosidade e sensibilidade. Agora é a vez do conhecimento científico. Assim aprofunda teorias e conscientiza-se de técnicas antes apenas intuídas. É também o momento em que descobre que a prosa é a linguagem mais adequada à cristalização literária de sua visão de mundo. Sem medo de influências, transforma-se num devorador cada vez mais voraz de livros, ao mesmo tempo em que começa a produzir sistematicamente a sua própria literatura. Em 83, já tem publicados Gran Circo das Américas e A cidade inventada. O terrorista lírico, Ensaio da paixão e Trapo repousam na gaveta.
Apesar dos prêmios, para sobreviver, enquanto o sucesso não vem, decide-se pela vida acadêmica. Matricula-se no Curso de Pós-Graduação em Letras na UFSC. A tese, sobre a obra de Rio Apa, é a comprovação de que a arte pode conviver com a ciência, e é, ao mesmo tempo, a releitura do próprio passado. Eu acrescentaria - é também a superação do seu passado artístico.
Em 1986, contratado como Professor de Língua Portuguesa na UFPR - retorna a Curitiba. Desta vez para ficar e escrever a sua obra.

A OBRA EM CONSTRUÇÃO
Considero o ato de escrever uma aventura ética. Não posso entender nenhuma obra de arte que não tenha relação com todo o complexo sistema de valores que nos rodeiam.
A leitura atenta dos oito títulos já publicados por Cristovão Tezza surpreende uma obra que processa o adensamento dos temas e o amadurecimento dos meios expressivos de livro para livro. Para melhor evidenciar tal pressuposto, como fio condutor destes breves comentários críticos sobre sua obra, optamos pela cronologia da produção dos textos - que nem sempre corresponderá à cronologia das publicações.
Assim, A cidade inventada, que teve muitos de seus textos escritos nas andanças europeias do autor, é uma obra que sob alguns aspectos se diferencia de todas as demais. Primeiro, por ser um livro de contos - o que implica um tratamento específico da linguagem; segundo, porque o registro literário, acompanhando a atmosfera temática. privilegia o fantástico e o simbólico, a maneira de Borges, a quem aliás é dedicado Os sábios, a última e melhor parte do livro - que (fazendo a abertura de um dos seus mais frequentes temas) se debruça sobre a própria literatura.
Mas é na visão de mundo, na postura diante da civilização urbana e nos conceitos literários que mais percebemos o distanciamento entre este e os livros mais recentes. Aqui os contos funcionam como uma espécie de fragmentos organizados em torno de uma ideia central - a decadência de uma cultura desumana, com sua sofisticação vazia, sua arte degenerada, e um isolamento exacerbado que caminha para um inexorável fim. Em quase todos os textos há uma tentativa de fuga. As personagens correm por catacumbas, percorrem teatros vazios, dirigidos por estranhos guias - sempre mulheres - em busca de uma saída e uma liberdade que não se consegue encontrar.
A atmosfera e a ideologia deste livro, com sua apocalíptica visão dos aglomerados urbanos e sua implícita recusa de toda arte que não seja essencialmente popular, que não pretenda encontrar o homem enquanto arquétipo - tem tudo a ver com a experiência comunitária do jovem Cristovão na minúscula Antonina e com a sua contraface - a viagem por uma Europa ainda não refeita dos conflitos ideológicos urbanos da década de 60, e sua quase reedição na Revolução dos Cravos portuguesa. Produto de uma sensibilidade historicamente datada, implicando relações sócio-culturais específicas. a obra é a cristalização literária das revoltas e dos sonhos de um momento de uma geração. Daí a sua importância - e a força de suas ideias que tingirão ainda. de maneira desigual, outras obras - além da inegável qualidade de muitos contos (leia-se atentamente A obra, o fim, ou Memória, por exemplo), que mereceram o pertinente comentário critico de Milton José de Almeida:
Os contos de Tezza dão a impressão de ensaios para projetos mais profundos, como um músico que toca aquelas peças de praxe, que apesar de simples, mostram a qualidade do instrumentista. Esperamos que ele chegue a nos dar um concerto.(*)
Gran Circo das Américas, escrito entre 77 e 78, reflete uma alteração de postura ou pelo menos a tentativa consciente de alterar tecnicamente o tratamento dado ao assunto literário. Não mais contos, não mais fantásticas atmosferas, embora enquanto núcleo permaneça o tema do desajuste, da inadequação ao sistema. O olhar do autor-narrador, ainda desprovido dos recursos da argúcia e da ironia, despreza os personagens comuns e enfoca o ser que recusa enquadrar-se.
O circo, com toda a sua carga semântica e simbólica de aventuras, poesia e marginalização, é o espaço onde aporta o jovem Juliano para fugir à autoridade opressora do tio, velho juiz destituído de qualquer sensibilidade. É a história desta fuga, de uma perseguição sem trégua e da solidariedade da pequena troupe mambembe que Cristovão nos transmite nesta narrativa linear, bem estruturada e de fortes traços românticos, que privilegia o diálogo. Livro simples, de fácil leitura, caiu no agrado dos jovens. Esteticamente poderíamos dizer que nele o autor praticou exercícios literários, úteis para aprimorar a sua técnica, mas que pouco acrescentaram, a sua obra.
Desta fragilidade não se ressente O terrorista lírico, livro escrito em 1980 e publicado no ano seguinte. O texto, em primeira pessoa, apresenta a estrutura de um diário e é um mergulho na solidão humana e na incapacidade de relacionamento entre as pessoas, ao mesmo tempo que expõe a construção do texto, não como um mero exercício metalinguístico, mas como reflexão sobre as relações entre a vida e a arte.
Nesse livro. Cristovão já manipula com alguma segurança a distância entre a sua visão de mundo enquanto centro ideológico e a visão de mundo de um personagem narrador, no caso o terrorista Raul Vasques. E este distanciamento que permite ao leitor vislumbrar o olhar que vê outro olhar, a linguagem que comenta e refrata outra linguagem, criando a zona da ironia e do humor, porta aberta para a reflexão sobre a condição humana - que se constituirá numa das características mais importantes da obra de Tezza.
O Terrorista Lírico tem em comum com o livro anterior o tema da destruição da cidade - acontecimento totalmente inverossímil, mas que. submetido a um tratamento realista, dá ao texto uma configuração fantástica. Ainda marcado para um romantismo ideológico, o autor permite que seu personagem encontre uma saída. Destruída a cidade (símbolo de uma civilização apodrecida), Raul desce para o mar com a mulher e juntos vão reconstruir o mundo.
A esta época. Tezza produz com bastante rapidez. Em 81 já esta pronto o livro Ensaio da paixão, que inicialmente recebera o título de Devassa da paixão. Reciclando a concepção de Sopa de legumes, que não estabelecia distância entre a vida e o texto, esse novo romance é a recriação artística, ficcional, da experiência comunitária e das atividades de teatro popular que o autor viveu nas décadas de 60 e 70. Reatualizando e ritualizando a encenação da Paixão e carregando em algum momentos na linha do fantástico, o texto, à maneira do que se fazia à época em Alexandra, no Paraná, e depois em Florianópolis, dá ao mito conotações político-existenciais, pois o que se ensaiava ou encenava acaba sendo a própria vida dos participantes, simbolizando, na absurda batalha final, a luta de todos os homens contra a tirania e a opressão.
Na comunidade Tezza também encontrou, confessadamente, a matéria prima para seus personagens:
pessoas desvinculadas do sistema de produção ... marginais, hippies e desocupados em geral. Esse miolo parece que permaneceu na minha literatura como se essas pessoas reservassem o que há de melhor na espécie humana. Uma reserva de revolta.
É no Ensaio da paixão, pela sua própria marcação teatral, que vai aparecer o mais amplo painel desta humanidade, tão cara à sua visão de mundo e que estará presente em toda a sua obra. No entanto, fique claro ao leitor que as pessoas reais são apenas pontos de referência para o desenho das personagens, seres ficcionais com características sociais determinadas. Em Ensaio da paixão não temos protagonistas, mas personagens que se destacam pelas suas próprias possibilidades dramáticas como Pablo, Cisco, Toco e seu inseparável anjo, Miro, Edgar, Isaías e muitos outros. Há ainda e não poderia deixar de ser, para um autor que faz da literatura um dos seus mais constantes temas, um escritor, Antônio Donetti, que não consegue vencer os limites da própria pequenez. O texto, apesar de envolvente, dinâmico, se ressente do tamanho excessivo e ainda, a meu ver, mereceria um melhor tratamento narrativo. Mas é uma obra inegavelmente importante no universo ficcional de Tezza.
É a partir do romance Trapo, escrito em 82, que vai ocorrer o grande salto qualitativo de sua obra. E também o texto que vai abrir-lhe as portas da critica e do público: "Alguma coisa nova, realmente nova, na temática, no estilo e na criação dos personagens foi introduzida por Cristovão Tezza", saúda Wilson Martins. Na realidade, em termos formais, há aqui, nesta obra uma consciência da linguagem e um tal domínio das possibilidades da linguagem romanesca, que de repente se percebe que toda a produção anterior era o paciente preparo para este momento - provavelmente o do "concerto" de que falara o crítico Milton José de Almeida ao comentar A Cidade Inventada.
Apropriando-se de diferentes extratos da linguagem social - o do jovem poeta desajustado e o do velho professor aposentado - para citar apenas o contraponto dos discursos que constroem a narrativa, Cristovão trabalha com maestria, a alma de duas gerações antagônicas - dando a cada uma delas um grau de humanidade só alcançado pela boa literatura. Ou como observou Liliane Reales:
As vozes narrativas que conduzem o romance, a de Trapo e a do Professor Manuel - um viúvo solitário e de suspeita competência profissional a cujas mãos vão parar as caóticas páginas escritas por Trapo permitem ao autor um cativante exercício da fealdade, escrita numa linguagem oral despida de qualquer lance súbito de poesia e beleza. A emoção fica por conta das sutilezas, ou por conta do avesso.
A escritura de Cristovão Tezza sabe dar conta de muitas paixões, muitas razões e paradoxos. Nas palavras de Elisa C. de Quadros: "o velho professor passa a valorizar a vida quando espreitado pela morte do jovem". Poderíamos acrescentar - como a maioria dos homens, o Professor Manuel só vai saber de si a partir do que lhe contam os escritos de Trapo. Um bom mote para nossa própria reflexão.
Mas, se em relação à visão de mundo houve amadurecimento dos temas comuns às obras anteriores, Trapo é, no tocante à geografia romanesca. a descoberta do espaço ideal do romancista:
Cristovão Tezza escreve o romance da vida cotidiana da cidade moderna, organismo psicológico em estado de permanente fluidez, que sentimos sem poder definir (...) Estamos em Curitiba, mas a Curitiba de Cristovão Tezza não é mais a Curitiba de Dalton Trevisan.
Esta Curitiba a que o crítico se refere, tão ambígua que permite duas soberbas apreensões literárias, transcende evidentemente as simples referências espaciais, para se caracterizar como um olhar enviezado. um estado de espírito, uma atmosfera, uma maneira de ser. Em Cristovão, tudo isto condimentado por um humor tipicamente curitibano, que Wilson Martins diz ser "descontraído, cáustico e vingador". Enfim, o cenário ideal para os homens passearem os seus dramas.
O romance seguinte - Aventuras provisórias - nome definitivo para um texto que já fora provisoriamente Elogio do fracasso e Minha mãe e outras mulheres, é a consagração deste espaço, aparente paraíso de uma classe média a perseguir o conforto e a satisfação em infindáveis mudanças pelos bairros de Curitiba.
Mas Aventuras provisórias é principalmente uma bela e terrível história, suavizada por sarcástica ironia - e que faz reviver Pablo, personagem de Ensaio da paixão. Este recurso vai dar à obra como um todo, uma unidade e uma coesão prenhe de significados. Fiel a sua dolorosa humanidade, Cristovão focaliza seres inadequados, desajustados à engrenagem social, aqui colocados no limite entre o salvar-se ou o perder-se para sempre. Pablo se perde na busca da salvação - ele não consegue deter a Roda - o sistema, muito maior do que o seu sonho marginal. Depois do crime, ele pede ao amigo: "Você escreve, então? Assim já tenho outro projeto na vida: ler minha história".
E é este texto, em primeira pessoa, em que Cristovão se movimenta com extraordinária maestria, que vai iluminar as aproximações e diferenças entre os dois personagens. João, o narrador, é o indivíduo classe-média, rico, que se desencontra na vida e nas suas mulheres, sempre aquém ou além dos seus desejos, dai o fracasso íntimo, existencial - que se espelha pelo avesso na história do amigo Pablo:
Quem não veria em Pablo, o Puro, marginalizado em comunidades rurais, e dado a metafísicas contemplações, o "duplo" dum João pequeno-burguês, para quem tudo é "provisório' porque não consegue se fixar em nada, preso à mãe que execra, mas de quem não se libertou?
Entre ambos, a uni-os ainda mais em suas desesperanças a Roda, - o sistema, personagem e leitmotiv do texto, sempre presente e implacável, a vedar as saídas e esmagar todas as ilusões.
Juliano Pavollini, escrito entre 87 e 88 é o terceiro e provavelmente o mais elaborado livro da trilogia que o autor chamou "informal", referindo-se ainda aTrapo e Aventuras provisórias.
Apesar de aproximações temporais. espaciais e temáticas, encerrando uma espécie de ciclo que revisita a Curitiba dos anos 60 e 70, há nestas obras diferenças fundamentais quanto à linguagem, que bem ilustram o cuidado do autor em relação a este tópico. Partindo do pressuposto de que a "voz" de um personagem implica a sua própria substância humana e a sua própria individualidade - Cristovão tem primado pela elaboração de linguagens diferentes em cada livro, embora isto se evidencie mais claramente nas narrativas em primeira pessoa. onde o olhar que vê e conta o mundo apresenta-se marcado pelos elementos culturais e o universo de referências, evidentemente diversas de personagem para personagem.
Assim, por exemplo, a "voz" de Juliano é a "voz" da sua consciência social - somatória de todas as linguagens que constituíram a sua aprendizagem do mundo e que é comentada e refratada pelo autor de uma forma tão sutil que:
Parece que os personagens e não o autor possuem o controle do enredo. Passa-se do cacoete "proustiano" a um realismo "bukowskiano" ou a la Rubem Fonseca (o de Feliz ano novo,), como preferirem. O livro começa a ser freqüentado por palavrões e Juliano se multiplica: malandro, tímido, pervertido, inseguro, intelectual e virgem, tudo cabe na sua imagem.
Os mais diversos ingredientes romanescos cabem na escrita memorialística de Juliano. Adolescente rebelde. educado num bordel, onde se alimentara de livros de aventuras, para ele escrever é se construir enquanto verdade ou enquanto mentira desesperada maneira de estabelecer uma ponte afetiva com o outro:
A minha palavra é minha sedução - a cada capítulo estou mais próximo da liberdade, Clara tem poderes no presídio. Avanço dia-a-dia no labirinto da minha história, sempre dupla: o texto que ela lê não é este que eu escrevo. O texto que eu escrevo não é o que eu vivi, e aquele que eu vivi não é o que eu pensava, mas não importa - continuo correndo atrás de mim e esbarrando numa multidão de seres. E neles, só neles, que tenho algum esboço de medida. (Juliano Pavollini, p. 113).
Entre este velar-se e desvelar-se. o narrador vai compondo uma narrativa quase camaleônica que prende o leitor da primeira á última página e que deu à crítica a certeza de que já se está diante de um universo romanesco singular:
O leitmotiv de Cristovão Tezza é a solidão moral de seus protagonistas, seres cindidos entre a enormidade dos sonhos, maiores que toda uma vida, e a estreiteza do dia-a-dia, sucessão de trivialidades. O descompasso entre querer e poder, entre planejar e realizar ou entre pensar e dizer traduz-se em hediondas transgressões às normas éticas e sociais, a repelir os que se queriam próximos, a provocar o ódio quando se anseia por amor a trazer a guerra em lugar de paz.
Afirmações que cabem também ao último livro publicado por Tezza - A suavidade do vento, desenvolvido a partir de um projeto aprovado pela Fundação Vitae de Literatura, em 90, o que lhe valeu uma bolsa para escrevê-lo.
A obra gira em torno da implícita tese de que o indivíduo só existe a partir do olhar e da aprovação do outro ou dos outros - proposição que lembra as elocubrações machadianas de Teoria do Medalhão e O espelho e que nos diz da família de escritores a que Cristovão vai filiar-se, não como influência (pois escrever para ele é um processo de autoconhecimento) mas como aproximações estético/sociais que enformam visões de mundo afins, não idênticas.
O texto, em termos de procedimentos estruturais, expõe-se à maneira de uma peça dramática. Há um "Prólogo" em que um autor ficcional estaciona o seu velho ônibus, liberando figuras enfumaçadas que no "Primeiro Ato", no "Entretanto", e no "Segundo ato" ganham a consistência de atores dirigidos por um narrador que lhes comenta as ações e o desempenho. Finda a "peça", na última parte do texto - "Cortina", o autor reúne os "personagens atores" para que vão comentando a encenação até desaparecerem lentamente. Por trás de tudo, o verdadeiro autor Cristovão Tezza dá aos seus leitores uma bela lição do distanciamento ficcional, comentando e retratando com sofisticado humor os pontos de vista das personagens, que nada mais são do que possibilidades ou virtualidades nas suas mãos de criador.
Quanto ao drama encenado, nele temos um professor interiorano, Josilei Maria Matôzo, tímido e solitário até a patologia - e que sobrevive no seu quarto povoado de monstros, fazendo consultas aoI-Ching e lendo A paixão Segundo GH, de Clarice Lispector. Estas ações vicárias são complementadas com a lenta escritura de um livro - A suavidade do vento que, segundo sonha, irá redimi-lo e transformá-lo num outro homem. No entanto, a publicação do livro, mais uma entrevista que Matôzo (agora J. Mattoso) concede a uma revista, cheia de mentiras contadas por ele mesmo, criam uma série de equívocos que tornam impossível qualquer comunicação com os habitantes da aldeia. Súbito, ele se descobre o próprio livro e lhe vem a aguda consciência de que:
Só a negação de tudo, do livro, do nome, da matéria na revista, da diferença pode fazer com que (...) sobreviva a própria história. O sacrifício se torna inevitável e Matôzo opta por se enquadrar, por ser aquilo que esperavam dele (...).
Assim, no fechamento da amarga parábola. Matôzo renuncia a si mesmo, rendendo-se à constatação de que ele só tem existência real quando refletido no olhar do outro, que o legitima. A única saída que lhe resta, portanto, é sobreviver por caminhos destroçados.
A obra construída por Cristóvão até o presente momento já é suficiente para que o consideremos um escritor maduro, fiel a um projeto narrativo que se aprimora constantemente e que tem permitido aos leitores que viajam ao seu lado, investigar eticamente o homem - fim maior de toda literatura.
Escrevendo por prazer e necessidade, Cristóvão já tem no prelo o romance O fantasma de infância, a ser editado no segundo semestre de 94, pela Record. A obra que o autor adianta ser uma "narrativa dupla" trará de volta Juliano Pavollini, uma de suas mais belas criações. Mas acreditamos que o autor, como sua criatura, terá ainda muitas e boas "idéias na cabeça".

Curitiba, julho de 1993.

LITERATURA ALEMÃ - DEUTSCHE LITERATUR - BERTOLT BRECHT

POEMAS DE AMOR


Nunca te Amei Tanto

Nunca te amei tanto, ma soeur,
Como quando de ti parti naquele por-de-sol.
O bosque engoliu-me, o bosque azul, ma soeur,
Sobre que já pousavam as estrelas pálidas a oeste.

Não me ri nem um pouco, nada, ma soeur,
Eu que a brincar ia ao encontro dum destino escuro —
Enquanto os rostos já atrás de mim
Devagar empalideciam no anoitecer do bosque azul.

Tudo era belo naquele anoitecer único, ma soeur,
Nunca mais depois e nunca antes assim —
Verdade é: só me ficaram as grandes aves
Que ao anoitecer têm fome no céu escuro.

Bertold Brecht, in 'Do Pobre B.B.'


Ich habe dich nie je so geliebt

Ich habe dich nie je so geliebt, ma soeur
Als wie ich fortging von dir in jenem Abendrot.
Der Wald schluckte mich, der blaue Wald, ma soeur
Über dem immer schon die bleichen Gestirne im Westen standen.

Ich lachte kein klein wenig, gar nicht, ma soeur
Der ich spielend dunklem Schicksal entgegenging –
Während schon die Gesichter hinter mir
Langsam im Abend des blauen Walds verblaßten.

Alles war schön an diesem einzigen Abend, ma soeur
Nachher nie wieder und nie zuvor –
Freilich: mir blieben nur mehr die großen Vögel
Die abends im dunklen Himmel Hunger haben.


I never loved you more

I never loved you more, ma soeur
Than as I walked away from you that evening.
The forest swallowed me, the blue forest, ma soeur
The blue forest and above it pale stars in the west.

I did not laugh, not one little bit, ma soeur
As I playfully walked towards a dark fate –
While the faces behind me
Slowly paled in the evening of the blue forest.

Everything was grand that one night, ma soeur
Never thereafter and never before –
I admit it: I was left with nothing but the big birds
And their hungry cries in the dark evening sky.


BERTHOLT BRECHT
Eugen Berthold Friedrich Brecht nasceu em Augsburg, em dez de fevereiro de 1898 e faleceu em Berlim Leste em catorze de agosto de 1956. Foi um destacado dramaturgo, poeta e encenador alemão do século XX. Seus trabalhos artísticos e teóricos influenciaram profundamente o teatro contemporâneo, tornando-o mundialmente conhecido a partir das apresentações de sua companhia de teatro Berliner Ensemble realizadas em Paris durante os anos de 1954 e 1955.
Ao final dos anos 1920 Brecht torna-se marxista, vivendo o intenso período das mobilizações da República de Weimar, desenvolvendo o seu teatro épico. Sua práxis é uma síntese dos experimentos teatrais de Erwin Piscator e Vsevolod Emilevitch Meyerhold, do conceito de estranhamento do formalista russo Viktor Chklovski, do teatro chinês e do teatro experimental da Rússia soviética, entre os anos1917 e 1926. Seu trabalho como artista concentrou-se na crítica artística ao desenvolvimento das relações humanas no sistema capitalista.
Brecht nasceu no Estado Livre da Baviera, no extremo sul da Alemanha, estudou medicina e trabalhou como enfermeiro num hospital em Munique durante a Primeira Guerra Mundial. Era filho de Berthold Brecht, diretor de uma fábrica de papel, católico, exigente e autoritário, e de Sophie Brezing (em solteira),protestante, que fez seu filho ser batizado nesta igreja.
Suas primeiras peças, Baal (1918 e 1926) e Tambores na Noite (Trommeln in der Nacht) (1918 e 1920), foram encenadas na vizinha Munique. Em sua participação no teatro Brecht conhece o diretor de teatro e cinema Erich Engel, com quem veio a trabalhar até o fim da sua vida.
Depois da primeira grande guerra mudou-se para Berlim, onde o influente crítico, Herbert Ihering, chamou-lhe a atenção para a apetência do público pelo teatro moderno. Trabalha inicialmente com Erwin Piscator, famoso por suas cenas Piscator, como eram chamadas, cheias de projeções de filmes, cartazes, etc. Em Berlim, a peça Im Dickicht der Städte, protagonizada por Fritz Kortner e dirigida por Engel, tornou-se o seu primeiro sucesso.
O nazismo afirmava-se como a força renovadora que iria reerguer o país, pretendendo reviver o Sacro Império Romano Germânico. Mas, ao mesmo tempo, chegavam à Alemanha influências da recém formada União Soviética.
Com a escolha de Hitler para chanceler da Alemanha, em 1933, Brecht exila-se primeiro na Áustria, depois Suíça, Dinamarca, Finlândia, Suécia, Inglaterra, Rússia e finalmente nos Estados Unidos.
Seus textos e montagens o fizeram conhecido mundialmente. Brecht é um dos escritores fundamentais deste século: revolucionou a teoria e a prática da dramaturgia e da encenação, mudou completamente a função e o sentido social do teatro, usando-o como arma de consciencialização e politização.
Teve três filhos com Helene Weigel: Stefan Brecht, Barbara Brecht-Schall e Débora Destefani Brecht.


LITERATURA INGLESA - GRAHAM GREENE

Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara

GRAHAN GREENE
(1904-1991)
         O escritor britânico, falecido em 1991, reaparece na sena literária com a adaptação para o cinema de seu romance The and off the Affair, cujo título da tradução portuguesa é Fim de Caso.
Nasceu em 1904, na Inglaterra. Era tímido, sensível, e preferia a leitura aos esportes. Seu pai, diretor da escola onde estudava, o atormentava por isso, o que fez com que tentasse várias vezes se suicidar. Aos quinze anos de idade, após abandonar a escola, foi mandado para um psiquiatra, em Londres, que o incentivou a escrever. Estudou história contemporânea no Balliol College e, depois, foi para a universidade.
Lá conseguiu alguma experiência trabalhando como editor do Oxford Outlook e foi também onde passou a se interessar por política, depois de se filiar ao Partido Comunista, segundo ele mesmo, por diversão.
The and off the Affair trata-se de um livro em que você faz descobertas novas a cada leitura. Lançado em 1951, há alguns anos foi transformado em filme. Segundo alguns apreciadores desse tipo de literatura, é um dos melhores romances do século XX.
O livro é perpassado por um lirismo cético e melancólico, a fé ao mesmo tempo intensa e questionada em Deus, o humor doce e amargo. Maurice, o personagem central, é um escritor. Ele se apaixona por uma mulher casada, Sarah, e é correspondido. O detalhe é que Maurice era amigo do marido.
Como o título sugere, o livro trata do epílogo do romance. Sarah abandona Maurice e ele, atormentado de ciúme, desconfia que ela tenha optado por um novo amante. O que ele vai perceber só no fim é que esse novo amante chama-se Deus.
Tendo cursado a tradicional Universidade de Oxford, na juventude, Greene foi comunista sem convicção. Adulto, converteu-se ao Catolicismo. Mas seu Catolicismo nada tinha de convencional. Numa de suas autobiografias, ele conta uma passagem que mostra sua personalidade incomum: num período de tédio, ainda moço, Greene fez roleta russa. Uma bala num tambor de revólver que comporta seis, a sorte lançada. Nada aconteceu. Fez outras quatro vezes, ao correr dos dias. Nada. Mas decidiu dar uma última oportunidade à bala, para que ficasse empatado o jogo: seis a seis. Nada. E então ele tocou a vida. E construiu uma pirâmide literária.
Dedicou-se ao jornalismo. Durante a Segunda Guerra Mundial, foi correspondente de guerra. Trabalhou para o governo inglês chefiando um escritório em Serra Leoa. Essa estada na África forneceu-lhe tema para diversos romances.
Depois da publicação de "The Quiet American" (O americano tranquilo), o autor foi acusado de ser anti-americano. Sua vida pessoal também foi cheia de notoriedade: o sucesso financeiro depois da metade dos anos 60 permitiu que ele pudesse viver confortavelmente em Londres, Antibes e em Capri. Ele teve várias amantes e confessou ser "um péssimo marido" separou-se da mulher ainda em 1948, mas nunca se divorciou dela. Nos últimos anos de vida, viveu em Vevey, na Suiça, com Yvonne Cloetta.
PRINCIPAIS OBRAS: (Estes são alguns títulos que julguei importantes dentro da vastíssima obra do escritor inglês.)
O décimo homem
Expresso do Oriente
Fim de caso
O homem de muitos nomes
Nosso homem em Havana
O poder e a glória
O americano tranquilo
Reflexões
Um lobo solitário
O amante complacente
O coração da matéria
O galpão do jardim
O condenado
Os farsantes
O fator humano
Manual do espião
LITERATURA PERSA – OMAR KHAYYAM (1048-1131)
Foi um importante pensador, matemático e astrônomo iraniano. Foi o responsável pelo estudo astronômico do calendário persa, a serviço do sultão
Malik Shah I, da Anatólia. Embora seu cálculo tivesse uma margem de erro que resultaria um dia em 3770 anos, é considerado de grande precisão. É superior em precisão ao calendário Juliano implantado na antiga Roma por Júlio César.
No campo das matemáticas, mais especificamente na álgebra, desenvolveu um método para resolver as equações cúbicas pela intersecção de uma parábola com um círculo, que seria retomada posteriormente por René Descartes, no século XVII.
Quanto a filosofia, diferenciou-se dos dogmas islâmicos tradicionais. Admitia a existência de Deus, porém não acreditava que o ser superior interviesse nos fenômenos particulares. Defendia o princípio de que a natureza tem suas leis que são responsáveis por todos os fenômenos positivos observáveis.
O pensador persa nasceu Naishapur, ao norte da Pérsia. Tornou-se popular no ocidente a partir do século XIX quando Edward Fitzgerald, poeta irlandês, traduziu suas poesias para o inglês com o título de Rubayat, ou seja, estrofes de quatro versos.


OBRA:

RUBAYAT - O nome Rubayat significa simplesmente estrofe de quatro versos.

Noite, silêncio, folhas imóveis;
imóvel o meu pensamento
Onde estás, tu que me ofereceste a taça?
Hoje caiu a primeira pétala.

Eu sei, uma rosa não murcha
perto de quem tu agora sacias a sede;
mas sentes a falta do prazer que eu soube te dar,
e que te fez desfalecer.

Acorda... e olha como o sol em seu regresso
vai apagando as estrelas do campo da noite;
do mesmo modo ele vai desvanecer
as grandes luzes da soberba torre do Sultão.
Omar Khayam

-----------------------------------------------

Cristãos, judeus, muçulmanos, rezam,
com medo do inferno; mas se realmente soubessem
dos segredos de Deus, não iam plantar
as mesquinhas sementes do medo e da súplica.

O vasto mundo: um grão de areia no espaço.
A ciência dos homens: palavras. Os povos,
os animais, as flores dos sete climas: sombras.
O profundo resultado da tua meditação: nada.
**
Eu estava com sono e a Sabedoria me disse:
A rosa da felicidade não se abre para quem dorme;
por que te entregares a esse irmão da morte?
Bebe vinho; tens tantos séculos para dormir.
**
É inútil a tua aflição;
nada podes sobre o teu destino.
Se és prudente, toma o que tens à mão.
Amanhã... que sabes do amanhã?
**
Além da Terra, pelo Infinito
procurei, em vão, o Céu e o Inferno.
Depois uma voz me disse:
Céu e Inferno estão em ti.
**
Tenho igual desprezo por libertinos ou devotos.
Quem irá dizer se terão o Céu ou o Inferno?
Conheces alguém que visitou esses lugares?
E ainda queres encher o mar com pedras?
**
Como o rio, ou como o vento,
vão passando os dias.
Há dois dias que me são indiferentes:
O que foi ontem, o que virá amanhã.
**
Não me lembro do dia em que nasci;
não sei em que dia morrerei.
Vem, minha doce amiga, vamos beber desta taça
e esquecer a nossa incurável ignorância.
**
É inútil te afligires por teres pecado;
também é inútil a tua contrição:
além da morte estará o Nada,
ou a Misericórdia.

---------------------------

Admito que já resolveste o enigma da Criação;
e o teu destino? Aceito que desvendaste a Verdade;
e o teu destino? Está bem, viveste cem anos felizes
e ainda tens muitos para viver; e o teu destino?
**
Ninguém desvendará o Mistério. Nunca saberemos
o que se oculta por trás das aparências.
As nossas moradas são provisórias, menos aquela última.
Não vamos falar, toma o teu vinho.
**
Olha, um dia a alma deixará o teu corpo
e ficarás por trás do véu, entre o Universo
e o desconhecido. Enquanto não chega a hora,
procura ser feliz. Para onde irás depois?
**
Os sábios mais ilustres caminharam nas trevas da ignorância,
e eram os luminares do seu tempo.
O que fizeram? Balbuciaram algumas frases confusas,
e depois adormeceram, cansados.
**
O mundo gira, distraído dos cálculos dos sábios.
Renuncia à vaidade de contar os astros
e lembra-te: vais morrer, não sonharás mais,
e os vermes da terra cuidarão da tua carcaça.
**
Sono sobre a terra, sono debaixo da terra.
Sobre a terra, sob a terra: homens deitados.
Nada em toda a parte. Deserto.
Homens chegam, outros partem.
**
 The Rubaiyat of Omar Khayyam
Edward FitzGerald

Wake! For the Sun, who scatter’d into flight
The Stars before him from the Field of Night,
Drives Night along with them from Heav'n, and strikes
T'he Sultans Turret with a Shaft of Light.
2
Before the phantom of False morning died,
Methought a Voice within the Tavern cried,
"When all the Temple is prepared within,
"Why nods the drowsy Worshipper outside?"
3
And, as the Cock crew, those who stood before
The Tavern shouted-"Open then the Door!
"You know how little while we have to stay,
"And, once departed, may return no more."
4
Now the New Year reviving old Desires,
The thoughtful Soul to Solitude retires,
Where the WHITE HAND OF MOSES on the Bough
Puts out, and Jesus from the Ground suspires.
5
Iram indeed is gone with all his Rose,
And Jamshyd's Sev'n-ring'd Cup where no one knows;
But still a Ruby kindles in the Vine,
And many a Garden by the Water blows.
6
And David's Lips are lockt; but in divine
High-piping Pehlevi, with "Wine! Wine! Wine!
"Red Wine!"-the Nightingale cries to the Rose
That sallow cheek of hers to incarnadine.
7
Come, fill the Cup, and in the fire of Spring
Your Winter-garment of Repentance fling:
The Bird of Time has but a little way
To flutter-and the Bird is on the Wing.
8
Whether at Naishapur or Babylon,
Whether the Cup with sweet or bitter run,
The Wine of Life keeps oozing drop by drop,
The Leaves of Life keep falling one by one.
Omar Khayyam – Rubayat – version française
Extrait des quatrains

Aujourd'hui c'est le printemps de ma vie
je veux boire du vin , me ruer aux plaisirs
Ne me blâmez pas, même amer , il est exquis
Oui il est amer , parce qu'il est ma vie
I
Tout le monde sait que je n'ai jamais murmuré la moindre prière.
Tout le monde sait aussi que je n'ai jamais essayé de dissimuler mes défauts.
J'ignore s'il existe une Justice et une Miséricorde...
Cependant, j'ai confiance, car j'ai toujours été sincère.
II
Que vaut-il mieux ? S'asseoir dans une taverne,
puis faire son examen de conscience,
ou se prosterner dans une mosquée, l'âme close ?
Je ne me préoccupe pas de savoir si nous avons un Maître
et ce qu'il fera de moi, le cas échéant.
III
Considères avec indulgence les hommes qui s'enivrent.
Dis-toi que tu as d'autres défauts.
Si tu veux connaître la paix, la sérénité,
penche-toi sur les déshérités de la vie, sur les humbles
qui gémissent dans l'infortune, et tu te trouveras heureux.
IV
Fais en sorte que ton prochain n'ait pas à souffrir de ta sagesse.
Domine-toi toujours. Ne t'abandonne jamais à la colère.
Si tu veux t'acheminer vers la paix définitive,
souris au Destin qui te frappe, et ne frappe personne.
V
Puisque tu ignores ce que te réserve demain,
efforce-toi d'être heureux aujourd'hui.
Prends une cruche de vin, va t'asseoir au clair de lune,
et bois, en te disant que la lune te cherchera
peut-être vainement, demain.
VI
Le Coran, ce Livre suprême, les hommes le lisent quelquefois,
mais, qui donc s'en délecte chaque jour ?
Sur le bord de toutes les coupes pleines de vin est ciselée
une secrète maxime de sagesse bien délicieuse à savourer.
VIII
En ce monde, contente-toi d'avoir peu d'amis.
Ne cherche pas à rendre durable la sympathie que tu peux éprouver pour quelqu'un.
Avant de prendre la main d'un homme,
Demande-toi si elle ne te frappera pas, un jour.
IX
Autrefois, ce vase était un pauvre amant
Qui gémissait de l'indifférence d'une femme.
L'anse, au col du vase...
Son bras qui entourait le cou de la bien aimée !
X
Qu'il est vil, ce cœur qui ne sait pas aimer,
Qui ne peut s'enivrer d'amour !
Si tu n'aimes pas, comment peux-tu apprécier
L'aveuglante lumière du soleil et la douce clarté de la lune ?


Omar Khayyam – Rubayat – versione italiana
Da: Italo Pizzi, Storia della Poesia Persiana, U.T.E., Torino, 1894, 2 voll., 1° volume, pp. 280-286

I
Di tre cose il valor sanno le genti.
Valor di gioventù san gli attempati,
Valor di sanità sanno i malati,
Valor de le ricchezze gli indigenti.

II
Ho visto nel mercato un pentolaio,
Su fresca terra menar calci assai;
Quando la creta così disse: – Sai?
Un dì fui come te. Non trattar male.

III
Vezzi donasti, il core io ti donai;
In gaudio sei, per te nel duol son io;
Da me tu avesti amor, dolor n'ebbi io;
Tu violenza usasti, io sopportai.

IV
Partisti e mi restâr nel cor gli affanni,
Come al partir di carovana un fuoco.
Fugge dal cor ciò che sparia dagli occhi,
Ma tu agli occhi sparisti, in cor mi resti.

V
Ahimè! di gioventù s'è chiuso il libro
E cessò quest'allegra primavera.
Il gaio augel che ha nome giovinezza,
Ahi, non so donde venne e dov'è ito!

VI
Sempre la voglia mia si volge al vino,
Sempre l'orecchio ai flauti, alle ribebe *.
Quando col cener mio
Formerà un vaso, un giorno, il vaselliere,
Sempre colmo di vin resti quel vaso.

VII
Ber vino e allegro stare è mio costume;
Nulla pensar di dogmi e d'eresia
Religïone è mia.
Dissi alla vita: – La tua dote? – Ed ella:
– Mia dote è del tuo cuore l'allegria.

VIII
Da questa terra, che per alcun tempo
Ci fu dimora, non avemmo noi
Che sventura e dolore.
Ohimè! non fu disciolto un nodo solo!
Andammo, e qui restâr tanti sospiri,
Tanti, del nostro cuore!

IX
Poi che nessuno fa malleveria
Del giorno di domani, il core afflitto
Tu allieta in questo giorno.
Bevi del vino, o bella mia. La luna
Qui non ci troverà, dopo molt'anni,
Quando farà ritorno.

X
Sul giorno di doman nulla tu puoi;
Al giorno di doman senza fastidio
Pensar non puoi, né sai.
Se vigil core hai tu, non perder questo
Momento breve, ché non t'è ben noto
Quando ancor tu vivrai.

XI
Di tua felicità poiché la rosa
Oggi ti reca i frutti suoi, in mano
Perché un bicchier non hai?
Bevi del vin, ché ingannator nemico
È il tempo, e giorno aver simile a questo
malagevole è assai.

XII
Non ti pensar ch'io tema del destino,
ch'io tema del morir, del dì che l'alma
farà sua dipartita.
Poich'è morir necessità, di tanto
Non temo già, ma temo che non bene
Vissuto abbia la vita.

XIII
Poiché non vanno le faccende nostre
Come vorremmo noi,
Pensando stiamo a ciò: – L'intento nostro
A che ne verrà poi?
E lungamente sospirosi e mesti
A seder qui restiamo,
Dicendo: – Troppo tardi siam venuti,
Troppo presto ne andiamo.

XIV
Io sempre in lite sono con me stesso.
Che far dunque potrei?
Dell'opre da me fatte io son dolente.
Che far dunque potrei?
Penso che tu, Signor, perdonerai
Con generosa voglia;
Ma per l'onta che tu quello che ho fatto
Vegga, che far dovrei?

XV
Di questa terra sulla superficie,
Quanti dormenti io vedo!
E sotto il suolo della terra, oh quanti
Che son nascosti io vedo!
Gli occhi per quanto io volga a riguardare
Al deserto del nulla,
Non altro che partiti e non ancora
Venuti in terra io vedo!

XVI
Della mia vita questo breve tempo
Ecco è passato,
Passò qual vento che in deserto passa
Abbandonato.
Fin ch'io vivo sarò, sol di due giorni
Non vo' far cruccio;
Non di quel giorno che non anche venne,
Non del passato.


Sprüche. Spruchgedicht von Omar Khayyam
Das Kommen

Das Kommen, Gehen aller Menschen gleicht
Dem Anfang, der das Ende nicht erreicht.
Des Kreises Rätsel deutet nie der Mensch;
Er lebt, bis Gott ihn aus dem Buche streicht.

Das Rätsel dieser Welt

Das Rätsel dieser Welt löst werde du noch ich,
Jene geheime Schrift liest weder du noch ich, -
Wir wüßten bei gern, was jeder Schleier birgt,
Doch wenn der Schleier fällt, bist weder du noch ich.

Ein Käufer ging beglückt

Ein Käufer ging beglückt vom Töpferstand
Und trug den schwersten Topf in seiner Hand.
Den Freunden rief der große Topf noch zu:
"Ich kehr zurück mit! Er ist mein Pfand!"

Kein Mensch erklärt die Rätsel der Natur

Kein Mensch erklärt die Rätsel der Natur,
Kein Mensch setzt einen Schritt nur aus der Spur,
Die seine Art ihm vorschrieb, und es bleibt
Der größte Meister doch ein Lehrling nur.

Selig der Mann, dem Einsamkeit genug

Selig der Mann, dem Einsamkeit genug,
der niemals seidene Gewänder trug,
der wie ein Greif zum Himmel aufgeflogen,
satt wie die Eule sitzt in Lug und Trug.


OMAR KHAYYAM: LAS RUBAIYAT (extracto em espanhol)

Más allá de los límites de la Tierra,
más allá del límite Infinito,
buscaba yo el Cielo y el Infierno.
Pero una voz severa me advirtió: "El Cielo y el Infierno están en ti." Tuve grandes maestros. Llegué a estar orgulloso de mis progresos.
Cuando recuerdo que fui sabio,
me comparo a ese líquido que llena el vaso y toma su forma,
y a ese humo que el viento desvanece. Convéncete bien de esto:
un día, tu alma dejará el cuerpo
y serás arrastrado tras un velo fluctuante entre el mundo y lo incognoscible.
Mientras esperas, ¡se feliz! No sabes cuál es tu origen e ignoras cuál es tu destino.
Bebedor, jarro inmenso, ignoro quien te formó
Sólo sé que eres capaz de contener tres medidas de vino y que la muerte te quebrará un día.
Entonces dejaré de preguntarme por qué has sido creado.,
por qué has sido dichoso y por qué no eres más que polvo ¿Cuándo nací? ¿Cuándo moriré?
Nadie puede evocar el día de su nacimiento ni señalar el día de su muerte.
¡Ven a mí, ángel amada!
Quiero pedir a la embriaguez olvidar que nunca sabemos nada. ¡Señor, oh señor, contéstame!
Tú nos has dado ojos y permitido que la belleza de tus criaturas nos deslumbre.
Tú nos has otorgado la facultad de ser dichosos. ¿Quiseras que renunciáramos a gozar de los bienes de este mundo?
¡Pero si es tan imposible como invertir una copa sin derramar el vino que contiene!
Buscar la paz en este mundo es una locura.
Creer en el reposo eterno, también.
Después de muerto, breve será tu sueño:
renacerás en el césped que todos hollan o en la flor que el sol marchita.
Admitamos que hayas resuelto el enigma de la creación. ¿Cuál es tu destino?
Admitamos que hayas podido despojar de todos sus vestidos a la Verdad. ¿Cuál es tu destino?
Admitamos que hayas vivido cien años dichoso y que vayas a vivir otros cien más.. ¿Cuál es tu destino?
Los sabios y filósofos más ilustres han caminado entre las tinieblas de la ignorancia.
Sin embargo eran los luminares de su época.
¿Qué hicieron?
Pronunciaron algunas frases confusas y luego se durmieron.
Mi nacimiento no aportó el menor provecho al universo.
Mi muerte no disminuirá su inmensidad ni su esplendor.
nadie ha podido explicarme jamás por qué he venido,
ni por qué partiré.
¿Qué es el Mundo? Una parte pequeña del espacio
¿Qué es la ciencia? Palabras. ¿Y qué son las naciones,
las flores y las bestias? Sombras. ¿Y tus continuos,
tus inquietos cuidados? Sí lo nada en la nada.
Se nos da un breve instante para gustar del agua en este ardiente páramo.
Ya el astro de la noche palidece.
La vida va a llegar a su término: el alba de la Nada.
Vamos, pues, date prisa.
¡Actúa con prudencia, viajero! Peligroso es el camino que transitas
y afilada la daga del Destino.
No te hartes con las almendras dulces
Contienen veneno.
Procede de forma que tu prójimo no se siente humillado con tu sabiduría.
Domínate, domínate. Jamás te abandones a la ira.
Si quieres conquistar la paz definitiva,
sonríe al Destino que te azota y nunca azotes a nadie.
Confórmate en este mundo con pocos amigos.
No busques propiciar la simpatía que alguien te inspiro.
Antes de estrechar la mano de un hombre,
piensa si ella no ha de golpearte un día.
¡Cuán pobre el corazón que no sabe amar,
que no puede embriagarse de amor!
Si no amas, ¿cómo te explicas la luz enceguecedora del sol
y la más leve claridad que trae la luna?
Sabes que no tienes poder sobre tu destino.
Por qué esa incertidumbre del mañana ha de causarte miedo?
Si eres sabio, goza del momento presente.
El porvenir? Qué te puede traer el porvenir?
He aquí la estación inefable, la estación de la esperanza,
la estación en que las almas sedientas de otras almas buscan una quietud perfumada.
Cada flor, es acaso la blanca mano de Moisés?
Cada brisa, es acaso el tibio aliento de Jesús?

No marcha seguro por el Sendero el hombre que no ha recogido el fruto de la verdad.
Si pudo cosecharlo del árbol de la Ciencia,
sabe que los días pasados y los días por venir
en nada se distinguen del alucinante primer día de la Creación.
En la feria que atraviesas, no procures encontrar algún amigo.
Tampoco busques sólido refugio.
Con ánimo valiente, acepta el dolor sin la esperanza de un remedio inexistente.
Sonríe ante la desgracia y no le pidas a nadie que te sonría: perderás el tiempo.
Renuncia a la recompensa que merecías.
Si feliz. No te lamentes por nada.
No anheles nada. Lo que te ha de suceder,
escrito está en el libro que hojea al azar el viento de la Eternidad.
¡Qué misterio el de esos astros que ruedan en el espacio!
Khayyám: aférrate con fuerza a la cuerda de la Sabiduría.
¡Cuidado con el vértigo que,
a tu alrededor, derriba a tus compañeros!
Un religioso dijo a una ramera: 'Estás ebria
atrapada a cada momento en una nueva trampa'
Ella respondió: 'Oh, Señor, yo soy lo que tú dices,
y tú, eres lo que aparentas?'
En el vértigo de la vida sólo son felices
los que presumen de sabios y los que no tratan de educarse.
Me incliné sobre todos los secretos del Cosmos y retorné a la soledad
envidiando a los ciegos que hallé por el camino.
Quien me trajo a este mundo sin duda sabe dónde
me arrojará después. Nada ni nadie puede
cambiar su decisión. Bebamos, jovenzuelo.
¿Para qué he de esforzarme en variar lo invariable?
Cierra tu libro y piensa. Mira impasible al Ciclo
y a la Tierra. Da al pobre la mitad de tus bienes,
perdona las ofensas, no le hagas daño a nadie
y apártate a un rincón si quieres ser dichoso.
Acepta cualquier goce que pueda
ofrecerte la Vida. No creas que haya alguien
que cuente nuestros vicios y virtudes. Desprecia
lo que robarte pueda un momento dichoso.
Ven conmigo hasta el límite del desierto, que acaba
lo fértil y comienza lo yermo, el sitio donde
no pueden distinguirse ni príncipes ni esclavos.
Al Sultán en su trono podrá compadecer.
Pretender que el humilde devuelva en oro el plomo
que a él le han arrojado, y exigirle que pague
una deuda que nunca con nadie ha contraído,
es comercio de usura al que nadie está obligado.
¿Tienes miedo al mañana? ¡Tonto! Sé confiado.
Para justificar ese temor, que acecha
la desgracia. No quieras consejos ni lecciones
sabias. Nuestro destino será siempre insondable.
Las alas de la noche reposan sobre el alba.
Se habla de aquel que crea al ser y lo destruye.
No comprendo la obra del Creador. Dame vino
del que enternece el pecho y alegra la memoria.
No encontrarás en este bazar un solo amigo.
Atiende mi consejo: Renuncia a todo apoyo
Acepta la desgracia; no le busques remedio.
No esperes compasión, feliz en tu desdicha.
Hay muchos que se afanan en reunir riquezas
y otros, en cambio, las dispersan al viento.
Nadie se truena en oro al morir. Un cadáver
no es más que carroña, pasto de los gusanos.
Un pan consigue para dos jornadas y luego
en el fondo de un jarro con un poco de agua fresca.
¿Por qué ha de estar un hombre por otro sometido?
¿Por qué se ve obligado a servir a su prójimo?
Todos saben que nunca susurré una plegaria
que nunca intenté encubrir mis defectos.
No sé si existe una clemencia, Pero si existe
me siento perdonado, pues sincero fui siempre.
Por este destartalado mundo,
cuyas únicas puertas son la noche y el día,
¡qué de altivos sultanes fastuosos y opulentos
pasaron un instante, y luego se marcharon!
No pretendo pedir perdón de mis culpas,
pues hablar con Alá lo creó irreverente.
Sólo le bastaría cubrirme con el manto
de su clemencia, para hacerme inmaculado.
Debajo del destino que inexorablemente,
eterno e impasible, sin cesar gira y gira,
sabrás que sólo existen dos grupos dichosos:
los que lo saben todo, los que no saben nada.
Igual que una linterna mágica es el destino
en torno del cual vamos todos girando:
la lámpara es el sol, el mundo la pantalla,
nosotros las imágenes que pasan y se esfuman.
Cielo, infierno, esperanzas, temores...
¡Bah! Que traigan de beber. Una cosa es cierta:
que la vida va pasando, y el resto vaciedad es.
La flor marchita nunca florecerá de nuevo.
La pelota lanzada a derecha e izquierda,
de abajo a arriba, nada pregunta al que la arroja.
Quien lanzó a este mundo sabrá por qué lo hizo
Nadie, nadie lo sabe, sino él únicamente.
Dejemos que los sabios parloteen
Nada de lo que dicen es cierto, excepto que la vida es muy breve
Se fue la flor marchita para siempre;
el resto es mentira y locura.
Encontrar quise en vano el Cielo y el Infierno
más allá de la Tierra y aun del Infinito.
Pero una voz me dijo. " ¡Necio! Cielo e Infierno,
hasta el fin de los siglos, viven sólo en ti mismo".
El dedo del destino tan solo una palabra
escribió antes de irse. Nada, ni la inteligencia,
ni el amor, ni la compasión, hará que se retracte.
No hay lágrimas bastantes para poder borrarla.
Entonces llamé al Hado, preguntándole
¿Es posible que el destino nos lleve entre tinieblas?
Y el Hado me respondió: "jamás preguntes nada
y déjate llevar por el más ciego instinto".
Señor, en mi camino tendiste mil celadas.
Después me amenazaste: " ¡Ay de ti si no sabes
escapar estos peligros! " Lo ves, lo sabes todo
¿Acaso puedes reprochar mi rebeldía?
El hombre es solo un títere que el Destino maneja
a su antojo. El Destino nos empuja
al tablado del mundo, pero cuando siente Hastío
no duda en arrojarnos al cajón de la Nada.
El Destino, que con todo termina, acabar puede
con tu alma y la mía. Vaciemos ya las copas
y vamos a tumbarnos en el césped, pues pronto
sobre nuestras cenizas ha de crecer la hierba.
Nunca te atormentes por lograr oro o plata.
Antes de que tu aliento se enfríe, haz lo posible
por disfrutar tus bienes con un amigo, antes
de que tus enemigos los derrochen si mueres.
Importa muy poco que vivas cien, mil años,
pues llegará un momento en que será preciso
que abandones tu vieja taberna. Porque aunque seas
sultán o pordiosero, al fin lo mismo vales.
En un ruinoso alcázar que elevó en otro tiempo
sus cúpulas al cielo, y del que hasta los reyes
besaron sus umbrales, escuché a un ave
que preguntaba: "¿Dónde? Dime, ¿dónde, dónde?
¿Te entristece tal vez que no te recompensen
cual mereces? Olvida y no te apenes. Todo
cuanto deba llegarte, escrito está en el libro
de lo eterno, que el viento al azar va hojeando.
El Cielo es la visión de un ideal que puede
llegar a realizarse. El Infierno es un símil
del espíritu ardiente que ha surgido del caos
para volver al caos, aun cuando sea tarde.
Puesto que nuestra estancia en el mundo es precaria,
es absurdo vivir sin amor y sin vino.
¿A qué discutir sobre el mundo? Cuando muera
no ha de importarme nada que fuese o no creado.
Desprecia a aquel que no ama la belleza.
Repugnante es el ser carente de pasiones.
Indigno es él del sol que alumbra, y de ese beso
con que suele aplacar nuestras penas la Luna.
Si ha sido Dios el que creó los seres,
¿Por qué tan pronto tiene que destruirlos?
Si son feos e imperfectos, ¿quién tiene la culpa?
Y si bellos y buenos, ¿para qué aniquilarlos?
No pretendas Khayyam, descifrar el enigma
de la Vida, que es sólo una ficción. Lo eterno
es una copa llena de burbujas; tú eres una.
Goza, no pienses en el cielo o el infierno.
A nadie le pedí vivir. Por eso
me esfuerzo en acoger indiferente lo que
me regala la vida. ¿Por qué tendré que irme
ignorando a qué debo mi paso por la tierra?
Ya ha pasado el tiempo de mis hermosos años.
Se fue la primavera de mi vida, y el ave
de juventud ha levantado su vuelo rapidísimo.
No sé cuándo ha venido ni cuándo se ha marchado.
Frecuenté mucho el trato de sabios y de doctos
en mi edad juvenil. Grandemente admiraba
doctrinas, teorías... Pero al dejar sus aulas
estaba más confuso que al penetrar en ellas.
Lo mismo que ellos, yo sembré la semilla
de la sabiduría, y me he sacrificado
para que germinase. Coseché estas verdades:
que vine como el viento, que me iré como el agua.
A través de lo ignoto, mi alma tuvo empeño
en descorrer el velo del más allá. De pronto
volvió y me dijo esto. "¿Sabes? He comprobado
que el ciclo y el infierno se encuentran en mí misma".
Te hasta saber que todo es un misterio:
la creación y el destino de la Tierra y el tuyo.
Sonríe, pues, ante ellos. No sabrás nada más
cuando hayas franqueado las puertas de la nada.
Una vez encontré en la taberna a un sabio venerable
"¿Qué puedes -le pregunté- decirme
de aquellos que se fueron? " "Bebe -dijo solícito-,
porque muchos marcharon, pero ninguno ha vuelto".
¿Por qué debe inquietarme lo que oculta el futuro?
desgracia persigue al hombre temeroso.
Alégrate, no tomes la vida muy en serio:
las dudas no alteran el curso del destino.
No seas vanidoso. No llegarás al fondo
de las casas. En paz deja al Mundo y al Cielo.
Olvida todo aquello, que nada te importe.
Piensa que Alá jamás te ha consultado.
Para caminar seguro por la vida, primero
has de tomar el fruto de la Verdad del árbol de la Ciencia.
Sabrás que el pasado y el futuro son,
como el día de la Creación, espantosos.
Hay quien medita sobre la religión por gusto.
Hay otros que vacilan entre Certeza y Duda.
incluso surgirá un heraldo de pronto, que les grite :
¡Estúpidos! La senda no es ésta sino aquélla".
Muchos santos y sabios pasáronse la vida
discutiendo del mal y del bien.
Pero el eco burlose de ellos cual de falsos
profetas, y sus bocas se llenaron de polvo.
¿Es posible sondear la Noche? ¿Quién podría
oscurecer su albura? Vano empeño saberlo.
¡Adán y Eva! Su primer beso, ¡qué horrible!
Con él nos engendró, rebosantes de angustia.
¿Al mundo, a qué venimos? ¿Por qué nos vamos?
¿Qué quiere esta existencia que nos ha sido impuesta
Arden las almas y se convierten bajo su peso
en ceniza, pero yo no veo la hoguera.
Unos se vanaglorian de una ciencia vacía.
Otros siguen creyendo en las bellas huríes y el Edén.
Cuando el Velo se descorra,
se verá que todos se extraviaron lejos, muy lejos.
A esa bóveda inmensa que llamamos cielo,
bajo el cual vivimos y morimos los hombres,
no intentes levantar tus ojos implorantes.
No dudes que ella gira, como tú y yo, impotente.
Me dieron la existencia sin consultar conmigo.
Luego aumentó la vida día a día mi asombro.
Me iré sin desearlo, y sin saber la causa
de la llegada mía, mi estancia y mi partida.
Cuando el dolor te doble, cuando agotes tu llanto,
recuerda las gotas de lluvia que brillan en las hojas.
Y cuando te irrite el día y quieras noche eterna,
no olvides el despertar de un niño.
Confieso que si he entrado, devoto, en la mezquita
no ha sido únicamente para orar,
sino porque cogí hace ya algún tiempo de allí un tapiz hermoso.
El tapiz se hizo viejo ... y he vuelto a la mezquita.
En primavera suelo pasear por los prados floridos, meditando.
Pero en cuanto me ofrecen una copa de vino,
olvido todo enigma. De no hacerlo sería
mucho menos que un perro.
Me digo, ¿qué es mejor, si ir a la taberna
y arrepentirme luego, o inclinarme en el templo?
Bebamos, que no quiero saber si tengo amo
ni que ha de ser de mi cuando me echen del mundo.
En iglesias, mezquitas y sinagogas, sólo
se refugian los débiles que temen al infierno.
Aquel que bebe vino, en su pecho no siembra
la mala semilla del ruego y el espanto.
Llegó la primavera, la estación en que nuestros
impacientes deseos buscan la perfumada soledad.
Cada flor, ¿será la blanca mano
de Moisés, y la brisa, grato aliento del Señor?
La primavera, un arroyo que cruza
un prado en flor, efebos... Beber quiero,
porque a aquellos que beben cuando despuntaba el alba
nada les preocupan iglesias ni mezquitas.
No, no merezco entrar en mezquitas e iglesias.
Dios sabrá de qué barro me amasó. Como un pobre
infiel, o una muchacha fea, soy. De fortuna
carezco, y de esperanzas en una mejor vida.
El barro con que fue hecho el primer hombre,
para moldear al último ha de servir un día.
Y cuanto en la primera madrugada fue dicho,
repetido será el último atardecer.
Abriré mi pecho. Mi regla de conducta
es hacer cuando quiero todo, a despecho toda
moral o conveniencia. En nada, en nadie creo.
No amo a nadie, y tampoco tengo fe ni esperanza.
Imagínate el mundo ordenado a tu gusto,
Supón que has terminado de leer ya la carta,
que has gozado cien años a tu antojo y que puedes
vivir cien años más del mismo modo. ¿Y luego?
Entre impiedad y fe tan sólo un soplo existe,
así como también separa un simple soplo
dudas y convicciones. Goza el soplo presente,
que está la vida entera en el soplo que pasa.
Los dioses, adorados por mí tan largo tiempo,
una mala pasada me gastaron. Entonces
puse toda mi gloria de una copa en el fondo
y la cambié gustoso por un bello cantar.
La esperanza del Hombre se desvanece rápido,
como el humo. Si se realiza es parecida
a los copos de la nieve que caen en las arenas
del desierto. Fulguran un instante y se funden.
Ven, siéntate y apura a mi lado esta copa.
Escucha lo que dice el arpa. "Aquí se hallaban
los salmos de David". Del pasado y futuro
no te ocupes, y goza del presente, que es cierto .
Juré cambiar un día. Quise hacer penitencia.
Seguro que estaba ebrio en aquel momento.
Cargada de rosas, llegó la primavera
y se redujo a nada mí tan frágil propósito.
El pescado le dijo al pato en la olla
"¿Crees tú que algún día se secarán los mares?"
Y el pato contestó. "Cuando estemos asados,
¿qué importa que el mar sea un yermo, o un mar la tierra?
Débiles son los hombres, y su Hado inevitable,
¡Cuántos juramentos son olvidados! Queda
la conciencia, también obro yo como un loco.
Estar ebrio de vino y amor es mi culpa.
¿Te tienes por discreto? En tal caso, bien puedo
decir lo que fue Adán en su primer aurora:
tan sólo un pobre diablo amasado con penas
y que un día vivió clamando por la noche.
Natura crea la rosa y la destruye luego,
volviéndola a la tierra. Si en vez de agua
aspirasen las nubes, hasta el último día
del mundo, llovería sangre de enamorados.
En el prado que llega a la orilla del río
que sabe nuestros sueños, túmbate dulcemente.
Tal vez su césped haya surgido de algún cuerpo
que en otro tiempo fue perfectamente hermoso.
Mira el capullo transformándose en rosa.
Fíjate cómo abre sus pétalos, y, alegre,
anuncia su venida a este mundo. Mi bolsa,
abriré, derramando en el jardín el oro.
Si sacude con fuerza el árbol de la verdad,
verás caer un fruto que dirá. "Lo mismo
es el hoy que el ayer. Los días primeros y últimos
serán para nosotros exactamente iguales".
Sueño sobre la tierra. Sueño bajo la tierra.
Sobre la tierra, bajo la tierra, cuerpos tendidos.
Nada en todas partes. Desierto de la nada.
Unos hombres llegan. Otros se van.
Me pregunto qué poseo verdaderamente.
Me pregunto qué subsistirá de mí después de mi muerte.
Nuestra vida es breve como un incendio. Llamas que se olvidan,
cenizas que el viento dispersa: un hombre ha vivido.
El vasto mundo: un grano de polvo en el espacio.
Toda la ciencia de los hombres: palabras.
Los pueblos, las bestias y las flores de los siete climas:sombras.
El resultado de tu meditación perpetua: nada
¿Qué se habrá hecho de todos mis amigos? ¿La Muerte losha pisoteado?
¿Dónde están todos mis amigos, qué es de ellos?
Oigo aún sus cantos en la taberna. ¿Están muertos
o están ebrios de haber vivido?
Los sabios no te enseñarán nada,
pero la caricia de las largas pestañas de una mujer te revelará la felicidad.
No olvides que tus días están contados y que pronto serás la presa de la tierra.
Cómprate vino, llévatelo aparte y luego déjate consolar.
Tú no ves más que las apariencias de las cosas y de los seres.
Te das cuenta de tu ignorancia, pero no quieres renunciar a amar.
Aprende que Alá nos ha dado el amor
de la misma forma que ha dado veneno a ciertas plantas.
Me dicen: «¡No bebas más, Khayyam!»
Yo les digo: «Cuando he bebido,
oigo lo que dicen las rosas, los tulipanes y los jazmines.
Digo, incluso, lo que no puede decirme mi bienamada.»
Tal olor a vino emanará de mi tumba,
que todo aquel que pase cerca se embriagará.
Tal serenidad rodeará mi tumba,
que los amantes no podrán alejarse de ella.
Más allá de la Tierra, más allá del infinito,
intentaba ver el Cielo y el Infierno,
Y una voz solemne me dijo:
«El Cielo y el Infierno están en ti»
¡Un poco más de vino, mi bienamada!
Tus mejillas no tienen aún el resplandor de las rosas.
¡Un poco más de tristeza, Khayyam!
Tu bienamada va a sonreírte.
Cuando yo ya no esté, no habrá más rosas, cipreses, labios rojos ni vino perfumado.
No habrá más albas ni crepúsculos, alegrías ni penas.
El universo no existirá,
pues su realidad depende de nuestro pensamiento.
Lámparas que se apagan,
esperanzas que se encienden.
Aurora. Lámparas que se encienden,
esperanzas que se apagan. Noche.


SULLY PRUDHOMME
UM SONHO

Em sonho me disse o lavrador; “Faze teu pão.
Não contes mais comigo.: cava a terra e semeia”.
Disse-me o tecelão: “Tua roupa, faze tu mesmo”.
E me disse o pedreiro: “Pega a colher de mão”.
Sozinho, abandonado por todo o gênero humano,
Cujo implacável anátema por toda a parte arrastava,
Ao suplicar aos céus pela piedade humana,
Diante do meu caminho leões, atentos, encontrei.
Os olhos abri, não crendo que fosse real a aurora.
Valentes operários de construção, em suas escadas, assobiavam.
Os negócios fervilhavam, os campos estavam semeados.
A felicidade conheci, e mais, no mundo onde vivemos
Ninguém se gabar pode de ser melhor do que outrem..
Daquele dia em diante, a todos passei a amar.
Sully Prudhomme
– Biografia –

Foi o primeiro autor a receber o prêmio Nobel da Literatura. É poeta socialista, de um socialismo primeiro. René Armand François Prudhomme, mais conhecido como Sully Prudhomme (Paris, 16 de março de 1839 — Châtenay-Malabry, 6 de setembro de 1907), foi um poeta francês. Filho de Sully Prudhomme, comerciante, e de Clotilde Caillat, ingressou num instituto politécnico para estudar na área científica. No entanto, devido a uma doença oftalmológica, teve que desistir desse objetivo. Trabalhou numa fábrica, como escriturário, mas, descontente, decidiu estudar direito, em 1860. Em 1865, publica a sua primeira obra poética, Stances et Poèmes. Pertence ao grupo de poetas parnasianos, responsáveis pela publicação da revista Parnasse contemporain.Foi eleito para a Academia Francesa em 1881, ocupando a cadeira 24. Foi o primeiro autor a receber o Nobel de Literatura, no dia 10 de dezembro de 1901.Sully Prudhomme morreu em Châtenay-Malabry, França, em 6 de setembro de 1907, e foi sepultado no Cemitério do Père-Lachaise, em Paris.


UN SONGE

Le laboureur m’a dit en songe: “Fais ton pain”;
Je ne te nourris plus: gratte la terra, et sème”.
Le tisserand m’a dit: Fais tes habits toi-même”
Et le maçon m’a dit: “Prends la truelle en main.”
Et seul, abandoné de tout le genre humain,
Don’t je traînais partout l’impacable anathème
Quand j’implorais du ciel une pitié suprême,
Je trouvais dês lions debout dans monchemi.
J’ouvris les yeux , doutant si l’aube était réele:
De hardis companagnons sifflaient sur leur échelle,
Les métiers bourdonnaient, les champs étaient semés.
Je connus mon bonheur, e qu’au monde où nous sommes
Nul ne peut se vaner de se passer des hommes;
Et depuis ce jour-là, je les ai tous aimés. 

Le vase brisé

Le vase où meurt cette vervaine
D'un coup d'éventail fut fêlé ;
Le coup dut l'effleurer à peine,                                                               
Aucun bruit ne l'a révélé.
Mais la légère meurtrissure,
Mordant le cristal chaque jour,
D'une marche invisible et sûre
En a fait lentement le tour.
Son eau fraîche a fui goutte à goutte,
Le suc des fleurs s'est épuisé ;
Personne encore ne s'en doute,
N'y touchez pas, il est brisé.
Souvent aussi la main qu'on aime
Effleurant le coeur, le meurtrit ;
Puis le coeur se fend de lui-même,
La fleur de son amour périt ;
Toujours intact aux yeux du monde,
Il sent croître et pleurer tout bas
Sa blessure fine et profonde :
Il est brisé, n'y touchez pas.

Sully Prudhomme


O VASO PARTIDO

O vaso azul destas verbenas,
Partiu-o um leque que o tocou:
Golpe sutil, roçou-o apenas
Pois nem um ruído revelou.
Mas a fenda persistente,
Mordendo-o sempre sem sinal,
Fez, firme e imperceptivelmente,
A volta toda do cristal.
A água fugiu calada e fria,
A seiva toda se esgotou;
Ninguém de nada desconfia,
Não toquem, não, que se quebrou.
Assim, a mão de alguém, roçando
Num coração, enche-o de dor,
E ele se vai, calmo, quebrando,
E morre a flor do seu amor;
Embora intacto ao olhar do mundo,
Sente, na sua solidão,
Crescer seu mal, fino e profundo,
Já se quebrou: não toquem, não.

Sully Prudhomme ( Trad. Guilherme de Almeida)
  
Le cygne

Sans bruit, sous le miroir des lacs profonds et calmes,
Le cygne chasse l'onde avec ses larges palmes,
Et glisse. Le duvet de ses flancs est pareil
A des neiges d'avril qui croulent au soleil ;
Mais, ferme et d'un blanc mat, vibrant sous le zéphire,
Sa grande aile l'entraîne ainsi qu'un blanc navire.
Il dresse son beau col au-dessus des roseaux,
Le plonge, le promène allongé sur les eaux,
Le courbe gracieux comme un profil d'acanthe,
Et cache son bec noir dans sa gorge éclatante.
Tantôt le long des pins, séjour d'ombre et de paix,
Il serpente, et, laissant les herbages épais
Traîner derrière lui comme une chevelure,
Il va d'une tardive et languissante allure.
La grotte où le poète écoute ce qu'il sent,
Et la source qui pleure un éternel absent,
Lui plaisent ; il y rôde ; une feuille de saule
En silence tombée effleure son épaule.
Tantôt il pousse au large, et, loin du bois obscur,
Superbe, gouvernant du côté de l'azur,
Il choisit, pour fêter sa blancheur qu'il admire,
La place éblouissante où le soleil se mire.
Puis, quand les bords de l'eau ne se distinguent plus,
A l'heure où toute forme est un spectre confus,
Où l'horizon brunit rayé d'un long trait rouge,
Alors que pas un jonc, pas un glaïeul ne bouge,
Que les rainettes font dans l'air serein leur bruit,
Et que la luciole au clair de lune luit,
L'oiseau, dans le lac sombre où sous lui se reflète
La splendeur d'une nuit lactée et violette,
Comme un vase d'argent parmi des diamants,
Dort, la tête sous l'aile, entre deux firmaments.


O CISNE

Calmo, do espelho azul d’água profunda e calma
à face errando, os pés, lânguido, o cisne espalma
E desliza. Da neve os raros flocos brancos
Lembra o fino frouxel que lhe amacia os flancos;
Línea vela parece a asa que encurva e brande,
Esbelto, e ora retrai, ora sacode e expande;
Entre as ninféias indo, o alvo pescoço apruma,
Colhe-o após, some-o n’água, estende-o sobre a espuma,
Curva-o mole e gracioso, e ânfora antiga imita.
Dos pinheiros ao longo, onde o silêncio habita
E a paz e a sombra, vai; rastejando na esteira,
Que atrás fica, semelha intensa cabeleira
A basta ervagem fresca a palpitar. A gruta,
Que a alma atrai do poeta e a voz da tarde escuta,
Praz-lhe e a fonte que além flui, regurgita e bolha.
Vendo-as, lento se arrasta. às vezes numa folha
Leve cai do salgueiro e, em sua queda, leve,
Roça-lhe, muda sombra, as plumas cor de neve.
Caminha agora ao largo; o implexo da ramagem
Deixa e a parte procura onde o esplendor selvagem
Diz melhor com o brilhar d’água anilada e pura.
Do lado é a parte mais azul que ele procura;
E lá vai... a cismar sobre as ondas serenas,
Entrega à luz do sol a brancura das penas.
Depois, quando, em redor, se confundem, caindo
A noite, do amplo lago as margens, e no infinito
Horizonte há somente um ponto avermelhado;
Quando tudo quedou, quando no ilimitado
Do céu paira da lua o globo enorme e albente;
Quando acende o lampiro a luz fosforescente,
E nem o menor sopro o débil junco embala:
O cisne, sob o olhar dessa noite de opala,
Em seu lago sombrio, enfim, descansa; e, acaso
Visto de alguém, assim, lembra de prata um vaso...
Põe sob a asa a cabeça, os olhos sonolentos
Fecha, e dorme, feliz, entre dois firmamentos.

Sully Prudhomme
(Trad. de Alberto de Oliveira)

The Broken Vase

A fan’s light tap
Was enough to chip
This flower vase
In which the roses
Now are dying.
No sound it made
But a hairline crack
Day after day
Almost unseen
Crept slowly round the glass
And dropp by dropp
The water trickled out
While the vital sap
In the roses’ stems
Grew dry.
Now no-one doubts:
“Don’t touch”, they say,
“It’s broken”.
Often, too, the hand one loves
May lightly brush against the heart
And bruise it.
Slowly then across that heart
A hidden crack will spread
And love’s fair flower perish.
Pete Crowther  

Il vaso infranto
Il vaso in cui muore Violetta
Un battito d’ali spezzò;
Una farfalla passata di fretta,
Lo sguardo d’alcuno destò.

La piccola scalfitura

Mordendo il cristallo ogni giorno,
Inesorabile, cieca, sicura
Ne ha percorso l’intero contorno.
L’acqua è sparita in un’ora,
E la linfa ha fatto fagotto
Nessuno ne dubita ancora.
Ma non lo toccare, che è rotto10
Così spesso la mano amata,
Ferisce sfiorandolo il cuore;
Poi l’anima si fende stremata,
E crepa Violetta d’amore;
Sempre intatto agli occhi del mondo,
Piange piano e sente vibrare
Il suo taglio fino e profondo.
Ma è rotto, non lo toccare.

EL BÚCARO ROTO

El vaso en que agoniza esta verbena
un golpe de abanico estremeció;
debió el golpe sutil rozarlo apenas,
pues que ruido ninguno se escuchó.
Mas la leve, invisible rasgadura,
de marcha persistente, siempre igual,
con su fina, constante mordedura,
lentamente rodeando fue el cristal.
Así la mano que nos es querida,
nos hiere, sin saberlo, el corazón;
se agranda en él la misteriosa herida
y sucumbe la flor de su pasión.
El agua destiló gota por gota,
la savia de la flor se extingue ya,
pero la oculta herida nadie nota :
¡el vaso no toquéis, que roto está!

Die zerbrochene Vase

Drin die Verbene welkt, die Vase
Von eines Fächers Schlag zersprang,
Der Schlag hat kaum geritzt am Glase,
Kein leisestes Geräusch erklang.
Doch war sie noch so fein gesprungen,
Es fraß sich weiter im Kristall,
Und ganz unmerkUch ist gedrungen
Langsam der Riß nach überall.
Sie rinnt. Ihr Naß in Tropfen schwindet,
Die Blume dorrt schon allgemach.
Doch ist noch niemand, der's empfindet:
Nicht daran rühren, — sie zerbrach! . . .
Oft ritzt, die liebend man gehalten,
Die Hand ein leichtverletzlich Herz,
Dann muß das Herz tiefinnen spalten.
Die Liebe welkt darin mit Schmerz.
Die Welt sieht nicht die feine Wunde,
Da doch das Herz sie wachsen spürt
Und leise weinen tief im Grunde:
Es brach — o nicht daran gerührt!
SULLY-PRUDHOMME


ALEXANDER PUSHKIN, O NEGRO DE PEDRO O GRANDE DA RÚSSIA


Muitos ainda desconhecem que houve, na Rússia do século XIX, um grande escritor de origem negra. Pois se trata, nada mais nada menos, do que do grande romancista e poeta Alexander Pushkin, que é para seu país o que são Dante para a Itália, Shakespeare para a Inglaterra, Cervantes para a Espanha ou Camões para Portugal
Como é sabido, foi narrador e poeta da era romântica russa, chegando mesmo a ser considerado, por parte da crítica, como o maior poeta russo. Mas isso tudo a respeito do ilustre escritor é sobejamente conhecido.
O detalhe, importante para os movimentos anti-racistas, é o fato de ele ser descendente de um negro. Os próprios russos escondem esse fato. Em muitas biografias não é citado esse ascendente africano.
Segundo certa tradição, Pedro, o grande, que reinou na Rússia de 1682 a 1725, estava em Londres, junto à corte inglesa, para negociações de reforma e reposição da frota naval russa e teria se encantado com um menino africano que vivia no palácio de Jaime II.
Teria recebido a criança, por doação, após insistentes pedidos e a conduzido para a corte russa, que, nesse tempo, tinha sua sede em São Petersburgo. Aliás, esse nome se deve ao grande rei Pedro I, que ampliou as fronteiras do norte russo.
Há outras versões, como a de que o menino se originaria do norte de Camarões e teria sido vendido ao embaixador russo na Turquia, cujo sobrenome era Tolstoi. Esse, por seu lado, seria avô do renomado escritor russo Leon Nikolaievitch Tolstoi.
Seja qual for sua origem verdadeira, aconteceu que foi apadrinhado de Pedro I da Rússia, que o enviou para estudar em Paris. Esse seria o bisavô de Pushkin pelo lado materno.
Na capital francesa, frequentou L’École d´Artillerie de La Fère,para estudar arte militar. Retornando a São Petersburgo, ingressa no exército russo, chegando ao grau de general. Segundo alguns, teria chegado mesmo ao comando do exército russo. Recebera o nome soviético de Abram Petrovitch Hannibal.
Esse foi seu caminho para a nobreza. Seguiu, primeiramente, da França para a Espanha, lutando na guerra da sucessão, já no posto de capitão. De retorno à Rússia, casou-se com uma condessa. A avó do poeta, Nadezda Ossipovna Hannibala, originou-se desse casamento.
Continuou a família do grande escritor a fazer parte da nobreza russa. Sua filha, Natália Alexandrovna Pushkin, casou-se com um aristocrata da família Nassau.
Pushkin faleceu em conseqüência de um duelo, em razão de suposta infidelidade da esposa, com um oficial do exército russo, tendo o poeta apenas 38 anos de idade.
Seu sobrenome provém de um título de nobreza da família. A maioria dos estudiosos da história russa apagou os traços da origem africana do bisavô materno do poeta, numa evidente atitude racista.

LITERATURA ARGENTINA - Jorge Luis Borges



Jorge Francisco Isidoro Luis Borges Acevedo - Buenos Aires, 24 de agosto, 1889 - Genebra, 14 de junho de 1986. Foi um escritor, poeta, tradutor, crítico literário e ensaísta argentino. Em 1914 sua família se mudou para Suíça, onde ele estudou e de onde viajou para a Espanha. Em seu retorno à Argentina em 1921, Borges começou a publicar seus poemas e ensaios em revistas literárias surrealistas.Também trabalhou como bibliotecário e professor universitário público. Em 1955 foi nomeado diretor da Biblioteca Nacional da República Argentina professor de literatura na Universidade de Buenos Aires. Em 1961, destacou-se no cenário internacional quando recebeu o primeiro prêmio internacional de editores, o Prêmio Formentor. Seu trabalho foi traduzido e publicado extensamente nos Estados Unidos e Europa. Borges era fluente em várias línguas. Sua obra abrange o "caos que governa o mundo e o caráter de irrealidade em toda a literatura". Seus livros mais famosos, Ficciones (1944) e O Aleph (1949), são coletâneas de histórias curtas interligadas por temas comuns: sonhos, labirintos, bibliotecas,, escritores fictícios e livros fictícios, religião, Deus. Seus trabalhos têm contribuído significativamente para o gênero da literatura fantástica. Estudiosos notaram que a progressiva cegueira de Borges ajudou-o a criar novos símbolos literários através da imaginação, já que "os poetas, como os cegos, podem ver no escuro". Os poemas de seu último período dialogam com vultos culturais como Spinoza, Luís de Camões e Virgílio. Sua fama internacional foi consolidada na década de 1960, ajudado pelo "Boom latino-americano" e o sucesso de Cem Anos de Solidão de Gabrtiel Garcia Márquez. Para homenagear Borges, em O Nome da Rosa, um romance de Umberto Eco, há o personagem Jorge de Burgos, que além da semelhança no nome é cego — assim como Borges foi ficando ao longo da vida. Além da personagem, a biblioteca que serve como plano de fundo do livro é inspirada no conto de Borges Abiblioteca de Babel (uma biblioteca universal e infinita que abrange todos os livros do mundo). O escritor e ensaísta John Maxwell Coetzee disse sobre ele: "Borges, mais do que ninguém, renovou a linguagem de ficção e, assim, abriu o caminho para uma geração notável de romancistas hispano-americanos". (http://pt.wikipedia.org/wiki/Jorge_Luis_Borges).


La Biblioteca de Babel
El universo (que otros llaman la Biblioteca) se componte de un número indefinido, y tal vez infinito, de galerías hexagonales, con vastos pozos de ventilación en el medio, cercados por barandas bajísimas. Desde cualquier hexágono se ven los pisos inferiores y superiores: interminablemente. La distribución de las galerías es invariable. Veinte anaqueles, a cinco largos anaqueles por lado, cubren todos los lados menos dos; su altura, que es la de los pisos, excede apenas la de un bibliotecario normal. Una de las caras libres da a un angosto zaguán, que desemboca en otra galería, idéntica a la primera y a todas. A izquierda y a derecha del zaguán hay dos gabinetes minúsculos. Uno permite dormir de pie; otro, satisfacer las necesidades finales. Por ahí pasa la escalera espiral, que se abisma y se eleva hacia lo remoto. En el zaguán hay un espejo, que fielmente duplica las apariencias. Los hombres suelen inferir de ese espejo que la Biblioteca no es infinita (si lo fuera realmente ¿a qué esa duplicación ilusoria?); yo prefiero soñar que las superficies bruñidas figuran y prometen el infinito... La luz procede de unas frutas esféricas que llevan el nombre de lámparas. Hay dos en cada hexágono: transversales. La luz que emiten es insuficiente, incesante. Como todos los hombres de la Biblioteca, he viajado en mi juventud; he peregrinado en busca de un libro, acaso del catálogo de catálogos; ahora que mis ojos casi no pueden descifrar lo que escribo, me preparo a morir a unas pocas leguas del hexágono en que nací. Muerto, no faltarán manos piadosas que me tiren por la baranda; mi sepultura será el aire insondable; mi cuerpo se hundirá largamente y se corromperá y disolverá en el viento engendrado por la caída, que es infinita. Yo afirmo que la Biblioteca es interminable. Los idealistas arguyen que las salas hexagonales son una forma necesaria del espacio absoluto o, por lo menos, de nuestra intuición del espacio. Razonan que es inconcebible una sala triangular o pentagonal. (Los místicos pretenden que el éxtasis les revela una cámara circular con un gran libro circular de lomo continuo, que da toda la vuelta de las paredes; pero su testimonio es sospechoso; sus palabras, oscuras. Ese libro cíclico es Dios.) Básteme, por ahora, repetir el dictamen clásico: La Biblioteca es una esfera cuyo centro cabal es cualquier hexágono, cuya circunferencia es inaccesible. A cada uno de los muros de cada hexágono corresponden cinco anaqueles; cada anaquel encierra treinta y dos libros de formato uniforme; cada libro es de cuatrocientas diez páginas; cada página, de cuarenta renglones; cada renglón, de unas ochenta letras de color negro. También hay letras en el dorso de cada libro; esas letras no indican o prefiguran lo que dirán las páginas. Sé que esa inconexión, alguna vez, pareció misteriosa. Antes de resumir la solución (cuyo descubrimiento, a pesar de sus trágicas proyecciones, es quizá el hecho capital de la historia) quiero rememorar algunos axiomas. El primero: La Biblioteca existe ab alterno. De esa verdad cuyo colorario inmediato es la eternidad futura del mundo, ninguna mente razonable puede dudar. El hombre, el imperfecto bibliotecario, puede ser obra del azar o de los demiurgos malévolos; el universo, con su elegante dotación de anaqueles, de tomos enigmáticos, de infatigables escaleras para el viajero y de letrinas para el bibliotecario sentado, sólo puede ser obra de un dios. Para percibir la distancia que hay entre lo divino y lo humano, basta comparar estos rudos símbolos trémulos que mi falible mano garabatea en la tapa de un libro, con las letras orgánicas del interior: puntuales, delicadas, negrísimas, inimitablemente simétricas. El segundo: El número de símbolos ortográficos es veinticinco. Esa comprobación permitió, hace trescientos años, formular una teoría general de la Biblioteca y resolver satisfactoriamente el problema que ninguna conjetura había descifrado: la naturaleza informe y caótica de casi todos los libros. Uno, que mi padre vio en un hexágono del circuito quince noventa y cuatro, constaba de las letras MCV perversamente repetidas desde el renglón primero hasta el último. Otro (muy consultado en esta zona) es un mero laberinto de letras, pero la página penúltima dice «Oh tiempo tus pirámides». Ya se sabe: por una línea razonable o una recta noticia hay leguas de insensatas cacofonías, de fárragos verbales y de incoherencias. (Yo sé de una región cerril cuyos bibliotecarios repudian la supersticiosa y vana costumbre de buscar sentido en los libros y la equiparan a la de buscarlo en los sueños o en las líneas caóticas de la mano... Admiten que los inventores de la escritura imitaron los veinticinco símbolos naturales, pero sostienen que esa aplicación es casual y que los libros nada significan en sí. Ese dictamen, ya veremos no es del todo falaz.) Durante mucho tiempo se creyó que esos libros impenetrables correspondían a lenguas pretéritas o remotas. Es verdad que los hombres más antiguos, los primeros bibliotecarios, usaban un lenguaje asaz diferente del que hablamos ahora; es verdad que unas millas a la derecha la lengua es dialectal y que noventa pisos más arriba, es incomprensible. Todo eso, lo repito, es verdad, pero cuatrocientas diez páginas de inalterables MCV no pueden corresponder a ningún idioma, por dialectal o rudimentario que sea. Algunos insinuaron que cada letra podía influir en la subsiguiente y que el valor de MCV en la tercera línea de la página 71 no era el que puede tener la misma serie en otra posición de otra página, pero esa vaga tesis no prosperó. Otros pensaron en criptografías; universalmente esa conjetura ha sido aceptada, aunque no en el sentido en que la formularon sus inventores. Hace quinientos años, el jefe de un hexágono superior dio con un libro tan confuso como los otros, pero que tenía casi dos hojas de líneas homogéneas. Mostró su hallazgo a un descifrador ambulante, que le dijo que estaban redactadas en portugués; otros le dijeron que en yiddish. Antes de un siglo pudo establecerse el idioma: un dialecto samoyedo-lituano del guaraní, con inflexiones de árabe clásico. También se descifró el contenido: nociones de análisis combinatorio, ilustradas por ejemplos de variaciones con repetición ilimitada. Esos ejemplos permitieron que un bibliotecario de genio descubriera la ley fundamental de la Biblioteca. Este pensador observó que todos los libros, por diversos que sean, constan de elementos iguales: el espacio, el punto, la coma, las veintidós letras del alfabeto. También alegó un hecho que todos los viajeros han confirmado: No hay en la vasta Biblioteca, dos libros idénticos. De esas premisas incontrovertibles dedujo que la Biblioteca es total y que sus anaqueles registran todas las posibles combinaciones de los veintitantos símbolos ortográficos (número, aunque vastísimo, no infinito) o sea todo lo que es dable expresar: en todos los idiomas. Todo: la historia minuciosa del porvenir, las autobiografías de los arcángeles, el catálogo fiel de la Biblioteca, miles y miles de catálogos falsos, la demostración de la falacia de esos catálogos, la demostración de la falacia del catálogo verdadero, el evangelio gnóstico de Basilides, el comentario de ese evangelio, el comentario del comentario de ese evangelio, la relación verídica de tu muerte, la versión de cada libro a todas las lenguas, las interpolaciones de cada libro en todos los libros, el tratado que Beda pudo escribir (y no escribió) sobre la mitología de los sajones, los libros perdidos de Tácito. Cuando se proclamó que la Biblioteca abarcaba todos los libros, la primera impresión fue de extravagante felicidad. Todos los hombres se sintieron señores de un tesoro intacto y secreto. No había problema personal o mundial cuya elocuente solución no existiera: en algún hexágono. El universo estaba justificado, el universo bruscamente usurpó las dimensiones ilimitadas de la esperanza. En aquel tiempo se habló mucho de las Vindicaciones: libros de apología y de profecía, que para siempre vindicaban los actos de cada hombre del universo y guardaban arcanos prodigiosos para su porvenir. Miles de codiciosos abandonaron el dulce hexágono natal y se lanzaron escaleras arriba, urgidos por el vano propósito de encontrar su Vindicación. Esos peregrinos disputaban en los corredores estrechos, proferían oscuras maldiciones, se estrangulaban en las escaleras divinas, arrojaban los libros engañosos al fondo de los túneles, morían despeñados por los hombres de regiones remotas. Otros se enloquecieron... Las Vindicaciones existen (yo he visto dos que se refieren a personas del porvenir, a personas acaso no imaginarias) pero los buscadores no recordaban que la posibilidad de que un hombre encuentre la suya, o alguna pérfida variación de la suya, es computable en cero. También se esperó entonces la aclaración de los misterios básicos de la humanidad: el origen de la Biblioteca y del tiempo. Es verosímil que esos graves misterios puedan explicarse en palabras: si no basta el lenguaje de los filósofos, la multiforme Biblioteca habrá producido el idioma inaudito que se requiere y los vocabularios y gramáticas de ese idioma. Hace ya cuatro siglos que los hombres fatigan los hexágonos... Hay buscadores oficiales, inquisidores. Yo los he visto en el desempeño de su función: llegan siempre rendidos; hablan de una escalera sin peldaños que casi los mató; hablan de galerías y de escaleras con el bibliotecario; alguna vez, toman el libro más cercano y lo hojean, en busca de palabras infames. Visiblemente, nadie espera descubrir nada. A la desaforada esperanza, sucedió, como es natural, una depresión excesiva. La certidumbre de que algún anaquel en algún hexágono encerraba libros preciosos y de que esos libros preciosos eran inaccesibles, pareció casi intolerable. Una secta blasfema sugirió que cesaran las buscas y que todos los hombres barajaran letras y símbolos, hasta construir, mediante un improbable don del azar, esos libros canónicos. Las autoridades se vieron obligadas a promulgar órdenes severas. La secta desapareció, pero en mi niñez he visto hombres viejos que largamente se ocultaban en las letrinas, con unos discos de metal en un cubilete prohibido, y débilmente remedaban el divino desorden. Otros, inversamente, creyeron que lo primordial era eliminar las obras inútiles. Invadían los hexágonos, exhibían credenciales no siempre falsas, hojeaban con fastidio un volumen y condenaban anaqueles enteros: a su furor higiénico, ascético, se debe la insensata perdición de millones de libros. Su nombre es execrado, pero quienes deploran los «tesoros» que su frenesí destruyó, negligen dos hechos notorios. Uno: la Biblioteca es tan enorme que toda reducción de origen humano resulta infinitesimal. Otro: cada ejemplar es único, irreemplazable, pero (como la Biblioteca es total) hay siempre varios centenares de miles de facsímiles imperfectos: de obras que no difieren sino por una letra o por una coma. Contra la opinión general, me atrevo a suponer que las consecuencias de las depredaciones cometidas por los Purificadores, han sido exageradas por el horror que esos fanáticos provocaron. Los urgía el delirio de conquistar los libros del Hexágono Carmesí: libros de formato menor que los naturales; omnipotentes, ilustrados y mágicos. También sabemos de otra superstición de aquel tiempo: la del Hombre del Libro. En algún anaquel de algún hexágono (razonaron los hombres) debe existir un libro que sea la cifra y el compendio perfecto de todos los demás: algún bibliotecario lo ha recorrido y es análogo a un dios. En el lenguaje de esta zona persisten aún vestigios del culto de ese funcionario remoto. Muchos peregrinaron en busca de Él. Durante un siglo fatigaron en vano los más diversos rumbos. ¿Cómo localizar el venerado hexágono secreto que lo hospedaba? Alguien propuso un método regresivo: Para localizar el libro A, consultar previamente un libro B que indique el sitio de A; para localizar el libro B, consultar previamente un libro C, y así hasta lo infinito... En aventuras de ésas, he prodigado y consumido mis años. No me parece inverosímil que en algún anaquel del universo haya un libro total; ruego a los dioses ignorados que un hombre - ¡uno solo, aunque sea, hace miles de años! - lo haya examinado y leído. Si el honor y la sabiduría y la felicidad no son para mí, que sean para otros. Que el cielo exista, aunque mi lugar sea el infierno. Que yo sea ultrajado y aniquilado, pero que en un instante, en un ser, Tu enorme Biblioteca se justifique. Afirman los impíos que el disparate es normal en la Biblioteca y que lo razonable (y aun la humilde y pura coherencia) es una casi milagrosa excepción. Hablan (lo sé) de «la Biblioteca febril, cuyos azarosos volúmenes corren el incesante albur de cambiarse en otros y que todo lo afirman, lo niegan y lo confunden como una divinidad que delira». Esas palabras que no sólo denuncian el desorden sino que lo ejemplifican también, notoriamente prueban su gusto pésimo y su desesperada ignorancia. En efecto, la Biblioteca incluye todas las estructuras verbales, todas las variaciones que permiten los veinticinco símbolos ortográficos, pero no un solo disparate absoluto. Inútil observar que el mejor volumen de los muchos hexágonos que administro se titula «Trueno peinado», y otro «El calambre de yeso» y otro «Axaxaxas mlo». Esas proposiciones, a primera vista incoherentes, sin duda son capaces de una justificación criptográfica o alegórica; esa justificación es verbal y, ex hypothesi, ya figura en la Biblioteca. No puedo combinar unos caracteres dhcmrlchtdj que la divina Biblioteca no haya previsto y que en alguna de sus lenguas secretas no encierren un terrible sentido. Nadie puede articular una sílaba que no esté llena de ternuras y de temores; que no sea en alguno de esos lenguajes el nombre poderoso de un dios. Hablar es incurrir en tautologías. Esta epístola inútil y palabrera ya existe en uno de los treinta volúmenes de los cinco anaqueles de uno de los incontables hexágonos, y también su refutación. (Un número n de lenguajes posibles usa el mismo vocabulario; en algunos, el símbolo biblioteca admite la correcta definición ubicuo y perdurable sistema de galerías hexagonales, pero biblioteca es pan o pirámide o cualquier otra cosa, y las siete palabras que la definen tienen otro valor. Tú, que me lees, ¿estás seguro de entender mi lenguaje?). La escritura metódica me distrae de la presente condición de los hombres. La certidumbre de que todo está escrito nos anula o nos afantasma. Yo conozco distritos en que los jóvenes se prosternan ante los libros y besan con barbarie las páginas, pero no saben descifrar una sola letra. Las epidemias, las discordias heréticas, las peregrinaciones que inevitablemente degeneran en bandolerismo, han diezmado la población. Creo haber mencionado los suicidios, cada año más frecuentes. Quizá me engañen la vejez y el temor, pero sospecho que la especie humana - la única - está por extinguirse y que la Biblioteca perdurará: iluminada, solitaria, infinita, perfectamente inmóvil, armada de volúmenes preciosos, inútil, incorruptible, secreta. Acabo de escribir infinita. No he interpolado ese adjetivo por una costumbre retórica; digo que no es ilógico pensar que el mundo es infinito. Quienes lo juzgan limitado, postulan que en lugares remotos los corredores y escaleras y hexágonos pueden inconcebiblemente cesar, lo cual es absurdo. Quienes la imaginan sin límites, olvidan que los tiene el número posible de libros. Yo me atrevo a insinuar esta solución del antiguo problema: La biblioteca es ilimitada y periódica. Si un eterno viajero la atravesara en cualquier dirección, comprobaría al cabo de los siglos que los mismos volúmenes se repiten en el mismo desorden (que, repetido, sería un orden: el Orden). Mi soledad se alegra con esa elegante esperanza.
LITERATURA ESTADUNIDENSE - Edgar Allan Poe

Edgar Allan Poe (nascido Edgar Poe; Boston, 19 de Janeiro de 1809 - Baltimore,7 de Outubro de 1849) foi um autor, poeta, editor e crítico literário americano, fez parte do movimento romântico americano. Conhecido por suas histórias que envolvem o mistério e o macabro, Poe foi um dos primeiros escritores americanos de contos sendo considerado o inventor do gênero ficção policial, também recebendo crédito por contribuição ao emergente gênero de ficção científica. Ele foi o primeiro escritor americano conhecido a tentar ganhar a vida através da escrita por si só, resultando em uma vida e carreira financeiramente difícil.
Ele nasceu como Edgar Poe, em Boston, Massachusetts; quando jovem, ficou órfão de mãe, que morreu pouco depois de seu pai abandonar a família. Poe foi acolhido por Francis Allan e o seu marido John Allan, de Richmond, Virgínia, mas nunca foi formalmente adotado. Ele frequentou a Universidade da Virgínia por um semestre, passando a maior parte do tempo entre bebidas e mulheres. Nesse período, teve uma séria discussão com seu pai adotivo e fugiu de casa para se alistar nas forças armadas, onde serviu durante dois anos antes de ser dispensado, depois de falhar como cadete em West Point, deixou a sua família adotiva. Sua carreira começou humildemente com a publicação de uma coleção anônima de poemas, Tamerlane and Other Poems (1827).
Poe mudou seu foco para a prosa e passou os próximos anos trabalhando para revistas e jornais, tornando-se conhecido por seu próprio estilo de crítica literária. Seu trabalho o obrigou a se mudar para diversas cidades, incluindo Baltimore, Filadélfia, Nova York. Em Baltimore, em 1835, casou-se com Virgínia Clemm, sua prima de 13 anos de idade. Em Janeiro de 1845, Poe publicou seu poema The Raven, foi um sucesso instantâneo. Sua esposa morreu de tuberculose dois anos após a publicação. Ele começou a planejar a criação de seu próprio jornal, The Penn (posteriormente renomeado para The Stylus), porém morreu antes que pudesse ser produzido. Em 7 de Outubro de 1849, aos 40 anos, Poe morreu em Baltimore; a causa de sua morte é desconhecida e foi por diversas vezes atribuída ao álcool, congestão cerebral, cólera, drogas, doenças do coração, raiva, suicídio, tuberculose entre outros agentes.
Poe e suas obras influenciaram a literatura nos Estados Unidos e ao redor do mundo, bem como em campos especializados, tais como a cosmologia e a criptografia. Poe e seu trabalho aparecem ao longo da cultura popular na literatura, música, filmes e televisão. Várias de suas casas são dedicadas como museus atualmente.


ANTOLOGIA
O CORVO


Numa meia-noite agreste, quando eu lia, lento e triste,
Vagos, curiosos tomos de ciências ancestrais,
E já quase adormecia, ouvi o que parecia
O som de alguém que batia levemente a meus umbrais.
"Uma visita", eu me disse, "está batendo a meus umbrais.
É só isto, e nada mais."
Ah, que bem disso me lembro! Era no frio dezembro,
E o fogo, morrendo negro, urdia sombras desiguais.
Como eu qu'ria a madrugada, toda a noite aos livros dada
P'ra esquecer (em vão!) a amada, hoje entre hostes celestiais -
Essa cujo nome sabem as hostes celestiais,
Mas sem nome aqui jamais!
Como, a tremer frio e frouxo, cada reposteiro roxo
Me incutia, urdia estranhos terrores nunca antes tais!
Mas, a mim mesmo infundido força, eu ia repetindo,
"É uma visita pedindo entrada aqui em meus umbrais;
Uma visita tardia pede entrada em meus umbrais.
É só isto, e nada mais".
E, mais forte num instante, já nem tardo ou hesitante,
"Senhor", eu disse, "ou senhora, decerto me desculpais;
Mas eu ia adormecendo, quando viestes batendo,
Tão levemente batendo, batendo por meus umbrais,
Que mal ouvi..." E abri largos, franqueando-os, meus umbrais.
Noite, noite e nada mais.
A treva enorme fitando, fiquei perdido receando,
Dúbio e tais sonhos sonhando que os ninguém sonhou iguais.
Mas a noite era infinita, a paz profunda e maldita,
E a única palavra dita foi um nome cheio de ais -
Eu o disse, o nome dela, e o eco disse aos meus ais.
Isso só e nada mais.
Para dentro então volvendo, toda a alma em mim ardendo,
Não tardou que ouvisse novo som batendo mais e mais.
"Por certo", disse eu, "aquela bulha é na minha janela.
Vamos ver o que está nela, e o que são estes sinais."
Meu coração se distraía pesquisando estes sinais.
"É o vento, e nada mais."
Abri então a vidraça, e eis que, com muita negaça,
Entrou grave e nobre um corvo dos bons tempos ancestrais.
Não fez nenhum cumprimento, não parou nem um momento,
Mas com ar solene e lento pousou sobre os meus umbrais,
Num alvo busto de Atena que há por sobre meus umbrais,
Foi, pousou, e nada mais.
E esta ave estranha e escura fez sorrir minha amargura
Com o solene decoro de seus ares rituais.
"Tens o aspecto tosquiado", disse eu, "mas de nobre e ousado,
Ó velho corvo emigrado lá das trevas infernais!
Dize-me qual o teu nome lá nas trevas infernais."
Disse o corvo, "Nunca mais".
Pasmei de ouvir este raro pássaro falar tão claro,
Inda que pouco sentido tivessem palavras tais.
Mas deve ser concedido que ninguém terá havido
Que uma ave tenha tido pousada nos meus umbrais,
Ave ou bicho sobre o busto que há por sobre seus umbrais,
Com o nome "Nunca mais".
Mas o corvo, sobre o busto, nada mais dissera, augusto,
Que essa frase, qual se nela a alma lhe ficasse em ais.
Nem mais voz nem movimento fez, e eu, em meu pensamento
Perdido, murmurei lento, "Amigo, sonhos - mortais
Todos - todos já se foram. Amanhã também te vais".
Disse o corvo, "Nunca mais".
A alma súbito movida por frase tão bem cabida,
"Por certo", disse eu, "são estas vozes usuais,
Aprendeu-as de algum dono, que a desgraça e o abandono
Seguiram até que o entono da alma se quebrou em ais,
E o bordão de desesp'rança de seu canto cheio de ais
Era este "Nunca mais".
Mas, fazendo inda a ave escura sorrir a minha amargura,
Sentei-me defronte dela, do alvo busto e meus umbrais;
E, enterrado na cadeira, pensei de muita maneira
Que qu'ria esta ave agoureia dos maus tempos ancestrais,
Esta ave negra e agoureira dos maus tempos ancestrais,
Com aquele "Nunca mais".
Comigo isto discorrendo, mas nem sílaba dizendo
À ave que na minha alma cravava os olhos fatais,
Isto e mais ia cismando, a cabeça reclinando
No veludo onde a luz punha vagas sobras desiguais,
Naquele veludo onde ela, entre as sobras desiguais,
Reclinar-se-á nunca mais!
Fez-se então o ar mais denso, como cheio dum incenso
Que anjos dessem, cujos leves passos soam musicais.
"Maldito!", a mim disse, "deu-te Deus, por anjos concedeu-te
O esquecimento; valeu-te. Toma-o, esquece, com teus ais,
O nome da que não esqueces, e que faz esses teus ais!"
Disse o corvo, "Nunca mais".
"Profeta", disse eu, "profeta - ou demônio ou ave preta!
Fosse diabo ou tempestade quem te trouxe a meus umbrais,
A este luto e este degredo, a esta noite e este segredo,
A esta casa de ância e medo, dize a esta alma a quem atrais
Se há um bálsamo longínquo para esta alma a quem atrais!
Disse o corvo, "Nunca mais".
"Profeta", disse eu, "profeta - ou demônio ou ave preta!
Pelo Deus ante quem ambos somos fracos e mortais.
Dize a esta alma entristecida se no Éden de outra vida
Verá essa hoje perdida entre hostes celestiais,
Essa cujo nome sabem as hostes celestiais!"
Disse o corvo, "Nunca mais".
"Que esse grito nos aparte, ave ou diabo!", eu disse. "Parte!
Torna á noite e à tempestade! Torna às trevas infernais!
Não deixes pena que ateste a mentira que disseste!
Minha solidão me reste! Tira-te de meus umbrais!
Tira o vulto de meu peito e a sombra de meus umbrais!"
Disse o corvo, "Nunca mais".
E o corvo, na noite infinda, está ainda, está ainda
No alvo busto de Atena que há por sobre os meus umbrais.
Seu olhar tem a medonha cor de um demônio que sonha,
E a luz lança-lhe a tristonha sombra no chão há mais e mais,
Libertar-se-á... nunca mais!


THE RAVEN

Foto de Luiz Carlos Vaz.
(Edgar Allan Poe - First published in 1845)

Once upon a midnight dreary, while I pondered weak and weary,
Over many a quaint and curious volume of forgotten lore,
While I nodded, nearly napping, suddenly there came a tapping,
As of some one gently rapping, rapping at my chamber door.
`'Tis some visitor,' I muttered, `tapping at my chamber door -
Only this, and nothing more.'
Ah, distinctly I remember it was in the bleak December,
And each separate dying ember wrought its ghost upon the floor.
Eagerly I wished the morrow; - vainly I had sought to borrow
From my books surcease of sorrow - sorrow for the lost Lenore -
For the rare and radiant maiden whom the angels name Lenore -
Nameless here for evermore.
And the silken sad uncertain rustling of each purple curtain
Thrilled me - filled me with fantastic terrors never felt before;
So that now, to still the beating of my heart, I stood repeating
`'Tis some visitor entreating entrance at my chamber door -
Some late visitor entreating entrance at my chamber door; -
This it is, and nothing more,'
Presently my soul grew stronger; hesitating then no longer,
`Sir,' said I, `or Madam, truly your forgiveness I implore;
But the fact is I was napping, and so gently you came rapping,
And so faintly you came tapping, tapping at my chamber door,
That I scarce was sure I heard you' - here I opened wide the door; -
Darkness there, and nothing more.
Deep into that darkness peering, long I stood there wondering, fearing,
Doubting, dreaming dreams no mortal ever dared to dream before;
But the silence was unbroken, and the darkness gave no token,
And the only word there spoken was the whispered word, `Lenore!'
This I whispered, and an echo murmured back the word, `Lenore!'
Merely this and nothing more.
Back into the chamber turning, all my soul within me burning,
Soon again I heard a tapping somewhat louder than before.
`Surely,' said I, `surely that is something at my window lattice;
Let me see then, what thereat is, and this mystery explore -
Let my heart be still a moment and this mystery explore; -
'Tis the wind and nothing more!'
Open here I flung the shutter, when, with many a flirt and flutter,
In there stepped a stately raven of the saintly days of yore.
Not the least obeisance made he; not a minute stopped or stayed he;
But, with mien of lord or lady, perched above my chamber door -
Perched upon a bust of Pallas just above my chamber door -
Perched, and sat, and nothing more.
Then this ebony bird beguiling my sad fancy into smiling,
By the grave and stern decorum of the countenance it wore,
`Though thy crest be shorn and shaven, thou,' I said, `art sure no craven.
Ghastly grim and ancient raven wandering from the nightly shore -
Tell me what thy lordly name is on the Night's Plutonian shore!'
Quoth the raven, `Nevermore.'
Much I marvelled this ungainly fowl to hear discourse so plainly,
Though its answer little meaning - little relevancy bore;
For we cannot help agreeing that no living human being
Ever yet was blessed with seeing bird above his chamber door -
Bird or beast above the sculptured bust above his chamber door,
With such name as `Nevermore.'
But the raven, sitting lonely on the placid bust, spoke only,
That one word, as if his soul in that one word he did outpour.
Nothing further then he uttered - not a feather then he fluttered -
Till I scarcely more than muttered `Other friends have flown before -
On the morrow he will leave me, as my hopes have flown before.'
Then the bird said, `Nevermore.'
Startled at the stillness broken by reply so aptly spoken,
`Doubtless,' said I, `what it utters is its only stock and store,
Caught from some unhappy master whom unmerciful disaster
Followed fast and followed faster till his songs one burden bore -
Till the dirges of his hope that melancholy burden bore
Of "Never-nevermore."'
But the raven still beguiling all my sad soul into smiling,
Straight I wheeled a cushioned seat in front of bird and bust and door;
Then, upon the velvet sinking, I betook myself to linking
Fancy unto fancy, thinking what this ominous bird of yore -
What this grim, ungainly, ghastly, gaunt, and ominous bird of yore
Meant in croaking `Nevermore.'
This I sat engaged in guessing, but no syllable expressing
To the fowl whose fiery eyes now burned into my bosom's core;
This and more I sat divining, with my head at ease reclining
On the cushion's velvet lining that the lamp-light gloated o'er,
But whose velvet violet lining with the lamp-light gloating o'er,
She shall press, ah, nevermore!
Then, methought, the air grew denser, perfumed from an unseen censer
Swung by Seraphim whose foot-falls tinkled on the tufted floor.
`Wretch,' I cried, `thy God hath lent thee - by these angels he has sent thee
Respite - respite and nepenthe from thy memories of Lenore!
Quaff, oh quaff this kind nepenthe, and forget this lost Lenore!'
Quoth the raven, `Nevermore.'
`Prophet!' said I, `thing of evil! - prophet still, if bird or devil! -
Whether tempter sent, or whether tempest tossed thee here ashore,
Desolate yet all undaunted, on this desert land enchanted -
On this home by horror haunted - tell me truly, I implore -
Is there - is there balm in Gilead? - tell me - tell me, I implore!'
Quoth the raven, `Nevermore.'
`Prophet!' said I, `thing of evil! - prophet still, if bird or devil!
By that Heaven that bends above us - by that God we both adore -
Tell this soul with sorrow laden if, within the distant Aidenn,
It shall clasp a sainted maiden whom the angels name Lenore -
Clasp a rare and radiant maiden, whom the angels name Lenore?'
Quoth the raven, `Nevermore.'
`Be that word our sign of parting, bird or fiend!' I shrieked upstarting -
`Get thee back into the tempest and the Night's Plutonian shore!
Leave no black plume as a token of that lie thy soul hath spoken!
Leave my loneliness unbroken! - quit the bust above my door!
Take thy beak from out my heart, and take thy form from off my door!'
Quoth the raven, `Nevermore.'
And the raven, never flitting, still is sitting, still is sitting
On the pallid bust of Pallas just above my chamber door;
And his eyes have all the seeming of a demon's that is dreaming,
And the lamp-light o'er him streaming throws his shadow on the floor;
And my soul from out that shadow that lies floating on the floor Shall be lifted - nevermore!

É verdade! Nervoso, muito, muito nervoso mesmo eu estive e estou; mas por que você vai dizer que estou louco? A doença exacerbou meus sentidos, não os destruiu, não os embotou. Mais que os outros estava aguçado o sentido da audição. Ouvi todas as coisas no céu e na terra. Ouvi muitas coisas no inferno. Como então posso estar louco? Preste atenção! E observe com que sanidade, com que calma, posso lhe contar toda a história. É impossível saber como a ideia penetrou pela primeira vez no meu cérebro, mas, uma vez concebida, ela me atormentou dia e noite. Objetivo não havia. Paixão não havia. Eu gostava do velho. Ele nunca me fez mal. Ele nunca me insultou. Seu ouro eu não desejava. Acho que era seu olho! É, era isso! Um de seus olhos parecia o de um abutre - um olho azul claro coberto por um véu. Sempre que caía sobre mim o meu sangue gelava, e então pouco a pouco, bem devagar, tomei a decisão de tirar a vida do velho, e com isso me livrar do olho, para sempre. Agora esse é o ponto. O senhor acha que sou louco. Homens loucos de nada sabem. Mas deveria ter-me visto. Deveria ter visto com que sensatez eu agi — com que precaução —, com que prudência, com que dissimulação, pus mãos à obra! Nunca fui tão gentil com o velho como durante toda a semana antes de matá-lo. E todas as noites, por volta de meia-noite, eu girava o trinco da sua porta e a abria, ah, com tanta delicadeza! E então, quando tinha conseguido uma abertura suficiente para minha cabeça, punha lá dentro uma lanterna furta-fogo bem fechada, fechada para que nenhuma luz brilhasse, e então eu passava a cabeça. Ah! o senhor teria rido se visse com que habilidade eu a passava. Eu a movia devagar, muito, muito devagar, para não perturbar o sono do velho. Levava uma hora para passar a cabeça toda pela abertura, o mais à frente possível, para que pudesse vê-lo deitado em sua cama. Aha! Teria um louco sido assim tão esperto? E então, quando minha cabeça estava bem dentro do quarto, eu abria a lanterna com cuidado — ah!, com tanto cuidado! —, com cuidado (porque a dobradiça rangia), eu a abria só o suficiente para que um raiozinho fino de luz caísse sobre o olho do abutre. E fiz isso por sete longas noites, todas as noites à meia-noite em ponto, mas eu sempre encontrava o olho fechado, e então era impossível fazer o trabalho, porque não era o velho que me exasperava, e sim seu Olho Maligno. E todas as manhãs, quando o dia raiava, eu entrava corajosamente no quarto e falava Com ele cheio de coragem, chamando-o pelo nome em tom cordial e perguntando como tinha passado a noite. Então, o senhor vê que ele teria que ter sido, na verdade, um velho muito astuto, para suspeitar que todas as noites, à meia-noite em ponto, eu o observava enquanto dormia. Na oitava noite, eu tomei um cuidado ainda maior ao abrir a porta. O ponteiro de minutos de um relógio se move mais depressa do que então a minha mão. Nunca antes daquela noite eu sentira a extensão de meus próprios poderes, de minha sagacidade. Eu mal conseguia conter meu sentimento de triunfo. Pensar que lá estava eu, abrindo pouco a pouco a porta, e ele sequer suspeitava de meus atos ou pensamentos secretos. Cheguei a rir com essa idéia, e ele talvez tenha ouvido, porque de repente se mexeu na cama como num sobressalto. Agora o senhor pode pensar que eu recuei — mas não. Seu quarto estava preto como breu com aquela escuridão espessa (porque as venezianas estavam bem fechadas, de medo de ladrões) e então eu soube que ele não poderia ver a porta sendo aberta e continuei a empurrá-la mais, e mais. Minha cabeça estava dentro e eu quase abrindo a lanterna quando meu polegar deslizou sobre a lingueta de metal e o velho deu um pulo na cama, gritando: — Quem está aí? Fiquei imóvel e em silêncio. Por uma hora inteira não movi um músculo, e durante esse tempo não o ouvi se deitar. Ele continuava sentado na cama, ouvindo bem como eu havia feito noite após noite prestando atenção aos relógios fúnebres na parede. Nesse instante, ouvi um leve gemido, e eu soube que era o gemido do terror mortal. Não era um gemido de dor ou de tristeza — ah, não! era o som fraco e abafado que sobe do fundo da alma quando sobrecarregada de terror. Eu conhecia bem aquele som. Muitas noites, à meia-noite em ponto, ele brotara de meu próprio peito, aprofundando, com seu eco pavoroso, os terrores que me perturbavam. Digo que os conhecia bem. Eu sabia o que sentia o velho e me apiedava dele embora risse por dentro. Eu sabia que ele estivera desperto, desde o primeiro barulhinho, quando se virara na cama. Seus medos foram desde então crescendo dentro dele. Ele estivera tentando fazer de conta que eram infundados, mas não conseguira. Dissera consigo mesmo: "Isto não passa do vento na chaminé; é apenas um camundongo andando pelo chão", ou "É só um grilo cricrilando um pouco". É, ele estivera tentando confortar-se com tais suposições; mas descobrira ser tudo em vão.Tudo em vão, porque a Morte ao se aproximar o atacara de frente com sua sombra negra e com ela envolvera a vítima. E a fúnebre influência da despercebida sombra fizera com que sentisse, ainda que não visse ou ouvisse, sentisse a presença da minha cabeça dentro do quarto. Quando já havia esperado por muito tempo e com muita paciência sem ouvi-lo se deitar, decidi abrir uma fenda — uma fenda muito, muito pequena na lanterna. Então eu a abri — o senhor não pode imaginar com que gestos furtivos, tão furtivos — até que afinal um único raio pálido como o fio da aranha brotou da fenda e caiu sobre o olho do abutre. Ele estava aberto, muito, muito aberto, e fui ficando furioso enquanto o fitava. Eu o vi com perfeita clareza - todo de um azul fosco e coberto por um véu medonho que enregelou até a medula dos meus ossos, mas era tudo o que eu podia ver do rosto ou do corpo do velho, pois dirigira o raio, como por instinto, exatamente para o ponto maldito. E agora, eu não lhe disse que aquilo que o senhor tomou por loucura não passava de hiperagudeza dos sentidos? Agora, repito, chegou a meus ouvidos um ruído baixo, surdo e rápido, algo como faz um relógio quando envolto em algodão. Eu também conhecia bem aquele som. Eram as batidas do coração do velho. Aquilo aumentou a minha fúria, como o bater do tambor instiga a coragem do soldado. Mas mesmo então eu me contive e continuei imóvel. Quase não respirava. Segurava imóvel a lanterna. Tentei ao máximo possível manter o raio sobre o olho. Enquanto isso, aumentava o diabólico tamborilar do coração. Ficava a cada instante mais e mais rápido, mais e mais alto. O terror do velho deve ter sido extremo. Ficava mais alto, estou dizendo, mais alto a cada instante! — está me entendendo? Eu lhe disse que estou nervoso: estou mesmo. E agora, altas horas da noite, em meio ao silêncio pavoroso dessa casa velha, um ruído tão estranho quanto esse me levou ao terror incontrolável. Ainda assim por mais alguns minutos me contive e continuei imóvel. Mas as batidas ficaram mais altas, mais altas! Achei que o coração iria explodir. E agora uma nova ansiedade tomava conta de mim — o som seria ouvido por um vizinho! Chegara a hora do velho! Com um berro, abri por completo a lanterna e saltei para dentro do quarto. Ele deu um grito agudo — um só. Num instante, arrastei-o para o chão e derrubei sobre ele a cama pesada. Então sorri contente, ao ver meu ato tão adiantado. Mas por muitos minutos o coração bateu com um som amortecido. Aquilo, entretanto, não me exasperou; não seria ouvido através da parede. Por fim, cessou. O velho estava morto. Afastei a cama e examinei o cadáver. É, estava morto, bem morto. Pus a mão sobre seu coração e a mantive ali por muitos minutos. Não havia pulsação. Ele estava bem morto. Seu olho não me perturbaria mais. Se ainda me acha louco, não mais pensará assim quando eu descrever as sensatas precauções que tomei para ocultar o corpo. A noite avançava, e trabalhei depressa, mas em silêncio. Antes de tudo desmembrei o cadáver. Separei a cabeça, os braços e as pernas. Arranquei três tábuas do assoalho do quarto e depositei tudo entre as vigas. Recoloquei então as pranchas com tanta habilidade e astúcia que nenhum olho humano — nem mesmo o dele — poderia detectar algo de errado. Nada havia a ser lavado — nenhuma mancha de qualquer tipo — nenhuma marca de sangue. Eu fora muito cauteloso. Uma tina absorvera tudo - ha! ha! Quando terminei todo aquele trabalho, eram quatro horas — ainda tão escuro quanto à meia-noite. Quando o sino deu as horas, houve uma batida à porta da rua. Desci para abrir com o coração leve — pois o que tinha agora a temer? Entraram três homens, que se apresentaram, com perfeita suavidade, como oficiais de polícia. Um grito fora ouvido por um vizinho durante a noite; suspeitas de traição haviam sido levantadas; uma queixa fora apresentada à delegacia e eles (os policiais) haviam sido encarregados de examinar o local. Sorri — pois o que tinha a temer? Dei as boas-vindas aos senhores. O grito, disse, fora meu, num sonho. O velho, mencionei, estava fora, no campo. Acompanhei minhas visitas por toda a casa. Incentivei-os a procurar — procurar bem. Levei-os, por fim, ao quarto dele. Mostrei-lhes seus tesouros, seguro, imperturbável. No entusiasmo de minha confiança, levei cadeiras para o quarto e convidei-os para ali descansarem de seus afazeres, enquanto eu mesmo, na louca audácia de um triunfo perfeito, instalei minha própria cadeira exatamente no ponto sob o qual repousava o cadáver da vítima. Os oficiais estavam satisfeitos. Meus modos os haviam convencido. Eu estava bastante à vontade. Sentaram-se e, enquanto eu respondia animado, falaram de coisas familiares. Mas, pouco depois, senti que empalidecia e desejei que se fossem. Minha cabeça doía e me parecia sentir um zumbido nos ouvidos; mas eles continuavam sentados e continuavam a falar. O zumbido ficou mais claro — continuava e ficava mais claro: falei com mais vivacidade para me livrar da sensação: mas ela continuou e se instalou — até que, afinal, descobri que o barulho estava dentro de meus ouvidos. Sem dúvida agora fiquei muito pálido; mas falei com mais fluência, e em voz mais alta. Mas o som crescia - e o que eu podia fazer? Era um surdo, rápido — muito parecido com o som que faz um relógio quando envolto em algodão. Arfei em busca de ar, e os policiais ainda não o ouviam. Falei mais depressa, com mais intensidade, mas o barulho continuava a crescer. Levantei-me e discuti sobre ninharias, num tom alto e gesticulando com ênfase; mas o barulho continuava a crescer. Por que eles não podiam ir embora? Andei de um lado para outro a passos largos e pesados, como se me enfurecessem as observações dos homens, mas o barulho continuava a crescer. Ai meu Deus! O que eu poderia fazer? Espumei — vociferei — xinguei! Sacudi a cadeira na qual estivera sentado e arrastei-a pelas tábuas, mas o barulho abafava tudo e continuava a crescer. Ficou mais alto — mais alto — mais alto! E os homens ainda conversavam animadamente, e sorriam. Seria possível que não ouvissem? Deus Todo-Poderoso! — não, não? Eles ouviam! — eles suspeitavam! — eles sabiam! - Eles estavam zombando do meu horror! — Assim pensei e assim penso. Mas qualquer coisa seria melhor do que essa agonia! Qualquer coisa seria mais tolerável do que esse escárnio. Eu não poderia suportar por mais tempo aqueles sorrisos hipócritas! Senti que precisava gritar ou morrer! — e agora — de novo — ouça! mais alto! mais alto! mais alto! mais alto! — Miseráveis! — berrei — Não disfarcem mais! Admito o que fiz! levantem as pranchas! — aqui, aqui! — são as batidas do horrendo coração! 

THE TELL-TALE HEART - EDGAR ALLAN POE TRUE! --nervous --very, very dreadfully nervous I had been and am; but why will you say that I am mad? The disease had sharpened my senses --not destroyed --not dulled them. Above all was the sense of hearing acute. I heard all things in the heaven and in the earth. I heard many things in hell. How, then, am I mad? Hearken! and observe how healthily --how calmly I can tell you the whole story. It is impossible to say how first the idea entered my brain; but once conceived, it haunted me day and night. Object there was none. Passion there was none. I loved the old man. He had never wronged me. He had never given me insult. For his gold I had no desire. I think it was his eye! yes, it was this! He had the eye of a vulture --a pale blue eye, with a film over it. Whenever it fell upon me, my blood ran cold; and so by degrees --very gradually --I made up my mind to take the life of the old man, and thus rid myself of the eye forever. Now this is the point. You fancy me mad. Madmen know nothing. But you should have seen me. You should have seen how wisely I proceeded --with what caution --with what foresight --with what dissimulation I went to work! I was never kinder to the old man than during the whole week before I killed him. And every night, about midnight, I turned the latch of his door and opened it --oh so gently! And then, when I had made an opening sufficient for my head, I put in a dark lantern, all closed, closed, that no light shone out, and then I thrust in my head. Oh, you would have laughed to see how cunningly I thrust it in! I moved it slowly --very, very slowly, so that I might not disturb the old man's sleep. It took me an hour to place my whole head within the opening so far that I could see him as he lay upon his bed. Ha! would a madman have been so wise as this, And then, when my head was well in the room, I undid the lantern cautiously-oh, so cautiously --cautiously (for the hinges creaked) --I undid it just so much that a single thin ray fell upon the vulture eye. And this I did for seven long nights --every night just at midnight --but I found the eye always closed; and so it was impossible to do the work; for it was not the old man who vexed me, but his Evil Eye. And every morning, when the day broke, I went boldly into the chamber, and spoke courageously to him, calling him by name in a hearty tone, and inquiring how he has passed the night. So you see he would have been a very profound old man, indeed, to suspect that every night, just at twelve, I looked in upon him while he slept. Upon the eighth night I was more than usually cautious in opening the door. A watch's minute hand moves more quickly than did mine. Never before that night had I felt the extent of my own powers --of my sagacity. I could scarcely contain my feelings of triumph. To think that there I was, opening the door, little by little, and he not even to dream of my secret deeds or thoughts. I fairly chuckled at the idea; and perhaps he heard me; for he moved on the bed suddenly, as if startled. Now you may think that I drew back --but no. His room was as black as pitch with the thick darkness, (for the shutters were close fastened, through fear of robbers,) and so I knew that he could not see the opening of the door, and I kept pushing it on steadily, steadily. I had my head in, and was about to open the lantern, when my thumb slipped upon the tin fastening, and the old man sprang up in bed, crying out --"Who's there?" I kept quite still and said nothing. For a whole hour I did not move a muscle, and in the meantime I did not hear him lie down. He was still sitting up in the bed listening; --just as I have done, night after night, hearkening to the death watches in the wall. Presently I heard a slight groan, and I knew it was the groan of mortal terror. It was not a groan of pain or of grief --oh, no! --it was the low stifled sound that arises from the bottom of the soul when overcharged with awe. I knew the sound well. Many a night, just at midnight, when all the world slept, it has welled up from my own bosom, deepening, with its dreadful echo, the terrors that distracted me. I say I knew it well. I knew what the old man felt, and pitied him, although I chuckled at heart. I knew that he had been lying awake ever since the first slight noise, when he had turned in the bed. His fears had been ever since growing upon him. He had been trying to fancy them causeless, but could not. He had been saying to himself --"It is nothing but the wind in the chimney --it is only a mouse crossing the floor," or "It is merely a cricket which has made a single chirp." Yes, he had been trying to comfort himself with these suppositions: but he had found all in vain. All in vain; because Death, in approaching him had stalked with his black shadow before him, and enveloped the victim. And it was the mournful influence of the unperceived shadow that caused him to feel --although he neither saw nor heard --to feel the presence of my head within the room. When I had waited a long time, very patiently, without hearing him lie down, I resolved to open a little --a very, very little crevice in the lantern. So I opened it --you cannot imagine how stealthily, stealthily --until, at length a simple dim ray, like the thread of the spider, shot from out the crevice and fell full upon the vulture eye. It was open --wide, wide open --and I grew furious as I gazed upon it. I saw it with perfect distinctness --all a dull blue, with a hideous veil over it that chilled the very marrow in my bones; but I could see nothing else of the old man's face or person: for I had directed the ray as if by instinct, precisely upon the damned spot. And have I not told you that what you mistake for madness is but over-acuteness of the sense? --now, I say, there came to my ears a low, dull, quick sound, such as a watch makes when enveloped in cotton. I knew that sound well, too. It was the beating of the old man's heart. It increased my fury, as the beating of a drum stimulates the soldier into courage. But even yet I refrained and kept still. I scarcely breathed. I held the lantern motionless. I tried how steadily I could maintain the ray upon the eve. Meantime the hellish tattoo of the heart increased. It grew quicker and quicker, and louder and louder every instant. The old man's terror must have been extreme! It grew louder, I say, louder every moment! --do you mark me well I have told you that I am nervous: so I am. And now at the dead hour of the night, amid the dreadful silence of that old house, so strange a noise as this excited me to uncontrollable terror. Yet, for some minutes longer I refrained and stood still. But the beating grew louder, louder! I thought the heart must burst. And now a new anxiety seized me --the sound would be heard by a neighbour! The old man's hour had come! With a loud yell, I threw open the lantern and leaped into the room. He shrieked once --once only. In an instant I dragged him to the floor, and pulled the heavy bed over him. I then smiled gaily, to find the deed so far done. But, for many minutes, the heart beat on with a muffled sound. This, however, did not vex me; it would not be heard through the wall. At length it ceased. The old man was dead. I removed the bed and examined the corpse. Yes, he was stone, stone dead. I placed my hand upon the heart and held it there many minutes. There was no pulsation. He was stone dead. His eve would trouble me no more. If still you think me mad, you will think so no longer when I describe the wise precautions I took for the concealment of the body. The night waned, and I worked hastily, but in silence. First of all I dismembered the corpse. I cut off the head and the arms and the legs. I then took up three planks from the flooring of the chamber, and deposited all between the scantlings. I then replaced the boards so cleverly, so cunningly, that no human eye --not even his --could have detected any thing wrong. There was nothing to wash out --no stain of any kind --no blood-spot whatever. I had been too wary for that. A tub had caught all --ha! ha! When I had made an end of these labors, it was four o'clock --still dark as midnight. As the bell sounded the hour, there came a knocking at the street door. I went down to open it with a light heart, --for what had I now to fear? There entered three men, who introduced themselves, with perfect suavity, as officers of the police. A shriek had been heard by a neighbour during the night; suspicion of foul play had been aroused; information had been lodged at the police office, and they (the officers) had been deputed to search the premises. I smiled, --for what had I to fear? I bade the gentlemen welcome. The shriek, I said, was my own in a dream. The old man, I mentioned, was absent in the country. I took my visitors all over the house. I bade them search --search well. I led them, at length, to his chamber. I showed them his treasures, secure, undisturbed. In the enthusiasm of my confidence, I brought chairs into the room, and desired them here to rest from their fatigues, while I myself, in the wild audacity of my perfect triumph, placed my own seat upon the very spot beneath which reposed the corpse of the victim. The officers were satisfied. My manner had convinced them. I was singularly at ease. They sat, and while I answered cheerily, they chatted of familiar things. But, ere long, I felt myself getting pale and wished them gone. My head ached, and I fancied a ringing in my ears: but still they sat and still chatted. The ringing became more distinct: --It continued and became more distinct: I talked more freely to get rid of the feeling: but it continued and gained definiteness --until, at length, I found that the noise was not within my ears. No doubt I now grew very pale; --but I talked more fluently, and with a heightened voice. Yet the sound increased --and what could I do? It was a low, dull, quick sound --much such a sound as a watch makes when enveloped in cotton. I gasped for breath --and yet the officers heard it not. I talked more quickly --more vehemently; but the noise steadily increased. I arose and argued about trifles, in a high key and with violent gesticulations; but the noise steadily increased. Why would they not be gone? I paced the floor to and fro with heavy strides, as if excited to fury by the observations of the men --but the noise steadily increased. Oh God! what could I do? I foamed --I raved --I swore! I swung the chair upon which I had been sitting, and grated it upon the boards, but the noise arose over all and continually increased. It grew louder --louder --louder! And still the men chatted pleasantly, and smiled. Was it possible they heard not? Almighty God! --no, no! They heard! --they suspected! --they knew! --they were making a mockery of my horror!-this I thought, and this I think. But anything was better than this agony! Anything was more tolerable than this derision! I could bear those hypocritical smiles no longer! I felt that I must scream or die! and now --again! --hark! louder! louder! louder! louder! "Villains!" I shrieked, "dissemble no more! I admit the deed! --tear up the planks! here, here! --It is the beating of his hideous heart!"

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