quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

CRÔNICA - PRODÍGIOS DA SIMPLICIDADE



Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
Todos os dias a mesma descida para a fonte. Margem do rochedo. De ninguém... A água escorria, azulada e fresca, pouca, muito pouca, da fenda da pedra enorme... Colocava o balde de zinco... Aguardava pensando no nada... Depois subia a encosta... Pés descalços... Triste?... Não... a alma repleta de sonhos... subia e descia... até a talha de barro estar cheia... Isso, por anos... Todos faziam... era para todos... os menores não podiam... eu era grande... já tinha sete... Quando pude, levava dois baldes... era melhor... equilibrava... pesava mais também...
E quanto do que veio depois já estava ali... Na lentidão do subir e do descer... do sonhar e pensar... A água fresca pingando fria nos pés nus... o pó do chão... o capim macio... o sol... o vento frio de inverno e a aragem das primaveras... os escaldantes sóis do verão...
Aquele brejo sempre guardava água... no seu ventre imenso... vinham as secas... sobrevivia às mais tórridas insolações...
Ah, meu balde... furado... meu sonho... as carícias do sol e do vento... e os longos silêncios de estar só... comigo... no nada... o balde furou... vieram outros... 
Hoje, passo ali, nada... ninguém quer sua água... luz elétrica... bomba... mas o filete azul escorre doce e sereno pela pedra fria para todo sempre... e eu continuo com meus baldes e sonhos, enquanto houver esta fonte que impele para a busca, nos intermináveis percursos... dos caminhos sem volta...

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