terça-feira, 14 de abril de 2015

MEU QUASE AMIGO EDUARDO GALEANO

No campo do meu avô,
que de há muito se foi.
Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
Não posso afirmar que era amigo de Galeano. Tenho livros autografados por ele. Convidei-o para palestrar em curso que eu coordenava. Falamo-nos algumas vezes.
Lembro uma historinha dele.
A professora nos disse que Balboa tinha sido o primeiro a ver aquele céu. Eu perguntei a ela - Professora, os índios eram cegos? Isso valeu-me uma suspensão. Anexo o autógrafo para Cris e para mim, de seu Livro dos Abraços. Lembro que ele estava fatigado, sorrindo alegre como sempre. Foi uma das últimas vezes que beijei-lhe as faces e apertou-me largamente a mão.

AS IMPRESSÕES DIGITAIS

Eu nasci e cresci debaixo das estrelas do Cruzeiro do Sul.
Aonde quer que eu vá, elas me perseguem. Debaixo do Cruzeiro do Sul, cruz de fulgores, vou vivendo as estações do meu destino.
Não tenho nenhum deus. Se tivesse, pediria a ele que não me deixasse chegar à morte: ainda não. Falta muito o que andar. Existem luas para as quais ainda não lati e sóis nos quais ainda não me incendiei. Ainda não mergulhei em todos os mares deste mundo, que dizem que são sete, nem em todos os rios do Paraíso, que dizem que são quatro.
Em Montevodéu, existe um menino que explica:
- Eu não quero morrer nunca, porque quero brincar sempre.
(Livro dos Abraços, p. 267).

O AR E O VENTO

Pelos caminhos vou, como o burrinho de São Fernando, um pouquinho a pé e outro pouquinho andando.
Às vezes me reconheço nos demais. Me reconheço nos que ficarão, nos amigos abrigos, loucos lindos de justiça e bichos voadores da beleza e demais vadios e mal cuidados que andam por aí e que por aí continuarão, como continuarão as estrelas da noite e as ondas do mar. Então, quando me reconheço neles, eu sou ar aprendendo a saber-me continuado no vento.
Acho que foi Vallejo, César Vallejo, que disse que às vezes o vento muda o ar.
Quando eu já não estiver, o vento estará, continuará estando.
(Livro dos Abraços, p. 269).

A VENTANIA

Assovia o vento dentro de mim.
Estou despido. Dono de nada., dono de ninguém, nem mesmo dono de minhas certezas, sou minha cara contra o vento, a contra-vento, e sou o vento que bate em minha cara. (Livro dos Abraços, p. 270).


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